Sem votos para convocar depoimentos adicionais, a oposição democrata
fica sem instrumentos para impedir a previsível absolvição do
presidente. Vilma Gryzinski:
Quem disse as frases a seguir:
“As acusações dirigida contra mim são injustas e descabidas”.
“Desde a proclamação dos resultados eleitorais, os que apoiavam o
candidato derrotado fizeram de tudo para impedir a minha posse e a
estabilidade de meu governo”.
“Não é legítimo, como querem os meus acusadores, afastar o chefe de
Estado pelo ‘conjunto da obra’. Quem afasta o presidente pelo ‘conjunto
da obra’ é o povo e só o povo, nas eleições”.
Foi Dilma Rousseff, mas poderia ter sido Donald Trump.
Um presidente submetido a impeachment terá sempre argumentos
parecidos: a oposição quer passar por cima do resultado das urnas,
derrubá-lo sob pretextos frágeis, ganhar no tapetão. Em outras palavras,
dar um golpe.
Qual a diferença entre a ex-presidente do Brasil e o presidente atual dos Estados Unidos?
No que interessa aqui, simplesmente os votos. A maioria republicana no Senado defendeu o forte. Fez o seu papel.
Não existiam nem remotamente, as montanhas de ilegitimidades
dolorosamente comprovadas quando Richard Nixon foi confrontado com a
realidade: ou renunciava ou seu próprio partido votaria contra ele.
Renunciou.
A oposição democrata também fez a sua parte. Os deputados
encarregados de apresentar diante do Senado os argumentos pela
condenação de Trump, na maioria saídos da carreira jurídica, prepararam
um picadinho presidencial diário e incessante, servido diante das
câmeras e regado a evocações dos fundadores da pátria.
Exageraram, maquiaram fatos ou até ampliaram, e bastante, os limites
da verdade , para não falar da Constituição americana, para apresentar
Trump como um trambiqueiro que quis forçar um país vulnerável, a
Ucrânia, a investigar um adversário político, Joe Biden, e seu filho,
contratado a peso de muitos milhares de dólares por um oligarca
ucraniano.
Mas foram profissionais, didáticos e convincentes. A maioria dos
americanos acredita que Trump fez “alguma coisa” errada na Ucrânia.
Errado o suficiente para removê-lo do cargo de presidente dos Estados Unidos?
Não, dirão os senadores da maioria republicana.
Nem sequer para convocar depoimentos adicionais aos levantados
durante a fase de inquérito, na Câmara, apesar da votação apertada: 51 a
49.
Sem os depoimentos, o processo caminha para seu fim natural: a absolvição.
A tática da oposição era prolongar ao máximo possível a malhação de
Trump. Para isso, precisavam do voto de apenas quatro senadores
republicanos. Conseguiram dois.
O plano era criar um novo John Dean, o advogado de Nixon que
participou de todas as armações para acobertar o caso Watergate, uma
operação de espionagem de quinta categoria do comitê democrata, e depois
resolveu contar tudo.
O carrasco de Trump seria um outro John, Bolton, o bigodudo
ex-assessor de Segurança Nacional que saiu brigado e está com um livro
ainda não publicado, vazando o que pode sobre a encrenca ucraniana.
Seria, potencialmente, uma cacetada e tanto. Ao New York Times, que o
considerava um brucutu da pesada, Bolton disse, sob sigilo de fonte,
que recebeu instruções diretas de Trump para colaborar com as pressões
sobre o governo ucraniano para arrancar a investigação que prejudicaria Joe Biden.
Seria um depoimento pesado em favor do argumento de abuso de poder, o fundamento do impeachment de Trump.
Não deu certo. Os democratas já sabiam disso? O mais bobo ali nada de
costas no rio cheio de piranhas que é o habitat natural da política
parlamentar.
Todo o processo de impeachment na Câmara e depois o julgamento no
Senado foi armado uma gigantesca – e gratuita – propaganda eleitoral
contra Trump.
Conta pontos importantíssimos na próxima batalha, a eleição presidencial de novembro.
Ironicamente, mais uma vez, no mesmo momento em que os democratas
perdem a batalha do impeachment, mas comemoram as lambadas em Trump, o
partido entra numa fase periclitante.
Joe Biden, o provável adversário que Trump tentou destruir
preventivamente, está caindo para o segundo lugar nas pesquisas sobre a
candidatura democrata.
Em seu lugar, ascende Bernie Sanders, o senador mais à esquerda no espectro político tradicional.
Ganhar de Trump com um candidato tão fora do padrão fica mais difícil.
Depois da absolvição no Senado, Trump ganha mais um presentinho.
E a eleição presidencial fica mais inesperada ainda.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário