Fernanda Guimarães
Estadão
A mobilização global em torno da Amazônia colocou o assunto na pauta e trouxe à tona o fato de que o desmatamento ilegal é “o efeito colateral de gestão pública equivocada e perversa, que perpetua a pobreza e a ilegalidade”, afirma o professor Jacques Marcovitch, professor emérito da Universidade de São Paulo (USP) e conselheiro consultivo da Fundação Amazonas Sustentável.
Do ponto de vista econômico, ele lembra que o Brasil precisa de recursos estrangeiros e a saída de fundos globais pode criar um vácuo de financiamento para as empresas brasileiras.
Qual é a percepção global em relação ao Brasil?
O Brasil é percebido como um Estado-nação que assumiu
compromissos, no âmbito regional da OTCA, no Pacto de Leticia para a
Amazônia e no âmbito global do Acordo de Paris, que refletem o decidido
engajamento brasileiro na questão ambiental. Do outro lado, lideranças
políticas movidas pela ‘cultura do confronto’ têm agido na contramão
destes compromissos. Declarações, portarias, decretos e instruções
normativas do Ministério do Meio Ambiente, além de provocar o
desmantelamento da governança do Fundo Amazônia, nutrem motivos para que
o atual governo federal seja pressionado a honrar compromissos
nacionalmente determinados e ratificados pelo Congresso Nacional. É
inegável que a pressão internacional levou o atual governo brasileiro a
rever suas ações ou inações na Amazônia.
No ano passado, grandes
fundos internacionais pressionaram o País por medidas para redução do
desflorestamento. Houve alguma mudança desde então?
Uma das mudanças foi a recriação do Conselho da Amazônia,
sob o comando do vice-presidente da República, general Hamilton Mourão. A
mobilização pela redução do desflorestamento foi acompanhada por uma
disseminação do conhecimento sobre a complexidade da Amazônia. Uma
complexidade que demanda uma robusta governança, que integra os níveis
federal, estadual e municipal, governo, academia, sociedade civil e
Forças Armadas. Trata-se de uma governança que concebe, viabiliza e
avalia políticas públicas coordenadas por conhecedores da região,
estratégias de longo prazo e um monitoramento centrado em métricas e
indicadores.
Com esse movimento, o que se tornou mais claro sobre o tema?
Tornou-se evidente que o desmatamento ilegal é o efeito
colateral da gestão pública equivocada e perversa, que perpetua a
pobreza, a ilegalidade e o crime ambiental. Por isso, passou a ser
defendida a transformação da Amazônia em um campo de legalidade, o que
estimularia brasileiros e estrangeiros a investir em cadeias produtivas
da bioeconomia.
Quais efeitos econômicos o Brasil poderá ter se os recursos de grandes fundos globais começarem a sair do País?
O Brasil, como todas as economias emergentes, precisa da
poupança internacional para melhorar suas métricas de desenvolvimento.
Se estes fundos saírem do País, será criado um vácuo para empresas que
se capitalizam para cumprir suas metas de expansão. Não foi por outro
motivo que uma mobilização de grandes bancos e empresas divulgou um
documento em prol de melhor governança na Amazônia. Além do seu legítimo
engajamento na melhoria dos padrões de sustentabilidade, estava o
receio, também legítimo, de que estes grandes fundos riscassem o Brasil
do seu mapa de investimentos.
Que tipo de ação o setor privado brasileiro poderia encabeçar para ajudar a reduzir o desflorestamento no País?
Os agentes econômicos, em todos os países, emergem como
apoiadores relevantes na sociedade civil dos esforços de Estados
nacionais para mitigar as causas e efeitos das mudanças climáticas.
Sendo a Amazônia uma referência global, é cada vez mais legítimo que o
setor produtivo e o sistema financeiro se posicionem no combate ao
desmatamento e a favor da preservação deste patrimônio ambiental da
humanidade. Este olhar do empresariado sobre a Amazônia pode sinalizar o
melhor caminho para a geração de empregos na região.
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