Se você quiser um conselho, até as eleições volte a ler jornais; hoje, são os únicos meios de informação que não são adaptados por inteligência artificial ao que você deseja ver. Christiano Sobral para a Gazeta do Povo:
Não
existe mais nenhuma dúvida de que o Facebook, junto com a Cambridge
Analytica, influenciou as eleições anteriores nos Estados Unidos e, tudo
indica, em vários outros países, incluindo o Brasil. Não sendo por
outro motivo nasce desse escândalo a GDPR, que é a lei sobre a qual se
baseou a nossa Lei Geral de Proteção de Dados.
A
rede social demonstrou que, apenas com ajustes em uma simples postagem,
conseguiu levar mais de 300 mil pessoas a votarem numa eleição que não é
obrigatória e que foi vencida por uma margem da ordem de 100 mil votos.
Já a Cambridge Analytica selecionava e focava nos eleitores em dúvida,
para manipulá-los a votar conforme seu interesse. Um processo que se
iniciou pelo mapeamento do comportamento das pessoas a partir dos likes,
posts, reposts e tempo decorrido nas postagens, como meio de atribuir
uma característica de “a favor”, “contra” ou “em dúvida”.
A
base de toda a manipulação veio da polarização, dos ataques
difamatórios por postagens e por notícias falsas repetidas
continuamente. Trabalhando nos vieses presentes nas nossas formas de
pensar. Uma notícia falsa repetida por diversos meios aciona o chamado
“viés da disponibilidade”, que é uma tendência natural a acreditar
naquela informação que mais nos é repetida. Ela também aciona nossa
ancoragem, que é a dificuldade de afastar-se da primeira informação que
recebemos sobre alguma coisa. Na sequência, entramos no “viés da
confirmação”, simplesmente descartando notícias, informações ou
argumentos que vão contra a ideia que já formamos, tendendo a só ver e
ouvir o que confirma a nossa crença já estabelecida. Ou seja, uma ideia é
construída, fixada e internalizada em nossa mente ao ponto de
tornarmo-nos cegos às alternativas.
Vieram
a lei, a atenção para esse tipo de artifício e até o indiciamento de
alguns dos atores envolvidos. Só que isso não será o bastante.
Simplesmente
deixamos de acompanhar fontes regulares de notícias e, quase
unanimemente, estamos nos informando apenas por meio das redes sociais,
ou por nossos grupos de mensagens instantâneas, não só como meio de
termos acesso ao mundo, mas também como replicador dessas mensagens. Por
trás destas ferramentas está a economia da atenção, que tem seu valor
no maior tempo em que você permanece ligada a ela. Exatamente por causa
disso ela é gerida por sistemas de inteligência artificial que ajustam
tudo que chega até você para que seja mais atrativo e consiga mantê-lo
mais tempo preso à rede. Essas ferramentas, munidas das suas informações
e partindo do pensamento que já vem há muito sendo induzido em você,
vai mantê-lo incapaz de julgar corretamente os candidatos na próxima
eleição, levando-o, mais uma vez, a ser manipulado em suas convicções, e
a servir a alguém com seu voto.
Pena
que não existe forma de mudar a realidade digital que aqui está, e não
temos forças para ir contra a ideia que já nos foi implantada. Mas, se
você quiser um conselho, até as eleições volte a ler jornais; hoje, são
os únicos meios de informação que não são adaptados por inteligência
artificial ao que você deseja ver.
Christiano
Sobral é advogado e administrador, Law Master em Direito Digital,
mestre em Estratégia e especialista em marketing, finanças, economia e
negócios.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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