MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Salvador: sem confiança nas regras, não há jogo


Bernardo Chezzi* A TARDE

Não é fato novo que há uma crise da institucionalidade do município do Salvador nas políticas públicas de desenvolvimento urbano, tendo por consequência a judicialização de importantes temas de planejamento urbano e das regras que regem o mercado imobiliário.
O deslocamento destes temas para o Poder Judiciário foi algo assistido no tema das barracas de praia, dos licenciamentos na Paralela, do gabarito da orla, dos hotéis de turismo e não menos diferente com as ações para a Copa do Mundo de 2014, dentre muitos outros. O fenômeno de judicialização tentou ser explicado em diferentes línguas para investidores do mundo todo, que diante da insegurança jurídica migraram para Recife, Fortaleza, Aracaju e tantas outras cidades, como demonstram os índices de crescimento econômico do IBGE, nos últimos censos.
Este cenário guarda estreita relação com a ação nº 0303489-40.2012.8.05.0000, que está para ser julgada pelo Tribunal de Justiça da Bahia, na qual o Ministério Público questiona a constitucionalidade de 54 dos 165 artigos e anexos da última Lei de Ordenamento e Uso do Solo do Município do Salvador (Lei 8.167/2012, chamada Louos). Essa lei é a que disciplina o ordenamento territorial, o planejamento, controle, parcelamento e a ocupação do solo urbano, estabelecendo a maioria dos parâmetros para funcionamento de empresas em geral e para projetos na construção civil, instruindo, desta forma, toda a atividade econômica do município.
Em 26 de junho deste ano, o TJ decidiu suspender a aplicação de todos os 54 artigos e dos anexos da lei até que fosse a matéria julgada definitivamente. As consequências foram críticas. Conforme amplamente divulgado pela imprensa, diversos alvarás de construção foram revogados, cerca de 12 mil termos de viabilidade de localização foram suspensos, travando a economia da cidade; da abertura da farmácia e reforma da padaria à entrega das chaves do apartamento, tudo passou por um remanejamento de interpretação pelo município, o qual se viu obrigado a buscar na antiga lei de 1984 os parâmetros urbanísticos da cidade - editada, destaque-se, há quase trinta anos (Lei 3.377/1984, antiga Louos).
Os prejuízos da revogação de grande parte da Lei 8.167/2012 não foram só econômicos. Dentre os artigos revogados, estão aqueles que garantiam melhor condição de vida aos moradores de edificações na cidade. O que a população não sabe é que perdeu maior área de lazer coberta e descoberta, vagas de garagem quantitativa e qualitativamente melhores, novas regras de acessibilidade e sustentabilidade com garantia de acessos dignos aos portadores de limitações na mobilidade, índices atualizados de permeabilidade do solo, importantes mecanismos de controle de impacto de grandes empreendimentos (Estudo de Impacto de Vizinhança - EIV) e todos os demais parâmetros e diretrizes urbanísticas que tiravam a cidade de uma norma de 28 anos atrás, uma época sem Constituição Federal, sem Estatuto da Cidade e com uma realidade bem distinta da atual Salvador.
Não me cabe avaliar o mérito da ação, cujos argumentos são pertinentes ao processo de mais de mil folhas. Mas são elas que estão dispondo sobre a vida de uma população de quase três milhões de habitantes. Por isso, enquanto cidadão, me preocupo com o que estamos fazendo com a nossa cidade.
Não há crescimento sustentável sem a segurança para pensar em longo prazo. A crise da institucionalidade do município demanda um pensamento conjunto sobre que cidade queremos e precisamos. Certamente, não é uma Salvador onde a fé nas instituições é cada vez menor, em que há constante possibilidade de revisão e descumprimento dos acordos e das suas próprias leis, com medidas polêmicas que vão ceifando a iniciativa privada e deixando a cidade à margem. É absolutamente necessário que a instituição do município de Salvador seja restaurada; sem respeito às regras do jogo saímos todos perdedores. Está lá, na constituição da vida: não há futuro que não se possa reescrever.

*consultor jurídico da Ademi-BA

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