Teve muita gente comemorando a anulação dos processos contra Lula. Gente demais. Sinal de que estamos mais afundados no poço do mau-caratismo que nunca antes. Flavio Quintela via Gazeta do Povo:
Os
brasileiros começaram a semana com a notícia de que Lula poderá
concorrer à Presidência em 2022. Muitos deles lamentaram profundamente.
Outros muitos, no entanto, comemoraram. Alguém dirá que me refiro aos
petistas e lulistas. Ledo engano. Tem bastante gente que vestiu camiseta
verde e amarela, foi para as ruas contra o PT, aplaudiu o impeachment
de Dilma, e agora comemora, ainda que contidamente, a liberação de Lula
para se candidatar.
Os
Bolsonaro, com certeza, comemoraram. Até meus três cachorros já
entenderam que Jair jamais seria presidente de um país que não houvesse
tido o PT no governo por mais de uma década. Jair e Lula são quase como
um yin e yang. A diferença é que existe um lado luminoso no yin-yang. Os
filhos também devem ter feito uma festa, já que as chances de reeleição
do papai aumentaram consideravelmente. Não só comemoraram como torcerão
por Lula e, quem sabe, apertarão 13 no primeiro turno para garantir que
a disputa permaneça em casa.
Os
bolsonaristas mais realistas também comemoraram. A maioria deles o fez
em silêncio, ou durante o banho, com aquele “Yes!” acompanhado de uma
descida do antebraço com a mão fechada em punho. Ninguém viu, mas eles
comemoraram mesmo assim. Sabem que seu político do coração se alimenta
principalmente da polarização. Em breve poderão, mais felizes que nunca,
sair por aí repetindo seu mantra, “senão o PT volta”, agora em versão
personalizada, “senão o Lula volta!”.
Os
bolsonaristas de fé, aqueles que continuam acreditando que Jair foi
enviado por Deus para salvar o Brasil, comemoraram em seu inconsciente,
mas ainda não sabem disso. Alguns, depois do baque da notícia e da
vontade de sair fazendo passeata contra o STF, sentaram e pensaram que
sempre há um lado positivo para as coisas ruins, e o positivo de termos
Lula contra o mito é podermos contar de novo com a turma que abandonou o
barco. Afinal, ninguém da direita vai votar no Lula, certo?
A
turma do Centrão também comemorou. Afinal, o Centrão sempre estará
pronto a abraçar quem quer que ocupe a Presidência e que, por meio de
muitos esquemas bem conhecidos, despeje o dinheiro público nos bolsos
certos. O Centrão tem votos, o Centrão tem em suas mãos o poder de
avançar ou bloquear projetos de lei em andamento. O Centrão adora ser
Centrão e adora poder vender caro a sua influência. No Brasil pós-Lava
Jato, então, vão nadar de braçada em qualquer um dos governos. Aliás, se
o Centrão pudesse escolher, montava uma chapa só. Lula presidente e
Bolsonaro vice. E versa.
O
jornalismo chapa-branca comemorou. Alguns vestiram uma fantasia de
indignação, outros foram mais diretos, mas todos comemoraram. Poder usar
o medo da volta do PT em textos, colunas, entrevistas, programas,
podcasts, lives etc. não tem preço. Para todas as outras coisas existe
aquele cartão da propaganda. Antevejo um retorno glorioso aos tempos em
que batiam no governo, um requentamento de matérias antigas, aquela
tirada de poeira das palavras de ordem que se tornaram tão démodé na
atual presidência.
O
jornalismo de esquerda comemorou. Eles não precisaram nem disfarçar.
Finalmente, poderão solidificar a teoria de que Lula foi injustiçado e
Dilma sofreu um golpe. Suas teorias da conspiração ganharam legitimidade
pelas palavras de um ministro do Supremo. Que alegria! Poder defender
Lula novamente, sem o medo de ser avacalhado. Na verdade, a excitação é
ainda maior porque agora a turma do outro lado está do mesmo lado da
comemoração. É um verdadeiro bacanal, o carnaval que faltou em 2021.
Pensando
bem, teve muita gente comemorando. Gente demais. Sinal de que estamos
mais afundados no poço do mau-caratismo que nunca antes. Talvez você não
tenha comemorado. Espero que não. Não há nada para se comemorar.
Achávamos que a polarização PT-PSDB era ruim. Mas o Brasil é a terra,
por excelência, do “nada é tão ruim que não possa piorar”. Ganhamos
Lula-Bolsonaro, Bolsonaro-Lula. Como diria Charlie Brown, que puxa.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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