Ao censurar documentário que não viu, TSE emula '1984'. Lygia Maria para a FSP:
"Não
se pode permitir a volta da censura, sob qualquer argumento, no
Brasil." Bela fala da ministra Cármen Lúcia em julgamento do TSE sobre a
proibição da exibição, até 31 de outubro, do documentário "Quem mandou
matar Jair Bolsonaro?".
O
problema é que, em seguida, a ministra aprovou a proibição. Portanto,
permitiu a censura. Se você, caro leitor, achou estranho, calma, porque
piora: os ministros não viram o filme. Ninguém viu, nem a campanha de
Lula, que entrou com a ação no TSE.
Trata-se de um disparate jurídico que afronta o direito à liberdade de expressão da pior forma: proibindo a manifestação de pensamento antes de ser manifestado. Juízes, agora, viraram telepatas.
O
mesmo tipo de interferência acintosa se verifica em outro caso que
julgou um vídeo, postado no Twitter, que mostra notícias sobre corrupção
em governos do PT e associa o candidato do partido à improbidade
administrativa.
Todos
os ministros concordaram que os fatos relatados nas notícias são
verdadeiros, o problema é outro. "O cidadão comum não está preparado
para receber esse tipo de desordem informacional", disse o ministro
Ricardo Lewandowski em seu voto. Resultado: vídeo banido.
Ou seja, pro TSE, cidadãos não sabem interpretar imagens e textos: não sabemos pensar direito, melhor deixar que magistrados pensem por nós.
Impossível não lembrar do famoso romance "1984", de George Orwell,
que descreve uma ditadura totalitária que controla não só atos e falas,
como pensamentos. A "Polícia do Pensamento" ("thinkpol") vigia e pune
aqueles que desenvolvem ideias e sentimentos contrários ao regime.
O
mesmo Orwell diz que "a imaginação, como alguns animais selvagens, não
se reproduz em cativeiro". Por isso regimes democráticos apoiam a livre
circulação de ideias. Porque é pelo encontro de diferentes visões de
mundo que surgem ideias inovadoras, que nos aproximamos da verdade. O
TSE quer defender a democracia, mas, de modo contraditório, age como
carcereiro do pensamento.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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