As bandeiras do bolsonarismo nos atos de 7 de setembro segundo Fernando Gabeira:
As
manifestações bolsonaristas de amanhã devem ser grandes. Houve empenho
do governo, intensa campanha nas redes sociais, financiamento para
aluguel de ônibus do interior — enfim, um esforço excepcional.
Elas
podem até ter algumas consequências adiante, mas, do ponto de vista de
objetivo político, são um momento de sonho para vestir fantasias que não
sobrevivem na quarta-feira.E, quando não há objetivo político válido,
dificilmente uma força se impõe, mesmo havendo muita gente e até poder
militar.
Uma
das bandeiras do bolsonarismo está praticamente morta. É o voto
impresso. Foi derrotado no contexto legal em que deveria ser analisado, e
não há como voltar atrás. Nesse caso particular, estarão simplesmente
carregando um defunto, na expectativa de que lhes possa ser válido no
ano que vem, em caso de derrota eleitoral.
A
outra bandeira do bolsonarismo será, aparentemente, a liberdade de
expressão. Em termos abstratos, ninguém se coloca contra ela. A
dificuldade é aceitar que se preguem a violência e a invasão de prédios
públicos como se estivessem exercitando a liberdade, quando, de fato,
ultrapassam seus limites legais.
Essa
aceitação de limites está presente, por exemplo, no parecer da
subprocuradora Lindôra Araújo, que denunciou o ex-deputado Roberto
Jefferson.
Isso
não significa que o tema não deva ser constantemente discutido. E o é
no Brasil. Juízes têm censurado jornais; há debates sobre instruções do
Supremo relativas a combate a fake news; o próprio Bolsonaro rejeitou
uma lei que penaliza a divulgação em massa de notícias falsas. É um tema
em aberto, mas a conclamação à violência e o racismo, para citar
alguns, são limites legais que não podem ser transpostos apenas por atos
de vontade.
Bolsonaro
é presidente. Tem pouco a dizer diante de uma pandemia que não
desapareceu, como creem alguns otimistas. Governa um país em que a
economia estagnou, encontra diante de si uma crise hídrica que se
desdobra também numa crise de energia.
Numa
situação dessas, o presidente lidera manifestações pelo voto impresso
ou por uma duvidosa concepção de liberdade. Isso é tão distante da
realidade como conclamar as pessoas a comprar fuzis e definir como
idiota quem está preocupado com os alimentos, cada vez mais caros.
O
exame dos problemas reais do Brasil implica a definição da
responsabilidade do presidente. Até a crise hídrica, de certa forma
determinada por fenômenos como La Niña, seria mais branda se não
houvesse tanto desmatamento e tantas queimadas estimulados pelo governo
Bolsonaro.
Pode
ser que se ouça nas ruas algum grito contra a corrupção. Mas será de
uma amarga ironia. Bolsonaro apenas se aproveitou da bandeira. Os fatos
descritos na CPI mostram como gigantescos golpes estavam armados contra
os cofres públicos. As denúncias de rachadinha contra o filho
ex-deputado estadual estendem-se ao filho vereador e alcançam o próprio
gabinete de Bolsonaro.
Como
se não bastassem essas revelações, o encontro com o setor fisiológico
do Congresso revela que Bolsonaro, como ele próprio diz, se originou no
Centrão e sempre se localizou nesse espaço político.
Muita gente pode ir para a rua, mas, se estiverem perdidos, de nada adianta serem muitos se perdidos de armas na mão.
O
Brasil vive um momento dramático de crise sanitária ainda não vencida,
crise econômica e social, crise ambiental, seca e escassez de energia,
quase 15 milhões de desempregados.
Uma
grande manifestação que ignore essa realidade e um presidente que se
esconde dela servem apenas para mostrar como é profundo o abismo em que
nos metemos e como será difícil superá-lo sem um grande debate sobre a
reconstrução.
A
cortina de fumaça que Bolsonaro cria para tentar sobreviver
politicamente não nos deixa avaliar ainda quanto a democracia, o tecido
social e os recursos naturais foram devastados neste período. É uma
tarefa para a quarta-feira de cinzas.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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