Felipe Frazão
Estadão
Eleito senador pelo Rio Grande do Sul, o vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos) afirmou que vai atuar para que o impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) seja discutido na próxima legislatura. “Se há indício forte de crime de responsabilidade, que se abra o processo”, afirmou Mourão, em entrevista ao Estadão. No diagnóstico do vice, o ministro Alexandre de Moraes, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ultrapassou os limites de sua autoridade e está prevaricando ao atuar como “investigador, denunciador, e parte ofendida”.
“Eu acho que ele ultrapassou o limite do poder dele. A Corte poderia dizer ‘Alexandre, pode baixar tua bolinha aqui. Está errado isso que você está fazendo. Não vamos aprovar essas tuas medidas”, disse.
Mourão não descartou a possibilidade de disputar a presidência do Senado, se tiver apoio, embora considere cedo para pleitear a vaga. Do gabinete anexo ao Palácio do Planalto, espaço que deixará dentro de 72 dias, o general de Exército da reserva afirmou que o Alto Comando “não cria ruído” político e que as Forças Armadas já teriam se pronunciado caso houvesse alguma irregularidade no primeiro turno das eleições.
A campanha do presidente
reclama que o ministro Alexandre de Moraes está interferindo demais
contra ele, no combate às fake news, que tomaram conta na eleição. Como
avalia a reação das instituições à desinformação?
Na minha visão, o Alexandre de Moraes vem prevaricando ou
até, vamos dizer assim, ele está ultrapassando o limite daquilo que é a
autoridade dele. Porque no momento que ele conduz o inquérito onde ele é
investigador, ele é denunciador, ele é julgador e também é parte
ofendida, isso está errado. O devido processo legal não está sendo
respeitado aqui no nosso País. Essa é a realidade das ações do Alexandre
Moraes. No momento em que ele pega uma reportagem de um meio de
comunicação que, há dois anos, ele disse que só falava fake news e usa
aquela reportagem para fazer busca e apreensão na casa das pessoas
–busca e apreensão é a decisão mais grave que você pode ter em relação a
uma pessoa – e bloqueia as contas das pessoas, ele ultrapassou o limite
do poder dele, e competiria ao restante da Corte dar um freio nele, mas
a Corte não está fazendo isso.
Então caberá ao Senado dar esse freio?
O Senado vai ter que fazer isso agora. Já que a Corte… A
Corte poderia dizer, ‘Alexandre, pode baixar tua bolinha aqui, está
errado isso que você está fazendo, nós não vamos aprovar essa tuas
medidas’.
A partir do ano que vem defenderá que impeachment de ministros do Supremo seja pelo menos pautado e discutido no Senado?
É aquela história, não é questão de impeachment, se está
comprovado, há indício forte de crime de responsabilidade, que se abra o
processo. Se o processo vingar, ok, se não vingar ok, também.
Hoje os pedidos de impeachment ficam na gaveta. O senhor vai pressionar para que sejam pautados?
Eu vou. Se está comprovado, chegamos à conclusão de que há
indício forte de crime de responsabilidade, como no caso desse ministro
você citou o nome, então vamos discutir o assunto.
O senhor se refere somente à
atuação do ministro Alexandre de Moraes no Supremo ou no TSE também?
Eles endureceram o combate à desinformação com uma nova resolução.
Uma resolução é algo igual ao decreto presidencial, pode
ser cassada pelo Senado. O Senado pode cassar essa resolução também. Não
é lei, não é nada.
O senhor chegou a externar
uma proposta de mudanças no Supremo, depois disse que foi mal
compreendida. Qual é exatamente sua proposta?
Um sistema jurídico correto tem várias nuances que têm que
ser obedecidas. Uma delas são os magistrados atuarem de boa fé. E a lei
ser fácil, compreensiva e valendo para todos. São coisas aqui no Brasil
que na minha visão não estão ocorrendo. O que eu penso em relação a
nossa Suprema Corte: tem que ser colocado um mandato, porque a pessoa
ficar 25, 30 anos ou até mais dependendo da idade que ele é nomeado no
STF, é muito tempo. Isso tem que ser discutido dentro do Congresso e se
chegar uma conclusão. O nosso sistema de freios e contrapesos, que é o
que faz a harmonia e o equilíbrio dos poderes, não está funcionando.
Então sua proposta se restringe ao tempo mandato e não teria aumento de ministros?
Ampliar ou diminuir a numero de ministros é casuísmo.
O senhor viu o chavismo fazer isso na Venezuela?
Vi, claro. Aqui não vai ser feito, não vejo isso sendo feito. Mesmo porque implica em custos.
Mesmo o presidente tendo externado ser favorável?
O presidente deu uma externada ali, mas nunca tomou nenhuma atitude.
A reeleição não daria a ele a força política necessária?
Julgo que não. Sendo reeleito ele tem logo dois cargos
dentro do STF para serem trocados, o que pode lhe dar uma maioria bem
mais confortável lá dentro.
Criminalizar pesquisas, com pena de prisão, é o caminho?
Não precisa. Se alguém faz pesquisa com viés para
favorecer A ou B, isso tem que ser investigado e se ficar comprovado, já
é um crime, já existe lei para isso. Os institutos têm que recalibrar a
sua metodologia e serem mais transparentes nessa metodologia, porque
não é entrevistando 1.500, 2.000 pessoas que você, por meio de uma
extrapolação de tendência, vai dizer que 160 milhões de pessoas vão
votar dessa maneira. Acho que isso é complicado. Pode dizer também que
15 dias antes da eleição não se publica pesquisa nenhuma, de modo que
não haja um direcionamento para o pensamento do eleitor, já que a
maioria dos eleitores só se define no final. Um momento aí de ‘Agora, é
cada um por si aqui, tá?’.
O Ministério da Defesa
decidiu não divulgar o conteúdo da fiscalização das eleições. Não é um
contrassenso, cobrar transparência, mas ocultar o conteúdo?
O Ministério da Defesa disse que vai apresentar o seu
relatório após o final do segundo turno. Não adianta apresentar um
relatório parcial. Quando o ministro Barroso criou aquela comissão de
transparência, ele chamou as Forças Armadas para esse jogo. Quando você
chama as Forças Armadas para um jogo, elas vão fazer o trabalho, não vão
ficar enrolando. É o que tá sendo feito. Acho que se tivesse algum
problema sério no primeiro turno teria havido, vamos dizer assim,… “Ó,
deu problema’. Que saiba, não teve nada.
O senhor conseguiu consultar o trabalho de fiscalização das Forças Armadas?
Não tive acesso.
O presidente não falou até
agora sobre a suposta fraude que alegava haver se não vencesse no
primeiro turno. Diz que vai aguardar parecer final do ministro da
Defesa. Se ele questionar uma derrota eleitoral, como o senhor se
posiciona?
Esse é um cenário hipotético. Isso vem sendo muito mais
colocado pelas palavras do próprio presidente, mas não pelos atos dele,
porque se ele tivesse dúvidas sobre o processo ele não concorria, não é?
Declarava a nulidade a priori e criava um caso aí, vamos dizer. Mas ele
não fez isso. Ele está concorrendo dentro das regras do jogo normais. O
resto é da especulação.
O Alto Comando do Exército e
os comandantes da Força Aérea e da Marinha mantiveram certo
distanciamento, não se envolveram diretamente num trabalho
institucional.
É um trabalho do Ministério da Defesa, que usou seu
pessoal da área técnica, o Centro de Defesa Cibernética, que tem
conhecimento do assunto.
Foi uma decisão correta não envolver os generais da ativa do Exército?
O Exército raciocina sempre dentro de um tripé. Em
primeiro lugar, agir dentro da legalidade, usando a legitimidade e
mantendo a estabilidade. Não tem ruído. Essa turma não faz ruído. O
ruído é feito pelo lado de fora, não pelo lado de dentro.
A participação maior dos
militares na vida política do País, seja com assentos no Congresso ou em
evidência no governo, é algo sem volta ou tem a ver apenas com governo
Bolsonaro?
Existe certo preconceito por parcela da sociedade em
relação às Forças Armadas e o papel delas, que a maioria desconhece.
Sempre houve uma participação de militares na vida política do País.
Desde o império, grandes vultos do exército como Caxias e Osório foram
senadores. No início da República, os primeiros presidentes eram
militares, depois tivemos o Dutra militar, tivemos senadores e deputados
que eram oriundos no meio militar, até o movimento 1964.
Paradoxalmente, os militares se retiraram da política. Havia o
presidente militar, mas se olhar quem eram os políticos, oriundos do
meio era o Andreazza, o Passarinho, mas eram relativamente poucos em
relação ao conjunto da Força. Termina o período do governo militar, e,
naturalmente, nós não participamos mais de processo eleitoral, exceção
do Bolsonaro. Ele foi o único cara eleito nesse período. Há uma reação
na sociedade brasileira, que é eminentemente conservadora na sua
maioria, e abre-se uma janela de oportunidade para que integrantes do
grupo militar concorram a cargo eletivo. Isso volta a ocorrer em 2018 e
ocorre agora em 2022. Mas nada que envolva Força Armada como elemento
dativo, como instituição do Estado e os indivíduos que a compõem. São
duas coisas distintas.
O senhor enxerga um reposicionamento político à direita, após a vitória eleitoral inegável no Congresso, de olho em 2026?
Isso é prematuro. Existe uma maioria conservadora que
ficou silenciosa por muito tempo. Essa maioria renasce com os movimentos
a partir de 2013, impeachment da Dilma e a eleição do Bolsonaro. Isso
se traduziu agora na eleição para a Câmara e Senado. Assim como para as
assembleias legislativas de muitos Estados. É um processo que dá um
equilíbrio maior dentro da representação política. Na realidade, tem
gente que é mais da direita, tem gente de centro-direita e gente que é
de centro-esquerda. E esse grupo todo você pode colocar num viés
conservador.
Lula disse que é impossível o presidente virar, tirar a diferença de votos.
O presidente está numa ascendente. Acho que o Lula e o Bolsonaro estão correndo pau a pau. Vai ser decidido no dia da eleição.
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