Virou tendência na França e a mulher do presidente manda dizer que vai processar. Será melhor ou pior para ela? Vilma Gryzinski:
Sempre
foi assim: quando alguém tem raiva de uma mulher, seja por um incidente
de trânsito ou uma discussão no Parlamento, os primeiros xingamentos
são vinculados à sexualidade. Ou ela é profissional do ramo ou gosta do
mesmo sexo.
Agora,
surgiu uma terceira forma de tentar derrubar uma mulher visada: dizer
que ela é, na verdade, homem. Ou foi, sendo agora mulher trans.
Isso
está acontecendo com Brigitte Macron, a mulher do presidente francês
cuja intimidade sempre despertou muita curiosidade porque ela é 24 anos
mais velha do que o marido, a quem conheceu quando ele assistia suas
aulas de teatro quando tinha 15 anos, num colégio jesuíta.
A
infâmia se tornou a hashtag #JeanMichelTrogneux e virou trend no
Twitter durante dias seguidos. Trogneux é o nome de família de Brigitte e
o “Jean Michel” seria seu nome original.
Ter
que passar por isso aos 67 anos, três filhos (do primeiro casamento) e
sete netos, é talvez mais do que se possa exigir de alguém levada,
indiretamente, à exposição da vida pública.
Através
de seu advogado, Brigitte disse que vai abrir processo. Quem? A
história parecer ter seu original em Natacha Rey, que se diz jornalista
independente e praticante de “outras atividades artísticas”. Numa
entrevista via YouTube, ela afirmou que passou três anos levantando o
caso, ao qual foi levada, em primeiro lugar, pela “estranheza física” de
Brigitte. Um jornal obscuro de extrema-direita, Faits e Documents,
abriu a porteira.
A
mulher do presidente está certa em apelar à justiça ou vai acabar
chamando mais atenção ainda para um caso de virar o estômago?
Brigitte
desenvolveu um couro bem grosso depois que se apaixonou por um
adolescente da mesma classe que sua filha, largou o marido por causa
dele e desafiou uma montanha de convenções para construir com o jovem
“Manu” uma parceria dada por inevitavelmente condenada.
Pode
ser admirada por isso, principalmente por mulheres mais velhas que
acham a história de amor o máximo, ou condenada por um relacionamento
que hoje seria considerado abusivo e daria até cadeia.
Mas todos têm que concordar que a sórdida boataria que a dá por mulher trans visa, acima de tudo, Emmanuel Macron.
A
sexualidade do presidente também é objeto de muitas especulações e
contestar a natureza feminina de sua esposa casa com esse tipo de boato.
O movimento chegou ao ápice à véspera da eleição de 2017, que Macron
ganhou espetacularmente com 66% dos votos. Ele chegou a abordar o
assunto, dizendo que passa o dia inteiro, “de manhã até a noite”, com
Brigitte. Se tivesse uma vida paralela, como diziam os fofoqueiros, só
se fosse via um holograma.
Macron
disputa a reeleição agora em 2022 e nem a mais ingênua das almas acha
que os boatos sobre Brigitte não estão ligados a isso. Em 2017, muitas
das fofocas foram explicitamente espalhadas pelo aparelho de
desinformação da Rússia – Vladimir Putin tem especial predileção por
Marine Le Pen, o que talvez seja uma decepção para as almas ingênuas que
o admiram e aplaudem no campo esquerdista.
Brigitte
Macron não é a primeira a sofrer uma tentativa de “roubo” de
sexualidade por estar numa posição de alta visibilidade política. Há
anos, o mesmo tipo de boataria circula em comentários de sites
conservadores sobre Michelle Obama.
O
rei de todos os conspiracionismos, Alex Jones, chegou a fazer uma
sequência de dez minutos de cenas com Michelle, uma mulher imponente de
1,80 metro e braços torneados, “mostrando” insinuações de um pênis por
baixo de suas roupas. De novo, é de vomitar e, de novo, obviamente, o
alvo é o marido, Barack Obama.
Na
Nova Zelândia, pelo menos, o objeto da mesma sordidez é a
primeira-ministra Jacinda Ardem. Nem o fato de que ele levou o filhinho
recém-nascido para uma sessão do Parlamento dissuade os mal
intencionados.
Hillary
Clinton teve um tratamento mais clássico. Adversários conservadores
davam como “certo” que ela tinha um caso com a assessora Huma Abedin.
Não arredaram pé nem quando a vida real se mostrou mais interessante:
Anthony Weiner, o marido judeu de Huma, muçulmana de origem
paquistanesa, teve que renunciar à candidatura a prefeito de Nova York
depois de cair na armadilha montada por um tabloide inglês e trocar
textos picantes com uma menor de idade.
Nome fantasia: Carlos Danger.
Dizer
que um líder político é casado com uma mulher trans é uma “evolução” da
era contemporânea da maledicência mais convencional, que dá os
dirigentes por maridos traídos, outra intriga recorrente e
incontrolável.
Políticos
brasileiros que já fizeram comentários nada cavalheirescos sobre a
aparência de Brigitte Macron deveriam saber como este é um campo
desconfortável.
Como
Macron está subindo nas pesquisas – 26%, contra 17% para Valérie
Pécresse e 16% para Marine Le Pen -, a usina de infâmias não vai fechar
tão cedo.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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