Candidatos à Casa Branca: idade é avançada - e a ambição também. Coluna de Vilma Gryzinski, publicada na edição impressa de Veja:
Muitos americanos gostariam de ter um presidente normal. Alguém que
não passasse as manhãs postando coisas que serão desmentidas em poucos
segundos, não deixasse o país com o coração na boca só de pensar em
acordar e imaginar “o que ele fez agora”, não começasse o ano
pulverizando um general iraniano e enfrentando um julgamento no Senado.
Mais americanos ainda gostariam de ter um presidente jovem, idealmente
na faixa dos 40. Muito provavelmente não terão nem uma coisa nem outra.
Quando forem às urnas no dia 3 de novembro, o candidato republicano,
Donald Trump, terá 74 anos. Dos democratas mais cotados, Bernie Sanders,
que disparou nas preferências na fase das primárias, empatará em idade
com Roberto Carlos: 79 anos. Joe Biden, o candidato que mais dá sinais
da marcha inexorável do tempo, com disparates e falhas de memória,
estará com 77. Elizabeth Warren, apesar de ter a melhor forma da turma,
além de saltitar o tempo todo para passar uma imagem de energia juvenil,
inaugurará a década dos 70.
A excepcional concentração de septuagenários abre uma pergunta a que
ninguém pode responder em todos os seus aspectos, mas todo mundo tem um
palpite a dar: quanto pesa a idade de um governante? “Não sou jovem o
bastante para saber tudo”, ironizaria Oscar Wilde, o rei das frases
provocantes. A combinação ideal seria uma pessoa suficientemente madura
para entender que a juventude é um defeito que passa com o tempo, mas
com estoques de energia para enfrentar os pepinos intermináveis. A
ciência vive indubitavelmente de cérebros jovens. Albert Einstein tinha
26 anos quando publicou a Teoria da Relatividade Restrita, em 1905, um
garoto, comparado ao gênio que superou, Isaac Newton, que escreveu
Princípios Matemáticos da Filosofia Natural aos 44. A história política é
mais diversa. Alexandre, o Grande, já tinha conquistado o império que
ia até os limites do mundo conhecido aos 29 anos. Como seu professor
particular foi Aristóteles, transformou seu insignificante reino da
Macedônia no maior disseminador da cultura helênica e dizia coisas como
“Vence o medo e vencerás a morte”, ficou difícil superá-lo nos últimos
2 300 anos. Alguns séculos antes, Licurgo havia criado em Esparta o
sistema de governo em que 28 gerontes, ou homens com mais de 60 anos,
legislavam em conjunto com os dois reis espartanos. Eventualmente, para
aumentar a confusão, o Oráculo de Delfos era consultado. As profecias
atuais são feitas pelas pesquisas de opinião. As pitonisas mostram que
Bernie Sanders passou à frente de Joe Biden nas primárias de Iowa e New
Hampshire. Ele se beneficia da imagem de candidato contra o sistema,
exatamente a mesma que elegeu Donald Trump, só que pela esquerda. Com
Trump sob impeachment, esquartejado diariamente no julgamento do Senado,
já é concebível que seja o primeiro presidente a perder uma reeleição
com a economia forte. E deixou de ser absurdo imaginar um stalinista de
79 anos, do tipo que leva uma estrela vermelha cravada no coração, na
Casa Branca.
Vai faltar pipoca para acompanhar a batalha dos septuagenários. Ou,
para os mais acostumados à linguagem crua dos filmes em que agentes
veteranos se reúnem para uma derradeira missão impossível, a guerra da
turma da próstata.
Publicado em VEJA de 5 de fevereiro de 2020, edição nº 2672
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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