Muitas vezes falei neste blog contra o relativismo. Tentarei explicar qual é a minha bronca com os relativistas em geral. Não acho que tudo seja relativo, nem considero que tudo seja absoluto. Há nuances.
Ninguém
foi tão iluminante ao caracterizar as diferenças entre relativo e
absoluto quanto o saudoso Robert Nozick (falecido em 2002, e do qual só
foi traduzido aqui o juvenil Anarquia, Estado e Utopia, livro que já o
irritava). Sua última obra, Invariâncias, traça o seguinte quadro:
Relativismo radical - "todas as verdades são relativas";
Relativismo brando - "algumas verdades são relativas";
Absolutismo radical - "todas as verdades são absolutas";
Absolutismo brando - "algumas verdades são absolutas".
Se
você quiser, pode substituir a palavra "verdade" por "conhecimento".
Ora, algumas verdades (ou conhecimentos) são, de fato, relativas a um
indivíduo: sei qual a parte do corpo que me dói. Mas há verdades que são
absolutas, isto é, objetivas, universais: a biologia e a física da
América do Sul não são diferentes da biologia da Rússia ou da China. O
DNA é DNA em qualquer lugar, assim como a tabela periódica dos
elementos.
O
que o epistemólogo Nozick (que estava longe de ser somente o filósofo
político da juventude) mostra muito bem é que há compatibilidade entre
um relativismo brando e um absolutismo igualmente brando. As verdades ou
conhecimentos das ciências são absolutas (principalmente as das
ciências formais, como a matemática e a lógica), isto é, valem para
todos. Mas o reconhecimento dessas verdades não elimina as verdades
relativas, isto é, os conhecimentos relativos a uma pessoa ou grupo.
Ocorre
que os conhecimentos relativos a uma pessoa ou grupo podem - e devem,
em casos exigidos - se tornar objetivos, universais: se eu relato em uma
reportagem aspectos de uma cidade que só eu conheço, transformarei isto
em conhecimento universal, desde que isto possa ser checado por
qualquer pessoa, comprovando a verdade ou falsidade de meu relato.
O
problema - eis a minha bronca - é que predomina nas ditas ciências
humanas e sociais o relativismo mais radical, que é um narcótico. Onde
ele perdurar, não há ciência, já que, para esta postura nefanda, todas
as verdades ou conhecimentos são relativos a indivíduos, grupos, tribos,
sistemas, culturas, países etc. A ciência é universal ou não é ciência.
Resumindo: em relação a métodos, o que só vale para a América Latina -
ou para a Europa - não é ciência, mas ideologia (e haja saquinho, por
favor!).
(Post publicado há anos no blog)
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