A atual corrida desesperada por combustíveis fósseis faz a COP26 parecer algo de outro mundo. Fraser Myers, da Spiked, para a revista Oeste:
Enquanto
a mãe de todas as crises energéticas começa a se fazer sentir, trazendo
o medo do racionamento, da escassez de combustíveis e dos blecautes,
talvez estejamos começando a vislumbrar um lampejo de conscientização,
de reconhecimento da realidade, vindo da classe política verde do Reino
Unido.
Afinal,
pelo menos durante a década passada, nossa política energética foi
movida por uma questão míope e singular: reduzir as emissões de carbono
para mitigar a mudança climática. Como resultado, sucessivos governos
não conseguiram garantir suprimentos baratos e abundantes de energia.
Políticos chegaram a se vangloriar dos planos de tornar o fornecimento
mais precário. Combustíveis confiáveis, apesar de fósseis e emissores de
CO2, foram eliminados. As energias eólica e solar, apesar de não
confiáveis, mas “carbono zero”, os substituíram. Até mesmo a energia
nuclear, que produz energia carbono zero, foi negligenciada e desprezada
pelas nossas elites ecológicas.
Agora,
uma meia-volta parcial está ocorrendo. Enquanto o Reino Unido se
esforça para reunir suprimentos de gás suficientes para o inverno que se
aproxima, e o preço da energia chega a valores impossíveis, de repente a
segurança energética está no topo da lista de prioridades.
Boris
Johnson usou seu discurso final como primeiro-ministro britânico para
afirmar a importância prioritária da segurança energética. Ele afirmou
que a nação vai precisar que, no futuro, a energia seja “barata, limpa,
confiável e abundante”. E denunciou a “miopia” e a “precariedade” que
levaram o Reino Unido a não finalizar nenhum reator nuclear em 27 anos. A
promessa de despedida de Johnson é construir oito reatores nucleares
novos, no ritmo de um por ano.
Claro,
Johnson não cita a obsessão pelo clima como a principal culpada, nem
pede que as metas de energia renovável ou Net Zero (“emissões zero”)
sejam repensadas. Mas é uma mudança considerável na ênfase de um premiê
que, nove meses atrás, na COP26 (uma iniciativa climática da ONU), em
Glasgow, parecia ter incorporado Greta Thunberg, denunciando os males da
Revolução Industrial, enquanto tentava forçar outros líderes do mundo a
desmantelarem suas fontes de energia.
A volta do carvão
Nos
bastidores, as reviravoltas são ainda mais vertiginosas. Estamos
assistindo a uma onda de novas licenças de perfuração para petróleo e
gás no Mar do Norte. Ministros estão pedindo que empresas da área
invistam em novas formas de infraestrutura, recuando em anos de política
governamental e nas chamadas iniciativas ESG (Environmental, Social and
Governance, ou ambiental, social e de governança) do mundo corporativo,
que foram criadas explicitamente para controlar esses investimentos.
Enquanto
isso, instalações de armazenamento de gás estão sendo reativadas — como
Rough, em Yorkshire, costa leste inglesa, que já foi a maior instalação
de armazenamento de gás do Reino Unido, fechada em 2017. E o fracking
(o processo de injetar líquido em alta pressão em rochas para extrair
gás), que por anos foi prejudicado por regulamentações excessivas e
suspenso por completo em 2019, deve receber o sinal verde em breve.
Usina de carvão e turbinas eólicas em Eemshaven, no norte da Holanda
Até
mesmo o carvão — o mais demonizado dos combustíveis fósseis — está de
volta. Pelo menos três usinas de carvão que deveriam ter sido fechadas
ganharam tempo extra. Tudo isso apesar do fato de o Reino Unido estar
oficialmente comprometido com o fim do uso de energia de carvão até
2024.
Aliás,
eliminar o carvão foi o objetivo central da COP26. Durante os
preparativos para o evento em Glasgow, Alok Sharma, presidente da COP,
posou para fotos diante do processo de demolição da usina de carvão
Ferrybridge. Ao fim do encontro, quando a Índia e a China acabaram com o
acordo que eliminaria o carvão como fonte de energia no mundo, Sharma
foi às lágrimas.
Choque de realidade
Olhando
em retrospecto, em meio a uma crise energética cada dia maior, a COP26
quase parece algo de outro mundo. Líderes mundiais, a realeza,
arcebispos, dignitários da ONU e ONGs se reuniram em Glasgow com o
objetivo principal de banir exatamente as fontes de energia que os
britânicos estão desesperados para obter.
Claro,
ainda existem muitas pessoas entre as elites que estão apegadas aos
seus sonhos ecológicos, mesmo diante de um choque tão doloroso de
realidade.
Veja
Ed Miliband, ministro de Energia e Mudança Climática e arquiteto da Lei
de Mudança Climática do Partido Trabalhista britânico. Miliband coloca a
culpa da crise energética na suposta falta de ação climática. Ele
afirma que as conta de luz estão altas porque não temos vento nem luz do
sol suficientes na costa.
E
então temos Ed Davey, líder dos Liberais Democratas, que declara seu
“orgulho” de ter sido a “pessoa a basicamente parar a indústria do
fraturamento hidráulico no país”, apesar da crise energética. Ele
planeja concorrer em eleições parlamentares em uma plataforma
antifracking.
Tamanho
o comprometimento cego e obstinado com o pensamento ecológico que,
mesmo na pior crise energética do século, ainda existem demandas para
tornar o fornecimento de energia ainda mais escasso, ainda menos seguro e
ainda mais precário do que já é. Mas pelo mundo um pouco de luz está
passando pelas rachaduras.
Claro,
a reviravolta energética chegou tarde demais. Simplesmente não há tempo
suficiente antes da chegada do inverno britânico para projetos
suficientes salvarem o país de uma crise severa e dolorosa. Anos de
complacência com as elites e o pensamento verde criaram uma bagunça que
não vai ser arrumada da noite para o dia. Mesmo assim, pelo menos
algumas pessoas estão começando a se dar conta de que não é possível
administrar um país industrializado e avançado sem um fornecimento
seguro de energia.
Fraser Myers é editor assistente na Spiked e apresentador do podcast da Spiked.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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