Sem material
probatório para avançar, a Polícia Federal pede que o prazo de
investigação seja prorrogado em 60 dias. Barroso autoriza. Por quê?
Porque sem material probatório para avançar. Ato contínuo, o que pede
também? Para que o sigilo bancário do presidente seja quebrado. Barroso
autoriza. Por quê? Porque sem material probatório para avançar.
Isso é o Brasil, onde
garantias individuais são cassadas em nome da caça aos bandidos
escolhidos. Isto é o Brasil: se estamos certos de que Temer é um
criminoso, que se faça de tudo para comprovar a convicção. E que se dane
se existem regras para perscrutar os dados bancários de alguém; que se
dane, portanto, se não há elementos, indícios, que justifiquem a ação:
que se vasculhem as contas do sujeito até encontrá-los. O que
caracteriza essa inversão da ordem investigativa tem nome: Estado
policial.
A cousa prossegue — o
mergulho no arbítrio: Gilmar Mendes restringe o recurso à condução
coercitiva; Barroso, como alternativa àquele instituto, autoriza a
prisão temporária de indivíduos que, jornalisticamente (juro), são
chamados de “amigos de Temer”; ouvidos os presos e cumpridas as buscas,
depois de pisoteada a presunção de inocência, a PGR pede que os detidos
sejam soltos. Barroso autoriza. Já havia dado seu passa-moleque em
Mendes, com o que restaria evidente: sem meios para aplicar a condução
coercitiva, optara por substituí-la simplesmente submetendo os
investigados à cadeia — e assim ainda provocar o colega. “Aprendeu,
Gilmar?” — decerto pensou o justiceiro.
Petistas não gostaram
da série “O mecanismo”. Certamente não a entenderam. Barroso entendeu —
e gostou. O roteiro poderia ter sido escrito por Janot, sob a
supervisão de Fachin ou do próprio Barroso. O leitor esteja certo de que
Dallagnol e trupe jacobina adoraram. “O mecanismo” é objetivo — um
presente para Lula: a atividade política consiste em coisa de bandido e
todos os políticos (menos Freixo), de todos os partidos (menos do PSOL),
são igualmente criminosos. Sem nuances, sem graus, sem diferenças, sem
naturezas ideológicas — como se não houvesse, para muito além do roubo
aos cofres públicos, o projeto autoritário de poder bancado por meio do
roubo aos cofres públicos.
Engrenagem sem
caráter para a locupletação de canalhas, “O mecanismo” ignora a política
e menospreza o autoritarismo — aquilo que o grosso do dinheiro desviado
financia: a permanência antidemocrática de um grupo no poder.
Consequência: o caixa 2 generalizado e o recebimento individual de
propinas caem na mesma vala comum de percepções onde repousa, todo
disfarçado (e, pois, feliz), o assalto ao Estado para sustentar o
programa hegemônico sem precedentes de um partido. Os petistas não
compreenderam; mas “O mecanismo” os anistia e reabilita, conforme
indicam as pesquisas eleitorais: se são todos delinquentes da mesma
índole, se distinções não há, ou se são irrelevantes quando se pensa na
causa maior (o combate à corrupção), revigorado estará aquele que
liderou a tentativa de tomada do país pela máquina partidária.
Se você, porém, acha
que é isso mesmo, que é tudo mesmo igual e que esses vagabundos são
todos da mesma laia, é isto mesmo: você comprou “O mecanismo”; você
explica por que, mesmo condenado em segunda instância, Lula encabeça
todas as pesquisas referentes a 2018. Sua sede de sangue legitima essa
miséria. Legitima também o ativismo judicial — o modus operandi de um
Barroso — em bárbara ascensão no Brasil: aqui onde todos já são
suspeitos, todos sob permanente desconfiança e, ora, investigação.
Esqueça Temer.
Esqueça também o estado de direito, se não lhe for importante. Pense no
próximo presidente; oportunisticamente, naquele candidato de sua
predileção — e avalie se terá condições de governar. Se considera bom
que um juiz invada a competência exclusiva de outro Poder e impeça a
nomeação de um ministro pelo presidente porque, afinal, esse é Temer ou
alguém que despreza: pense se seria diferente com qualquer outro
político; diga-me, antes de celebrar o cerco ao presidente, se seria
diferente com Bolsonaro?
Bem, com Lula era
diferente. Né? Talvez diferente também fosse com Cármen Lúcia ou Joaquim
Barbosa na Presidência. O que isso quererá dizer? Quem dirige — ou
trava — hoje o país? O mais duradouro mal plantado pelo petismo foi a
sindicalização das instituições, o Supremo sendo apenas a mais eloquente
expressão de uma cultura que, no Ministério Público, faz multiplicarem
os Janots.
Que não se espere
qualquer pacificação nacional com a eleição do próximo presidente —
tenha quantos milhões de votos tiver. Para governar, não precisará
apenas negociar com o Congresso. Isso já é passado romântico. Para
governar, deverá contar sobretudo com o apoio do blocão de privilegiados
influentes composto pelos partidos do Judiciário, do MP e da PF. Quanto
custará? Para começo de conversa: uma reforma da Previdência.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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