MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Laudos levam até 1 ano para serem concluídos e travam inquéritos em SP


Pela lei, exames da Polícia Técnico-Científica deveriam levar 10 dias.
Mais de 700 laudos do IML e do IC estão atrasados apenas no DHPP.

Kleber Tomaz e Paulo Toledo Piza Do G1 São Paulo

Reprodução de folha do processo que foi entregue aos jurados durante julgamento de Ubiratan pelo massacre do Carandiru (Foto: Reprodução/G1)Foto de um dos laudos do IC sobre o massacre
do Carandiru (Foto: Reprodução/G1)
Laudos periciais em São Paulo que, pela lei, deveriam ser finalizados e encaminhados à investigação no prazo máximo de até 10 dias, estão demorando até um ano para serem concluídos, segundo policiais ouvidos pelo G1. Sem as provas técnicas, inquéritos e processos que deveriam esclarecer crimes e apontar suspeitos ficam emperrados.
Apenas no Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), a equipe de reportagem apurou que mais de 700 laudos periciais ainda não foram entregues e, por esse motivo, estão travando a conclusão dos inquéritos. O departamento tem a incumbência de esclarecer, entre outros crimes, homicídios, agressões, casos de pedofilia, sequestros, desaparecimentos, intolerância e extorsão.
O Instituto de Criminalística (IC) está devendo mais de 300 documentos e o Instituto Médico-Legal (IML), acima de 400 (ambos os órgãos pertencem à Polícia Técnico-Científica). Policiais do DHPP informaram que o tempo de espera pelas respostas técnicas é de 6 meses até 1 ano. Segundo eles, os dados fazem parte de um levantamento que teria sido feito e entregue à Secretaria da Segurança Pública (SSP) com pedidos de providências.
A delegada Elisabete Sato, diretora do DHPP, confirmou que o departamento tem inquéritos parados por causa da demora na entrega de laudos periciais. “Pedi um apanhado de laudos que faltam nos inquéritos para concluir esses inquéritos. O apanhado revelou mais de 700 laudos faltantes. O DHPP investiga todas as mortes suspeitas, mas não dá para saber a causa das mortes sem laudos”, afirmou a delegada.
Essa demora na entrega dos documentos ocorre em meio à escalada da violência no estado, com o aumento no número de assassinatos no último ano. Para especialistas, esse quadro passa a sensação de impunidade ao cidadão e ao bandido, contribuindo para aumento da criminalidade.
Inquéritos investigados por ano pelo DHPP (números aproximados)
2010 1.700
2011 2.900
2012 5.900
2013 (janeiro) 400
O número de casos de homicídios dolosos (com intenção de matar) cresceu 16,9% no estado em janeiro deste ano em relação ao mesmo mês de 2012, segundos dados da SSP. Foram 416 casos, com 455 vítimas. Em uma mesma ocorrência pode haver mais de uma morte. No mesmo período do ano passado, ocorreram 356 casos, com 386 mortes.
Mas por que os exames estão atrasados? O G1 não conseguiu localizar a diretoria da Polícia Técnico-Científica, que coordenada o IC e IML, para comentar o assunto. Nesta quinta-feira (28), o diretor da Polícia Técnico-Científica de São Paulo, Celso Perioli, deixou o cargo após quase 15 anos na função. Procurada, a assessoria de imprensa da SSP confirmou a saída, informando que Perioli entregou o comando. Os motivos da demissão não foram informados pela pasta. O nome do substituto deverá ser divulgado até sexta-feira (1º), na publicação do Diário Oficial.
De acordo com a Associação de Peritos Criminais do Estado de São Paulo (Apecesp), a letargia na entrega dos laudos se deve ao fato de o número de funcionários não ser suficiente para atender a essa demanda, principalmente nos últimos anos, quando houve aumento nos índices criminais. Segundo a Apecesp, 1.200 peritos compõem atualmente o quadro de funcionários em São Paulo, mas para que os trabalhos tivessem celeridade seriam necessários mais 1.800 empregados, pela estimativa da entidade.
Mais casos
A instauração de inquéritos no DHPP vem aumentando consideravelmente nos últimos três anos. Em 2010, foram mais de 1.700. No ano seguinte, quando o departamento passou a apurar casos de resistência à prisão seguida de morte, no qual policiais militares passaram a ser investigados, foram abertos quase 2.900 boletins de ocorrência.
Em 2012, mais de 5.900 registros foram feitos. Neste ano, algo em torno de 400 já haviam sido instaurados em janeiro. Não há informação de quantos desses casos foram esclarecidos, mas policiais ouvidos pela reportagem, sob a condição de anonimato, disseram que muitas investigações estão paradas por conta da demora e da falta de laudos.
Casos de demora
Laudos que faltam para o DHPP (números aproximados)
IC 300
IML 400
Total 700
Um dos casos mais emblemáticos de lentidão da perícia é o do massacre do Carandiru. Mais de 20 anos depois, a Polícia Técnico-Científica sequer fez o laudo do confronto balístico para apontar de quais armas partiram os disparos dos policiais militares acusados de matar 111 presos. A um mês do julgamento de 28 réus, em abril, o Instituto de Criminalística (IC) ainda não respondeu à Justiça se há condições de se realizar o exame. Para a defesa dos acusados, sem o resultado pericial não haverá o júri.
“Ainda não veio resposta do IC sobre o confronto balístico. Dificilmente o júri será realizado sem essa prova técnica. Uma liminar do Tribunal de Justiça [TJ] informa que o julgamento não pode ser realizado sem a prova técnica. É preciso ter os laudos para individualizar as condutas dos acusados. Sem os exames, não dá para se falar se alguém matou alguém”, afirmou a advogada Ieda Ribeiro de Souza, que defende os réus.
Para o promotor do caso, Fernando Pereira da Silva, a falta da prova técnica não prejudicará a acusação. “Na época foi feita uma ponderação pelo instituto, de que demoraria 76 anos para se fazer laudo do Carandiru. Portanto, havia se dispensado a realização dele. Mas agora, a defesa dos réus fez um pedido em 2012 para ter posicionamento do IC, saber se é possível fazer o confronto balístico. Mas até agora não tivemos resposta. O laudo não é um elemento essencial, mas um elemento para se somar ao conjunto de provas”, disse.
O DHPP aguarda exames complementares do IC para saber se é possível apontar um suspeito pela morte da dona de casa Geralda Guabiraba, de 54 anos, encontrada com o rosto desfigurado, em 14 de janeiro de 2012, em Mairiporã, na Grande São Paulo, e concluir o inquérito sobre o caso. O IML indicou que ela morreu após ter o pescoço cortado. O caso corre sob sigilo decretado pela Justiça.
Laudos
O artigo 160 do Decreto Lei nº 3.689 de 03 de Outubro de 1941 do Código de Processo Penal (CPP), que teve sua redação revisada pela Lei 8.862, em 28 de março de 1994, informa que “os peritos elaborarão o laudo pericial, onde descreverão minuciosamente o que examinarem, e responderão aos quesitos formulados”. Em seu parágrafo único, diz que “o laudo pericial será elaborado no prazo máximo de 10 dias, podendo este prazo ser prorrogado, em casos excepcionais, a requerimento dos peritos.
Os laudos do IML, por exemplo, são obrigatórios sempre que as pessoas morrem fora de um hospital. Entre outras finalidades, o documento pode ser exigido para que familiares recebam seguros de vida. Laudos podem atestar que a pessoa não se matou - em casos de suicídio, as seguradoras não costumam pagar.
Segundo Maria do Rosário Mathias Serafim, presidente da Associação Apecesp, a demora na perícia de São Paulo não é novidade. “Isso é recorrente. E se deve à falta de peritos. Recentemente foi aberto um concurso público para admitir 100 novos peritos, mas isso é insuficiente. A cada ano a situação piora. Agora, com essa onda de violência, o perito tem de atender local de crime, depois fazer o laudo. Pela lei, são 10 dias de prazo, mas isso nunca será cumprido. Entre aspas, foi estipulado que o prazo tem de ser de 30 dias”, disse ela.
Peritos do IC disseram ao G1 que são orientados a dar prioridade a laudos do DHPP e das corregedorias da Polícia Civil e Polícia Militar.
Gargalo
Para a diretora do Instituto Sou da Paz, Luciana Guimarães, o problema na conclusão dos laudos causa um gargalo no trabalho da investigação policial. “Se um crime não é investigado, cria-se uma sensação de impunidade que favorece a prática de outros crimes. O laudo é fundamental, principalmente, nos casos de homicídios. Mas não podemos colocar todo o problema desse gargalo na Polícia Técnico-Científica. Há outros crimes que não dependem tanto de laudos e não são investigados pela Polícia Civil. Por exemplo, das 150 mil ocorrências de roubo na cidade de São Paulo em 2012, só 2% delas foram investigadas. Agora pergunto: por quê?”.
O secretário da Segurança Pública Fernando Grella assumiu a pasta em outubro de 2012. O ano passado registrou taxa de homicídios superior a 11 casos por 100 mil habitantes. A meta do governo é inferior a 10. Nos 12 meses do ano passado, havia em média 14,2 mortes ao dia no estado. No mês passado, a média foi de 13,4. A Grande São Paulo foi à região que teve o maior aumento de casos de homicídios em janeiro (24,2%). Na capital, o índice foi muito parecido com o do Estado (16,6%).
Naquele ano, mais de cem policiais militares foram mortos como uma possível reação do crime organizado. Para a advogada Marta Saad, professora de processo penal na USP e ex-presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCcrim), é preciso rever a lei que tratou do prazo de entrega dos laudos para a realidade vigente.
“Prazos do Código geralmente são defasados. Nossa legislação, quando foi feita, tinha uma criminalidade muito menor. Pensar num Código da década de 40, e pensar no quanto que a sociedade mudou, quantos crimes são hoje praticados, os prazos realmente são inexequíveis. O que não significa que com uma polícia mais prestigiada, equipada, com mais gente, mais valorizada, o trabalho fosse menos eficaz”, disse a advogada Marta Saad.

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