Os programas “Buy American” e “Make it in America”, de Biden, procuram proteger e apoiar a classe média que perdeu com a concorrência internacional. Como Trump, Biden está, através de meios diferentes, a apelar a uma população desiludida com a globalização. Sem o ufanismo típico da imprensa brasileira, uma análise realista do que pode ser o governo Biden, por Inês Domingos, para o Observador:
O
Presidente eleito Biden anunciou, na campanha, que iria lançar um plano
de investimento de dois biliões de dólares nos próximos dez anos em
infraestruturas, indústria automóvel, transportes públicos,
requalificação de edifícios, construção e energia, o que corresponde,
sensivelmente, a 0,75% do PIB, em média, até 2030. O objetivo é apoiar
as empresas e as famílias e atingir a neutralidade carbónica em 2050.
Para
além destes investimentos, Biden propõe aumentar a despesa em educação,
saúde e segurança social. Segundo as estimativas do Committee for
Responsible Federal Budget, um think tank independente, a despesa total
do programa do Presidente eleito Biden poderá, assim, atingir 10 biliões
de dólares nos próximos dez anos.
Para
financiar a despesa, deverá tentar reverter alguns cortes nos impostos
decididos por Trump: aumentar a taxa máxima sobre os rendimentos das
famílias, de 37% para 39,6%, e a taxa máxima sobre os lucros das
empresas, de 21% para 28%. Entre outros aumentos, propõe também duplicar
a taxa sobre os lucros das empresas subsidiárias americanas localizadas
no estrangeiro para 21%. Esta medida serve também para reforçar o plano
“Make it in America” com o qual pretende reforçar a indústria
transformadora dos EUA.
A
receita estimada destas medidas é de 4,3 biliões de dólares, ou seja,
cerca de 1,6% do PIB. em média por ano. até 2030, insuficientes para
compensar o aumento da despesa. O aumento do défice neste cenário seria
de 5,6 triliões de dólares, nos próximos dez anos.
A
dívida pública nos Estados Unidos foi de 106,9% do PIB em 2019 e no
segundo trimestre de 2020 já tinha atingido 135% do PIB. Embora seja
expectável que ao longo dos próximos anos as medidas de emergência sejam
gradualmente eliminadas, o endividamento está a atingir níveis que
começam a ser preocupantes, antes ainda das propostas de Biden. De
qualquer forma, sem maioria no Senado, ele terá uma margem relativamente
curta para aplicar a receita que propôs na campanha.
No
que diz respeito à política de comércio externo, num artigo da revista
Foreign Affairs, Biden criticou o protecionismo e a política de Trump de
aumentar as tarifas sobre as importações do Canadá e da União Europeia.
No entanto, também prometeu, que, consigo, os Estados Unidos não
negociarão um novo acordo comercial antes de “investir nos americanos
para que possam estar preparados para competir na economia global”.
Sobre a China, referiu também, que é necessário ser “duro”, em
particular no que diz respeito aos direitos humanos, mas que há áreas de
cooperação, incluindo na ação climática. Assim, propõe-se coordenar com
os parceiros europeus uma resposta eficiente ao desafio colocado pelo
crescimento da China, em particular nas áreas tecnológicas.
A
política económica de Biden afasta-se da de Trump, sobretudo na área
fiscal e na saúde. Com efeito, enquanto Biden propõe aumentar os
impostos sobre os rendimentos mais elevados para financiar despesa,
Trump propôs continuar a reduzir os impostos e fazer cortes na despesa
em saúde.
Mas
há áreas em que a estratégia económica não mudará de forma radical. Os
programas “Buy American” e “Make it in America” de Biden, procuram
proteger e apoiar a classe média que perdeu com a concorrência
internacional. Como Trump, Biden está, através de meios diferentes, a
apelar a uma população desiludida com a globalização.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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