Meu Imbecil Pessoal pareceu pensar bastante, e durante um momento fiquei com medo que ele percebesse também que tinha dito uma bobagem, e ficasse menos burro, e eu tivesse que despedi-lo na hora. A crônica de Alexandre Soares Silva para a Crusoé:
Um amigo contratou um Imbecil Pessoal. Perguntei o que era isso, e ele me explicou assim:
“É
uma ideia que tive faz tempo, mas só recentemente consegui colocar em
prática. É ótimo, e aconselho todo mundo a conseguir um.
O
princípio é este: quando você ouve as suas opiniões repetidas por um
cretino, do jeito tosco dele, você muda de opinião na hora, ou pelo
menos a atenua para que ela não seja tão cretina. E quando você age mal,
mas não percebe na hora que agiu mal, o apoio de um cretino faz com que
você perceba isso com clareza. Assim, andar o tempo todo na companhia
de um imbecil é muito mais instrutivo que andar na companhia de um
sábio.
Sempre
tive um conhecido um pouco burro que, sem querer, fazia isso comigo.
Ele me apoia sempre, só que de um jeito cretino, e isso me faz muito bem
porque acabo percebendo minhas próprias cretinices e me emendando.
Então, na semana passada, tomei uma decisão e fiz uma oferta para o meu
conhecido um pouco burro: ele vai receber um salário para andar comigo o
tempo todo. É o meu Imbecil Pessoal.
Claro
que não falei pra ele que o nome da sua nova profissão é Imbecil
Pessoal (isso estou falando só pra você). Para ele, disse que precisava
de uma companhia para estimular o meu intelecto. Ele ficou orgulhoso e
aceitou o emprego. Até agora esse esquema está funcionando muito bem, e
dou a ideia para você caso você queira copiar.
Por
exemplo: numa discussão que tive outro dia em uma festa, perdi o
controle e fui mal-educado com alguém. Alguns minutos depois o meu
Imbecil Pessoal se aproximou de mim pedindo um high-five, TOCA AQUI!, e
disse algo do tipo:
— É isso mesmo, fez muito bem! Tem que falar na cara. Polidez é coisa de viado ou de “intelequitual”.
(Como todos os imbecis, ele gosta de falar “intelectual” desse jeito, alongando a letra A e fazendo uma careta de desprezo.)
Ao ouvir isso, o que eu poderia fazer? Obviamente refleti, corei, e pedi desculpas para a pessoa que havia ofendido.”
Essa foi a explicação do meu amigo.
Achei
uma grande ideia, e também contratei um Imbecil Pessoal.. Andar com um
Imbecil Pessoal do meu lado tem sido um belo método de correção moral
para mim. Deixei de acreditar em muitas coisas que acreditava; e nunca
fui tão sensato, tão ponderado.
Claro
que até do excesso de ponderação ele me protege. Porque outro dia
deixei escapar um desses “nem tanto à esquerda nem tanto à direita” que
as pessoas que não pensam muito usam quando querem afetar moderação, e o
meu Imbecil Pessoal logo disse: “Claro! A verdade NUNCA está em nenhum
dos extremos!”.
Ao
ouvir isso, percebi a tolice do que tinha dito, e perguntei: “Nunca?
Entre duas pessoas com posições em extremos opostos, digamos Fulano que
quer porque quer bater numa velhinha que está andando na rua, e Sicrano
que é veementemente contra bater na velhinha, os dois estão igualmente
errados?”.
Meu
Imbecil Pessoal pareceu pensar bastante, e durante um momento fiquei
com medo que ele percebesse também que tinha dito uma bobagem, e ficasse
menos burro, e eu tivesse que despedi-lo na hora. Mas para o meu alívio
ele só repetiu que todos os extremos estão SEMPRE errados.
De modo que estou muito contente com o meu Imbecil Pessoal.
Enfim:
coitado de Alexandre, o Grande, que andava na companhia de Aristóteles!
Teria sido muito mais inteligente andar sempre na companhia do mais
cretino dos seus soldados.
***
Talvez
vocês tenham visto que, segundo o relatório de fevereiro de 2021 do
departamento oficial do governo americano para a reconstrução do
Afeganistão (o famigerado SIGUR), os Estados Unidos gastaram quase um
bilhão de dólares tentando ensinar teoria de gênero aos afegãos.
Isso me fez imaginar como deve ter sido uma aula dessas.
Uma
sala cheia de pastores afegãos. Uma professora americana vai na frente
da sala e fala durante quarenta minutos, com um intérprete do lado
traduzindo tudo, sobre o fato de que o gênero é uma construção social,
que algumas mulheres têm pênis, que alguns homens têm vagina, que você
deve chamar mulheres grávidas de “pessoas com útero“, que existem “cis” e
“gender fluid” e “LGBTQIAP+“, e o que cada letrinha significa etc. etc.
No
final dos quarenta minutos, um pastor afegão no fundo da sala parece um
pouco confuso. Depois de algum tempo ganha coragem, levanta o braço e
pergunta:
— Só pra ter certeza se eu entendi… É pra eu estuprar quem?
O
intérprete traduz a pergunta. A professora americana pensa um pouco e
logo começa a dar uma aula sobre “Me Too”, assédio no ambiente de
trabalho corporativo, Harvey Weinstein, Woody Allen, o cara da Pixar que
pôs a mão no joelho da filha do Quincy Jones etc.
Depois
dos aplausos, quando todo mundo está indo embora e a professora
americana já foi evacuada de helicóptero, um pastor se vira para outro e
diz baixinho:
— Achei bacana, mas… Você entendeu quem é que é pra gente estuprar?
Não é possível que a realidade tenha sido muito diferente disso.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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