É a própria “zona artística” a que se refere Fernanda Montenegro que
promove a censura dos colegas desalinhados com o esquerdismo hegemônico.
Percival Puggina:
Não sei se você sabe, mas a única censura imperdoável é a que possa
ser atribuída à direita, ainda que seja difícil, na atualidade
brasileira, encontrar fatos que corroborem acusações sopradas aos
ventos. A causa não importa, o que importa é o efeito. O secretário da
Cultura, Mario Frias, está sendo levado à fogueira por pretender que as
entidades públicas que operam abaixo dele no organograma do setor lhe
submetam previamente suas publicações. Mas não. Estes só querem o nosso
dinheiro para fazerem o que bem entendam.
Ontem aplaudi o amigo e brilhante jornalista Alexandre Garcia quando
este mencionou uma censura muito mais eficiente e odiosa, referindo-se
àquela que fecha as portas para quem deixa transparecer posição “de
direita”, ou, caso mais grave, aparece em fotografia com o presidente da
República. Neste caso, é a própria “zona artística” a que se refere
Fernanda Montenegro que promove a censura dos colegas desalinhados com o
esquerdismo hegemônico. A longa e dinâmica trajetória do Alexandre o
autoriza a mencionar a censura na imprensa, também ela no circuito das
redações, cuidando de apartar os dissidentes do pensamento dominante. E
poderíamos ir para o ambiente acadêmico, na área de Ciências Humanas,
onde vigem, com rigor de tribunais de exceção, os mecanismos de tranca e
ferrolho contra a infiltração de qualquer divergência.
Estas censuras, cotidianas, disseminadas em ambientes públicos e
privados, têm existência tão real que negá-las é confirmá-las, pois a
recusa a uma evidência é já censura imposta ao fato. No entanto, essa
censura é praticada por militantes convictos de promoverem uma censura
do bem, beatificada pela santidade da causa. Foi por ela e para ela que
aparelharam tudo.
Exatamente por isso, tem mais. Nos últimos dias foi desencadeada em
Cuba uma onda repressiva de intensidade incomum até para Ilha.
Preparava-se a divulgação da Revolución de los Girassoles com uma
passeata ocorrida dia 08/09, pedindo – ora vejam só! – liberdade de
opinião e expressão, a extinção da ditadura e, subsidiariamente, a
liberação dos mantimentos coletados nos EUA por cubanos lá residentes.
Enviados para entrega a entidades religiosas fazerem a distribuição,
empacaram na aduana de Mariel porque o governo quer controlar sua
distribuição através do aparelho estatal.
Cuba passa fome. A covid-19 derrubou o turismo e afundou o PIB, por
isso, a ajuda humanitária, por isso o silêncio sobre ela e sobre o que
está acontecendo lá com número crescente de prisões. No sentido oposto,
foi libertado, na última sexta-feira, o dissidente Roberto de Jesús
Quiñones depois de cumprir um ano inteiro como preso de consciência. Vi a
foto dele em Cubanet. Pele sobre ossos, parecia egresso de um campo de
concentração nazista. Um ano preso por divergência e a censura do bem
age como se Cuba não existisse para que os fatos de lá não precisem ser
revelados.
À saída da prisão, Roberto de Jesús foi saudado por um amigo que lhe
disse: “Bem vindo à prisão exterior”. Também isso não se repete, porque
aqui, como lá, há fatos que não se contam, livros que não se lê,
verdades que não se dizem, fatos que se manietam em versões.
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