MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 1 de março de 2015

Heróis esquecidos



O TEN REGUEIRA
(Do livro “Crônicas de Guerra” do Ten Cel Uzêda -  Cmt 1º Btl do Regimento Sampaio)
O Ten Regueira é um pernambucano de Goiânia, destemido e valente, bravo como ele só! Baixo, moreno, barba cerrada, bigode aparado, sobrancelhas densas, cabelos e olhos pretos, nariz afilado, uma “barroca” no queixo, gentil e maneiroso, ninguém o dizia o soldado corajoso que era.
Ferido num dos bombardeios de artilharia em Braineta, estava baixado ao hospital. Por isso nosso Batalhão não contou com seu precioso auxílio no ataque a Monte Castelo no dia 21 de fevereiro.
Entretanto, num dos primeiros dias de março, o bravo tenente apresenta-se ao Posto de Comando do batalhão em Querciola, pronto para retornar à linha de frente.
A chegada do Regueira foi motivo de grande alegria para o nosso batalhão, já pela simpatia que irradiava o jovem tenente, já pela admiração que tínhamos pelos seus feitos, já por que sua presença, pela experiência e pelo seu destemor, era, realmente, um reforço para o batalhão.

E lá se vai o Regueira para a linha de frente. Desta vez mandamo-lo para a 3ª Cia.

Prosseguíamos mandando patrulhas às linhas inimiga, quer para sondar-lhes as intenções, quer para destruir-lhes as posições, afastando-os de nossas linhas.
Essas patrulhas obedeciam a uma escala, e de quando em vez lá ia o Regueira. As patrulhas sob seu comando, como as dos Ten Trota, Waldir e Oswaldo, eram cheias de alterações. Aguerridos, valentes e decididos, esses bravos tenentes infiltravam-se insidiosamente pelas linhas inimigas, levando-lhes destruição, provocando-lhes pânico, trazendo prisioneiros. Mas, também, de quando em vez, passávamos cada susto para recuperá-los!

Certo dia lá foi o Ten Regueira fazer um reconhecimento em Marne. Esse era um lugarejo com três casas apenas, mas todo grupo de casas na Itália tem um nome e os naturais chamam-no de “paese”. Marne era, pois, um “picolo paese” que defrontava nossas posições em Polla. O lugarejo ficava num espigão que corria quase paralelamente à nossa linha e que vinha se entroncar no Monte Belvedere.

Nesse espigão existiam umas “cercas vivas” e umas divisas de terra feitas com pedra seca que muito facilitavam o disfarce do inimigo. Para atingirem o espigão nossas patrulhas tinham que atravessar uma ravina que os italianos chamavam de “fosso”.

Parte o Regueira com elementos do seu aguerrido pelotão. Transpõe nossos campos minados em Polla, dispersa seus homens, dá-lhes missões. O “fosso” é enfiado por posições inimigas em C. Vigone e Fantetti. Ele o atravessa num só lanço e aproxima-se cautelosamente de Marne.

Quando a patrulha se aproxima de Marne, recebe tiros de Fiochi, C. Ghiri, e Bottara. Nossa artilharia e nossos morteiros anulam as resistências inimigas. Os esclarecedores do Regueira atingem o casario de Marne. Diversas organizações, mas tudo vazio. Dispondo de poucos recursos, o alemão usa de malícia. Varia de posição: hoje está aqui, amanhã acolá. O “escravo” italiano cava-lhes os abrigos.

Missão cumprida. Quando menos, a patrulha facultara-nos alvos para os bombardeios. Regueira faz o sinal para o regresso: a patrulha retrocede. Quando os primeiros elementos chegam em Polla, ouve-se o metralhar do inimigo: era uma “Lurdinha”, a célebre metralhadora inimiga, 1.100 tiros por minuto. Donde atirara?

Regueira apressa o regresso de sua patrulha, mas observa que lhe falta um homem. Quem seria? Ele os conhecia a todos, lembra-se dos que já se recolheram. Onde se acha o seu ordenança, aquele seu amigo que não o larga nunca? E o tenente recorda-se das rajadas inimigas. Seu ordenança ficara ferido. Iria busca-lo.

 À sua contextura moral não cabia outra solução. Ele não era apenas o bravo e afoito patrulheiro. O destemido tenente cumpria o seu dever com convicção plena. Um só homem do seu pelotão não ficava em mãos inimigas, tanto mais o seu ordenança!

E Regueira retrocede ansioso em busca do seu soldado. Divisa-o à margem do “fosso”. Convicto do seu dever, encantado com a sua nobre missão, preocupado com o destino do seu amigo, esquece-se do inimigo que lhe acompanha perfidamente os movimentos. Regueira alcança seu soldado ferido e tenta arrastá-lo. Eis quando se repete a rajada da metralhadora inimiga.

Nossos observatórios localizam-na em Fantetti. Nossos morteiros partem céleres, precisos. A arma inimiga silencia, mas o heroico tenente fica ao lado do seu soldado. Alguns homens do seu pelotão voltam para busca-los. Era o exemplo do chefe!

Chegam os feridos ao nosso posto de saúde. Os doutores Barcelos e Câmara prestam-lhes os socorros de seu zelo, de sua competência, do seu carinho. Estamos presentes na sala de curativos. Regueira está na padiola, as vestes rasgadas e muito sangue nas coxas. Acariciamos-lhe a cabeça, exaltando-lhe o feito. Barcelos corta-lhe as calças na altura dos ferimentos. As coxas inchadas mostravam um rasgo em cada uma; o da direita era bem maior. Nosso dedicado médico olha-nos significativamente, inicia o curativo, estica as pernas do nosso herói, amarrando-as na extremidade da padiola. O Dr. Câmara aplica-lhe uma injeção de plasma. Continuamos acariciando a cabeça do Ten Regueira.

Crianças do meu Brasil! Quando virem um jovem oficial como muito propositadamente lhes descrevi, andando com as pernas um pouco rijas, apoiado numa bengala, parem e o saúdem reverentemente: é um herói que passa! É o Ten Regueira!

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