CARLOS HENRIQUE/Hoje em Dia
O casal Lucas e Daniela já montou até o quarto para o futuro membro da família
O excesso de burocracia e a deficiência no quadro de funcionários –
como psicólogos, assistentes sociais e até juízes – são as principais
razões para a morosidade dos processos de adoção de crianças e
adolescentes no Brasil, segundo especialistas. Atualmente, o tempo médio
de espera para conseguir a guarda definitiva de um filho adotivo é de
dois a três anos.
De acordo com a advogada e professora de direito civil da Universidade
Fumec Sofia Miranda Rabelo, a base do problema é estrutural, mas, ao
longo do caminho, outros entraves tornam-se evidentes.
“Sempre tivemos um Estado muito burocrático, desde a colonização. Não
faltam crianças aguardando para ser adotadas, de maneira nenhuma, como
também não faltam pessoas querendo adotá-las, mas os processos não
fluem”, diz Sofia.
Limitações
Segundo ela, os mecanismos empregados pela Justiça também são
questionáveis, porque trazem limitações. “Se um casal dá entrada no
processo pela comarca de Belo Horizonte, por exemplo, ele não pode
passar para outra. O que não faz sentido, porque o tribunal é um só, é
do Estado. Muitas vezes, os pretendentes desistem e tentam a adoção em
outras cidades, mas, aí, têm de começar do zero de novo”, lamenta a
advogada.
Em uma tentativa de agilizar os processos, o Conselho Nacional de
Justiça apresentou mudanças no Cadastro Nacional de Adoção (CNA), onde
são inseridos os dados de quem aguarda novos pais e de quem busca
filhos.
A proposta do novo CNA, que começou a ser implantado no fim de março –
mas só foi apresentado no início deste mês –, é tornar mais fácil o
trabalho dos magistrados da infância e da juventude. Agora, os juízes
precisam preencher apenas 12 itens de informações – antes, eram 35.
Modernização
No novo sistema, o cruzamento de dados de candidatos e pretendentes à
adoção é feito automaticamente. Caso haja compatibilidade de perfis, um
e-mail é enviado ao juiz com um alerta.
“Com a simplificação do preenchimento e as novas ferramentas
disponíveis, o Cadastro Nacional de Adoção será, a partir de agora,
ferramenta mais efetiva para o juiz acelerar e concretizar o processo de
adoção”, considera a corregedora nacional de Justiça, ministra Nancy
Andrighi.
Para Sofia, da Universidade Fumec, no entanto, a medida está longe de
preencher as lacunas do sistema. “Não sei se o caminho é pelo cadastro.
Parece-me que há necessidade de uma reestruturação maior. As demandas
estão aí postas para nós”, conclui.
Ansiedade toma conta de quem aguarda processo
Para quem aguarda o aumento da família pelas vias da adoção, o tempo de
espera até conseguir a guarda definitiva da criança ou do adolescente
parece ser eterno. A bióloga Daniela Nogueira, de 38 anos, deu início à
tramitação na Justiça há cerca de um ano e mal pode esperar para ter a
filha em casa. Por enquanto, a rotina dela é conferir, diariamente, a
página do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) na internet para
acompanhar o andamento do processo.
“Queremos uma menina, negra, de 3 a 4 anos. Disseram-nos que não seria
muito difícil encontrá-la, porque são características menos procuradas,
mas, até agora, nada”, diz Daniela.
Há meses, ela e o marido, Lucas, não recebem nenhuma informação
adicional sobre o andamento do pedido de adoção, a não ser a de que a
Justiça “está em busca de uma criança”, o que só aumenta a expectativa e
a ansiedade do casal, que sonha em ter mais um morador em casa.
Contraponto
O desembargador da 13ª Câmara Cível do TJMG e professor de direito
civil da Escola Superior Dom Helder Câmara, Newton Teixeira Carvalho,
explica que nos casos em que os pretendentes determinam as
características dos candidatos, a demora para a localização pode,
realmente, ser maior.
Ainda assim, ele garante que o Brasil não destoa de outros países no
que diz respeito ao tempo pelo qual os processos se arrastam.
“Mas eu também acho que é o tipo de coisa que não pode caminhar muito
rapidamente. Estamos falando de algo irreversível. Se o pretendente
adota logo e a criança não se adapta (à nova família), não tem como
devolvê-la. O processo é demorado porque há estudos social e
psicossocial da criança e do casal”, ressalta.
Uma alternativa, conforme o desembargador, é pleitear primeiro a guarda
da criança, um estágio probatório para a adoção e que pode ser aprovado
com mais agilidade.
Espera aflita
Para Daniela, não há problema nos critérios da Justiça e ela concorda
com a aplicação deles. Porém, acredita que poderia haver mais
informações disponíveis para quem está do outro lado, aguardando as
movimentações seguintes.
“Todos os passos que tivemos de cumprir, concordo com eles. Até nem
achei tão complicado e moroso, inicialmente. As coisas estavam andando
bem, até chegarem nesse momento, em que já fomos avaliados, e ficaram
paradas desde então”.
Casada há três anos, ela espera realizar em breve a vontade de ser mãe.
“Não sei desde quando – para mim, parece que é desde sempre – eu desejo
formar uma família com (filhos) adotivos e biológicos, mesmo se ainda
fosse solteira. Aí, conheci o Lucas e ele abraçou a causa junto à
família dele”, lembra.
Sob suspeita
Um blog hospedado em servidores do Google Brasil foi alvo de uma ação
civil pública do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), que
apresentou pedido de liminar solicitando a retirada da página do ar.
Para o órgão, o blog “Quero Ser Mãe” atua como intermediário de adoções
ilegais e, por isso, o conteúdo deverá torna-se indisponível e
inacessível.
Violação
“Tais atividades violam o artigo 50 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, que determina que cada Juizado da Infância e da Juventude
deva manter dois cadastros: um com crianças aptas a ser adotadas; outro,
de pessoas interessadas na adoção”, detalhou nota do MPRJ. De acordo
com o Ministério Público fluminense, o Google é objeto da ação porque
opera como provedor de hospedagem, atuando como intermediário,
oferecendo ferramentas de edição e gerenciamento de blogs.
O MP pede que o Google guarde os registros de acesso ao blog sob
sigilo, em ambiente controlado e de segurança, desde o ajuizamento da
ação até o trânsito em julgado, e disponibilize os registros e dados
cadastrais dos acessos de modo a identificar o usuário responsável pelo
blog, sob pena de multa diária de R$ 100 mil por descumprimento.
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