BAHIA NOTICIAS
por Catia Seabra, Flávio Ferreira e Julia Chaib | Folhapress
Colaboradores do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva
(PT), têm trabalhado para desenhar uma estrutura jurídica na qual o
Ministério da Justiça passará atribuições a um novo Ministério da
Segurança Pública, uma das promessas de campanha do petista.
Pela proposta em discussão, a nova pasta assumiria o controle da
Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal (PRF), da Guarda Nacional
e dos presídios federais.
A ideia, dizem, é mostrar que o novo governo não vai enxergar o tema
da segurança pública apenas sob o ângulo dos direitos humanos. Nem
apostará prioritariamente no sucesso das políticas sociais como
ferramenta para combate à criminalidade.
Segundo esses aliados, essa mudança --que esvazia a pasta da Justiça e
turbina o novo ministério--, serve também para mudar a imagem que o PT e
partidos de esquerda têm na condução dos temas de segurança pública.
Ainda de acordo com os colaboradores, a intenção é aliar medidas
repressivas de grandes efeitos concretos à adoção de políticas públicas
que envolvam outros setores do governo, como educação, saúde, economia e
defesa.
Entre aliados do presidente eleito, há, no entanto, quem se oponha à
transferência das atribuições, abrindo uma disputa na equipe de
transição do futuro governo, como já informou o Painel. Esses apoiadores
alegam que, pelo menos, a PF deveria ser mantida na estrutura do
Ministério da Justiça.
Há integrantes da própria corporação que defendem a permanência da PF
na alçada da Justiça. Uma justificativa seria a proximidade com temas
ligados ao Judiciário.
Os defensores dessa manutenção também dizem que um ministério da
Segurança que inclua os policiais federais e mais PRF, Guarda Nacional e
sistema prisional tende a se tornar palco de disputas corporativas que
podem minar a atuação integrada desses segmentos.
Afirmam também que no modelo com dois ministérios na área jurídica
pode faltar articulação e velocidade em operações que tenham que
envolver órgãos como a PF e o Cade (Conselho Administrativo de Defesa
Econômica), órgão responsável pela defesa da livre concorrência, que
ficariam em pastas diferentes.
Para rebater o argumento de que o novo ministério fortalecido é uma
promessa de campanha, os opositores à ideia lembram que na campanha de
2002 Lula também prometeu uma pasta para a Segurança Pública, mas
desistiu após intervenção de Márcio Thomaz Bastos, que assumiu a
Justiça.
Pelo formato em discussão, restaria ao Ministério da Justiça
principalmente a articulação com os poderes Judiciário e Legislativo.
A pasta da Justiça já deve perder a Funai (Fundação Nacional do
Índio) para o também prometido Ministério dos Povos Originários, que
abarcará todos os órgãos ligados à proteção dos indígenas.
O Ministério da Justiça ainda continuaria com o Cade e o DRCI
(Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica
Internacional), que faz a ponte com o Judiciário de outros países e
cuida da repatriação de valores resultantes de crimes.
Lula defendeu, publicamente, a criação do novo ministério no dia 30
de agosto, durante reunião com governadores e especialistas em segurança
pública.
"Estamos propondo a criação do Ministério da Segurança Pública sem
que haja nenhuma interferência na política do Estado. O que queremos é
aumentar a participação da União sem interferir naquilo que é obrigação
dos estados hoje", disse Lula.
Consultora sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a
pesquisadora Isabel Figueiredo, que participou da reunião, se diz feliz
com o que chamou de sinalização do presidente eleito. "É um recado para a
população e para as forças de segurança de que essa pauta vai ser
importante no próximo governo", afirma.
Segundo a especialista, há muita mudança na dinâmica criminal do
país, sendo um exemplo disso a presença da facção criminosa Primeiro
Comando da Capital (PCC) na Amazônia.
Na opinião da pesquisadora, o desmembramento facilitaria a gestão do
Ministério da Justiça, hoje consumida em demandas diversas. "A segurança
pública no Ministério da Justiça acaba demandando muita energia do
ministro na gestão das crises cotidianas", diz.
Responsável pelo debate sobre segurança pública durante a elaboração
do plano de governo de Lula, o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP)
afirma que a criação do ministério já é um compromisso do presidente
eleito.
Teixeira lembra que a proposta consta dos 13 pontos apresentados por
Lula no dia 27 de outubro, a três dias do segundo turno, no documento
chamado de Carta para o Brasil do Amanhã.
"Vamos criar o Ministério da Segurança Pública para implementar o
Sistema Único de Segurança Pública, com polícias bem equipadas,
treinadas e remuneradas", começa.
O texto promete ainda a retomada do Pronasci (Programa Nacional de
Segurança Pública com Cidadania), para profissionalização de agentes de
segurança, e fortalecimento do trabalho da Polícia Federal e da Força
Nacional.
A promessa foi também uma resposta aos ataques veiculados na
propaganda eleitoral do presidente Jair Bolsonaro (PL). Em uma das
peças, suspensa pela Justiça eleitoral, a visita de Lula ao Complexo do
Alemão, no Rio de Janeiro, foi usada na tentativa de associar o petista à
criminalidade.
Durante a campanha, Lula também prometeu a criação do Ministério da
Segurança Pública com foco no combate ao tráfico de drogas e controle de
armas nas fronteiras brasileiras. Essa promessa se contrapõe à política
armamentista de Bolsonaro.
A adoção de medidas mais rígidas para combate à criminalidade foi incorporada durante a elaboração do plano de governo de Lula.
O texto original continha dois parágrafos, propondo "uma segurança
pública cidadã para a proteção da vida". Os representantes do PSB,
partido do vice da chapa, Geraldo Alckmin, apresentaram nova redação, na
qual passaram a constar os termos repressão e combate.
Uma emenda incorporada também propõe a valorização do profissional de segurança.
Atualmente, o mais cotado para assumir o Ministério da Segurança é o
ex-governador do Maranhão e senador eleito Flávio Dino (PSB-MA). Embora,
por ser juiz, seu perfil seja mais adequado para a Justiça, Dino é
apontado como um nome forte para a nova pasta.
Para a Segurança também são lembrados nos círculos petistas os nomes
do sociólogo e ex-ouvidor da Polícia de São Paulo Benedito Mariano e do
antropólogo e ex-secretário Nacional de Segurança Pública Luiz Eduardo
Soares.
Para o Ministério da Justiça, os mais citados, além de Dino, são os
advogados e professores universitários Pedro Serrano e Silvio Almeida,
colunista da Folha, e a senadora e advogada Simone Tebet (MDB-MS), que
foi candidata à Presidência.
Aliados do presidente eleito dizem que ele tem grande estima pelo
ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski. Por
isso, o nome do magistrado é citado por petistas como uma opção para
pastas ligadas à Justiça.
Lewandowski, porém, já indicou a interlocutores que não pretende
participar do governo. Seu nome, então, passou a ser cogitado para uma
embaixada, caso ele queira.
Concretizada a criação da nova pasta, essa será a primeira vez que um
governo petista contará com o Ministério da Segurança Pública em sua
estrutura.
No governo Lula, o Ministério da Justiça teve à frente dois nomes
fortes, Márcio Thomaz Bastos (2003-2007) e Tarso Genro (2007-2010), além
de Luiz Paulo Barreto (2010).
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