Por
coincidência ou por força do destino, neste ano de 2024, celebramos na
mesma data, 11 de agosto, o dia dos pais e o dia da advocacia. A
paternidade vivenciada com amor, responsabilidade e presença é
estruturante para a formação psicoemocional das crianças e determinante
do proceder dos adolescentes e adultos. Uma sociedade emocionalmente
saudável demanda pais presentes, amorosos e responsáveis.
Infelizmente,
o Brasil vive a triste realidade do abandono afetivo e da negativa de
paternidade. De acordo com a Associação Brasileira de Registradores
Civis de Pessoas Naturais (ArpenBR), no ano de 2023, 172,2 mil crianças
nascidas no Brasil foram registradas apenas com o nome da mãe. Ainda de
acordo com o Instituto de Geografia e Estatística (IBGE), também no ano
de 2023, 48,7% dos lares brasileiros tinham as mulheres como as
responsáveis pelo cuidado integral dos filhos. Confesso que esses dados
me comovem e me preocupam profundamente.
Por
esse motivo, eu gostaria de falar com vocês, meus colegas da advocacia,
jovens e estudantes, assim como com os que me seguem em minhas redes
sociais ou que escutam o meu programa na rádio CBN, para enfatizar a
necessidade urgente de adoção de políticas públicas voltadas à
responsabilidade paterna e à assistência dos filhos órfãos de pais
vivos. Eu, como uma advogada familiarista, atuante há mais de 20 anos,
tenho presenciado através das causas que defendo as dores dessa luta em
prol da paternidade efetiva e responsável.
Esta
situação me fez pensar também na realidade da advocacia baiana no que
se refere ao que poderíamos chamar de “abandono institucional”. Composta
por 61.919 (sessenta e hum mil, novecentos e dezenove) advogado(a)s
ativos, a advocacia baiana atravessa tempos difíceis, especialmente a
jovem a advocacia. Nossos jovens ingressam nessa carreira tão linda
tomados de entusiasmo e por grandes sonhos, mas logo no início se
decepcionam ao se depararem com condições de trabalho adversas, que vão
desde uma remuneração desrespeitosa, passando pela inexistência de piso
salarial, morosidade do Poder Judiciário e culminando com os maus tratos
até de magistrados e servidores – estes últimos, uma absoluta minoria,
devo salientar -, mas cujo efeito é devastador na classe.
E
seguindo o antigo ditado popular: “a palavra ensina, mas o exemplo
arrasta”, foi que no último dia 1 de agosto, no mês em que comemoramos a
advocacia, advogados foram humilhados até por estagiários no 4 Cartório
Integrado de Consumo da Comarca de Salvador, alcançando o ápice do
absurdo quando a negativa de atendimento, desta feita pelo magistrado,
alcançou inclusive a própria OAB, fato registrado em imagens que
circularam por dias em grupos de WhatsApp como um apelo coletivo para
que a Instituição adotasse alguma medida que nos transmitisse esperança
por dias melhores e um sentimento de cuidado e de acolhimento. Mas o
constrangimento sentido pela advocacia baiana diante da constatação da
sua impotência perante o Poder Judiciário foi rapidamente suplantado
pelo sentimento de estarrecimento diante da desconcertante nota emitida
pela AMAB, que, no dia 2 de agosto, em defesa da sua entidade de classe e
revelando que não está para brincadeira quando o assunto é proteger os
seus, além de apoiar a conduta do magistrado desconsiderou que a
advocacia é indispensável à administração da justiça (art. 133 CF/88),
na medida em que utilizou expressões fortes como “invasão constante de
gabinetes”, “destempero”, “truculência e ausência de capacidade de
compreensão”.
À
nota da AMAB, a OAB segue apequenada e emudecida, mas festejando nas
redes sociais o mês da advocacia. Tal qual as 172,2 mil crianças
abandonadas em todo Brasil, aqui na Bahia, a jovem advocacia, estudantes
e nós, advogadas e advogados de forma geral, também sentimos na pele
uma forma de abandono material e institucional. Eu gostaria muito de
celebrar este mês de agosto com frases festivas nas redes sociais, mas
meu sentimento de responsabilidade e compromisso me conduzem à convocar
toda a advocacia a um momento de reflexão e mudanças. Que assim seja o
mês da advocacia, um prenúncio de mudanças que estão por vir.
Ana Patrícia Dantas Leão é advogada e foi candidata à presidência da OAB-BA.
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