Ele tentava criar uma distinção entre o abuso sexual infantil e a atração de crianças e adolescentes por pessoas mais velhas — esta segunda categoria, ele alegava, não era um problema. Gabriel de Arruda Castro, especial para a Gazeta do Povo:
Quando
o médico e pesquisador John Money morreu, em 2006, o jornal The New
York Times publicou um longo texto explicando a importância do acadêmico
para o estudo da sexualidade. “O doutor Money cunhou os termos
‘identidade de gênero’, para descrever a experiência interna da
sexualidade, e ‘papel de gênero’, para se referir às expectativas
sociais de comportamento masculino e feminino. Os dois conceitos ainda
guiam muitas pesquisas sobre a identidade sexual”, afirmava o obituário —
com razão.
Mas,
embora tenha mencionado algumas controvérsias envolvendo John Money, o
texto não citou aquele que talvez seja o aspecto mais problemático da
carreira dele: seu apoio à pedofilia.
O
discurso de Money estava alinhado ao de organizações dedicadas à defesa
da pedofilia na época. Ele tentava criar uma distinção entre o abuso
sexual infantil e a atração de crianças e adolescentes por pessoas mais
velhas — esta segunda categoria, ele alegava, não era um problema. Em
1991, Money concedeu uma entrevista a uma revista que fazia apologia à
pedofilia — a PAIDIKA.
“Se
eu visse o caso de um garoto com dez ou anos de idade que tem uma
intensa atração erótica por um homem na casa dos 20 ou dos 30 anos, se o
relacionamento é totalmente mútuo, e se a ligação é genuinamente e
totalmente mútua, então eu não a chamaria de patológica de forma
alguma”, ele disse. Alguns dos experimentos conduzidos por ele também
foram criticados por exporem crianças a conteúdo de teor sexual.
Métodos condenáveis
John
Money nasceu na Nova Zelândia, em 1921. Ele emigrou para os Estados
Unidos em 1947, estudou na Universidade de Pittsburgh e depois passou
por Harvard antes de fazer carreira como professor na universidade John
Hopkins, em Maryland.
O
seu livro “Transexualismo e Redesignação Sexual”, publicado em 1969,
foi uma obra pioneira por dissociar o sexo biológico da compreensão que o
indivíduo tem sobre a própria sexualidade. Embora Simone de Beauvoir
tenha tratado do assunto 20 anos antes em seu livro “O Segundo Sexo”,
John Money emprestou sua credibilidade como cientista no campo da
medicina — Beauvoir, por sua vez, era uma filósofa.
A
carreira de Money também ficou marcada por um episódio trágico. Em
1965, o garoto David Reimer, de menos de um ano de idade, sofreu um
acidente durante uma circuncisão e teve o pênis mutilado. Os pais
consultaram Money, em 1966, e ele os aconselhou a criar o menino como se
ele fosse uma garota. Ele foi castrado, e seu armário foi preenchido
com roupas e brinquedos femininos. Money pretendia usar o episódio para
confirmar sua tese de que o gênero podia ser completamente dissociado da
sexualidade.
Em
1972, Money mencionou a história do garoto David (àquela altura, Brenda
Reimer) em seu livro Man & Woman, Boy & Girl (“Homem e Mulher,
Menino e Menina”). Em 1975, ainda tratando de David, o pesquisador
escreveu: “O comportamento dela é tão semelhante ao de uma pequena
garota ativa, e tão diferente, por outro lado, do jeito masculino do
irmão dela, que não oferece nada para estimular conjecturas” .
Reforçado
pelo exemplo de “Brenda” Reimer, a tese de Money ganhou força. Aquilo
que Simone de Beauvoir havia afirmado sem respaldo científico parecia
ter sido confirmado pelo respeitado pesquisador. Rapidamente, a teoria
da identidade de gênero desvinculada do sexo biológico ganhava força.
Mas
Money havia acobertado a verdade: o experimento foi um fracasso. Em
1997, dois pesquisadores que investigaram o episódio a fundo descobriram
que, aos 14 anos, o garoto rejeitou a identidade imposta a ele e,
posteriormente, fez uma cirurgia para reconstruir sua genitália
masculina. David se suicidou em 2004.
O
desfecho trágico desse caso expôs não apenas os métodos condenáveis de
Money, mas também colocou em xeque a teoria de que a identidade sexual é
algo que pode ser completamente dissociada do sexo biológico.
Contra a natureza
Apesar
de suas teorias radicais no campo da sexualidade, John Money não se via
como um militante da esquerda. Em um artigo publicado em seus anos
finais de vida, ele colocou as forças da religião ao lado do marxismo
como inimigas dos novos costumes sexuais. “As forças da anticiência são
poderosas, como são as forças do autoritarismo religioso, seja a
religião ortodoxa, neomística ou marxista”, argumentou.
Hoje,
entretanto, movimentos e partidos de orientação marxista adotaram
praticamente todos os itens da agenda de John Money no campo da
identidade de gênero. Ele apostou contra a natureza humana e perdeu. Mas
sua influência continua presente.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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