Lula joga no futuro: quer sair da
prisão perto das eleições, na condição de vítima. Mas há vários futuros
possíveis: se for condenado em outros processos, e há vários, fica por
longo prazo em regime fechado, perdendo a liberdade parcial, e sem
disputar eleição alguma. Coluna de Carlos Brickmann, publicada nos jornais de quarta-feria e antecipada aqui:
Há quem diga que no Brasil nada muda, que tudo é sempre igual. Muda,
sim: o grito de guerra dos cumpanhêro, a partir do momento em que a Lava
Jato pediu que a pena de Lula progrida para o regime semiaberto, deixou
de ser Lula Livre. Agora, seguindo as ordens do ex-presidente, é Lula
Preso.
Lula disse que não aceita a progressão de pena. Garante que só sai
quando seu julgamento for anulado e ele puder deixar a prisão como
inocente que foi injustiçado. Que pode acontecer? Não se sabe
exatamente. O procurador Deltan Dallagnol acha que Lula, como qualquer
presidiário, tem de cumprir a pena como lhe for imposta. O presidente
Bolsonaro acha que, se Lula não quiser trocar a prisão por regime
semiaberto, tem o direito de ficar preso.
É briga boa: não há muitos casos semelhantes que orientem a solução
do atual. Não há, dizem juristas, nenhuma determinação específica na
lei. Logo, há campo para uma batalha de interpretações – uma coisa meio
maluca, bem Brasil, em que os adversários de Lula querem libertá-lo e
seus seguidores querem mantê-lo preso. Lula joga no futuro: quer sair da
prisão perto das eleições, na condição de vítima. Mas há vários futuros
possíveis: se for condenado em outros processos, e há vários, fica por
longo prazo em regime fechado, perdendo a liberdade parcial, e sem
disputar eleição alguma.
A Lava Jato vem sendo podada pelo Supremo, pelo Congresso e também
por Bolsonaro. Mas há muitos tiros disparados. Se um acertar, Lula não
sai.
O dia D
O Supremo deve concluir hoje a votação do caso dos depoimentos dos
réus em caso de delações premiadas. Já há maioria formada em favor de
dar aos réus delatados o direito de depor por último, como se os réus
delatores fossem assistentes da acusação. Mas que é que isso significa?
Não é bem assim
Há consenso no Supremo de que não há condições de anular todos os
julgamentos em que os réus delatados não foram os últimos a depor. Os
ministros falam em “modular” o alcance das decisões. Podem, por exemplo,
decidir que a decisão valha apenas em casos futuros. Ou que seja
aplicada nos casos em que a defesa recorreu. De qualquer forma, o
julgamento não envolve Lula: no caso em que foi condenado, o do
apartamento no Guarujá, nada existe que possa ser alterado por essa
decisão do Supremo.
Quem perde
Com uma decisão do Supremo exigindo que os réus delatados tenham o
direito de depor por último, quem perde é a Lava Jato. O procurador
Deltan Dallagnol acha que haverá um grande retrocesso no combate à
corrupção. Há quem diga que as alegações finais dos réus não trazem, a
rigor, nada de novo ao caso.
Mas, se não houvesse prejuízo para a acusação, Dallagnol não estaria
tão bravo, nem seus adversários tão exultantes. Junte-se a isso o livro e
as entrevistas do ex-procurador-geral Rodrigo Janot, que uniram alas
que sempre criticaram os métodos da Lava Jato mas não se entendiam, e
surge um quadro de enfraquecimento da operação. Mesmo os ministros do
STF mais favoráveis à Lava Jato se solidarizaram com as medidas para
enquadrar Janot. Nenhum deles quer tiroteio dentro de seu local de
trabalho.
Por que?
Esqueça a história de que o ex-procurador Rodrigo Janot contou a
história de que quis matar Gilmar Mendes porque queria vender livros.
Primeiro, é difícil ganhar dinheiro com livros. Tirando o pessoal da
autoajuda, Fernando Morais, Paulo Coelho, não se ganha dinheiro vendendo
livros. Segundo, o livro de Janot foi amplamente distribuído, de graça,
pela Internet. Também é bobagem imaginar que ele tenha levantado a
história para sofrer uma busca e apreensão, que entregaria à Federal
seus arquivos e conversas telefônicas, nos quais haveria coisas
comprometedoras contra adversários políticos. Se quisesse dar à Federal
as informações, bastaria copiar o que quisesse em pendrives aos quais,
para usar a frase habitual, “a Polícia teria acesso”.
Adivinhar os motivos de Janot é ainda muito difícil. Um palpite:
sentiu a falta dos holofotes e confessou algo que nem crime é, mas teria
repercussão. Mas saberia que iriam vasculhar sua vida para achar algo
comprometedor. Já sabemos até que ele sua equipe bebiam em serviço. Está
no livro.
Cervejinha
A reforma da Previdência passou em primeiro turno e o ministro Onyx
Lorenzoni acha que estará tudo concluído até o dia 10. Mas o senador
Major Olímpio, líder de Bolsonaro, adverte: se as demandas dos senadores
não forem atendidas, a reforma para. Não é coisa pequena: fala-se que
os pedidos custarão algo como R$ 3 bilhões. O Governo concordou em
atender os parlamentares, mas não liberou as verbas. E eles sabem que,
se a reforma for aprovada sem que as verbas tenham saído, vão todas para
a cesta seção.
É briga de profissionais: ninguém mais quer promessas, cada um está à
espera do naco de carne que foi combinado. Sem carne, não há reforma
que ande.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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