Nem 'aliados' de Bolsonaro conseguem apaziguá-lo ou contê-lo, num quadro perigoso. William Waack em "Restou a confusão", coluna do Estadão:
Estão diminuindo depressa as opções políticas para Jair Bolsonaro.
No momento ele aposta na mais perigosa delas: pôr gente nas ruas.
Consciente dos riscos, e agindo como chantagista, mandou mais de um
emissário dizer a várias instâncias em Brasília que não sabe se terá
controle do que possa acontecer a 7 de setembro quando – dependendo da
fonte bolsonarista – fala-se de protesto ou até insurreição.
O
problema para Bolsonaro é que ele está sendo levado pouco a sério, pois
confundiu blefe com bravata. Revelou-se intutelável, missão na qual
fracassaram representantes do PIB (via Paulo Guedes),
dos militares (via generais de pijama) e de partidos do Centrão (via
caciques fisiológicos). O resultado disso é o fato de operadores
políticos “aliados”, como Arthur Lira e Ciro Nogueira, e chefes de poderes, como Rodrigo Pacheco e Luiz Fux, terem transitado daquilo que em política externa se chama de “appeasement” para “containment”.
“Appeasement”
nestas latitudes acaba sendo traduzido como “bater palmas para louco
dançar”, que é basicamente o que aconteceu, bastando ver o sorriso
amarelo de Arthur Lira quando questionado se Bolsonaro tem palavra. Já o
modo “contenção” (cerco, isolamento) tem tido pouco êxito na crise
institucional por conta de um cenário abrangente bem mais grave que os
desequilíbrios do presidente. É o fato de o governo não ter um rumo, um
sentido, uma estratégia, ou um estágio ao qual se pretenda levar o País –
além da ambição de Bolsonaro de permanecer no poder e se reeleger.
São
vítimas dessa falta de sentido político amplo e capacidade de
coordenação as grandes reformas estruturantes, como administrativa,
tributária e eleitoral – para não falar no desgoverno irresponsável e
criminoso em questões específicas, como ficou claro na CPI da pandemia.
É essa geleia geral o grande impedimento bloqueando operadores
políticos de notória habilidade e capacidade de negociação, e
especialistas em sobrevivência, como os caciques do Centrão (que,
diga-se de passagem, por razão existencial defendem interesses setoriais
antes dos nacionais).
Assim,
fica difícil “trabalhar” isolando Bolsonaro e focando na relevância das
várias pautas legislativas – como demonstra pretender o presidente do
Senado, por exemplo – se ninguém sabe exatamente em qual direção e com
qual objetivo. O descaminho da reforma tributária que o diga. Na
essência, os atributos clássicos de poder do Executivo não são os da
caneta presidencial, mas, sim, os de ditar o sentido da agenda política.
Bolsonaro
é um personagem transparente que não esconde o que vai pela sua cabeça,
não importa se habitada por delírios, fantasmas, teorias abjetas,
explicações absurdas e imbecilidades – é o que compõe a visão de mundo
dele e, consequentemente, o que julga perceber como realidade da
política e baliza de suas ações e comportamento. Para ele, o “golpe” já
aconteceu e foi dado pela usurpação de poderes por parte do STF
(instância cavernosa habitada por esquerdistas, pedófilos, cúmplices de
traficantes, corruptos, ateus e oportunistas).
Cabe,
então, o “contragolpe”, para o qual Bolsonaro se julga legitimado pelo
“apoio do povo”, e suficientemente escorado pela norma legal (a espúria
interpretação do artigo 142 da Constituição) e pelos instrumentos
clássicos de poder e manutenção da ordem (Forças Armadas). Visto pela
ótica de Bolsonaro, é tudo defensivo e garantista: da liberdade e da
lei. Mas como aplicar o contragolpe?
Seria
demais exigir de uma figura como Bolsonaro que tivesse um plano claro.
Ele age por impulso, por arroubo, de supetão, embora tenha um
considerável instinto tático. Ao mesmo tempo é hesitante e confuso. Até
aqui não conseguiu enfrentar nem superar os limites impostos pelo
Judiciário e pelo Legislativo, e percebe seu potencial eleitoral
derretendo a um ponto que talvez já seja irreversível. É o que resta de
opção: a confusão.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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