Mario Sabino se despede da Crusoé:
A
Fênix é aquele pássaro mitológico que renasce periodicamente. Simboliza
a busca pela eternidade, miragem demasiado humana que começou lá no
Egito antigo, prosseguiu na Grécia e em Roma e se perpetuou nas
religiões que sobrevivem até hoje. Em O Livro dos Seres Imaginários,
Jorge Luis Borges compila os cálculos dos prazos de cada uma das vidas
da Fênix:
“Tácito
e Plínio retomaram a prodigiosa história; o primeiro corretamente
observou que toda antiguidade é obscura, porém que uma tradição fixou o
prazo da vida da Fênix em mil quatrocentos e sessenta e um anos. Também o
segundo investigou a cronologia da Fênix; registrou que, segundo
Manillo, ela vive um ano platônico, ou ano magno. Ano platônico é o
tempo de que necessitam o Sol, a Lua e os cinco planetas para voltar à
sua posição inicial; Tácito, no Diálogo dos Oradores, o faz abranger
doze mil novecentos e noventa e quatro anos comuns. Os antigos
acreditavam que, completado esse enorme ciclo astronômico, a história
universal se repetiria em todos os seus detalhes, por se repetirem os
influxos dos planetas; a Fênix viria a ser um espelho ou imagem do
universo. Para maior analogia, os estoicos ensinaram que o universo
morre no fogo e renasce do fogo e que o processo não terá fim e não teve
princípio.”
O
mito da Fênix me ocorreu enquanto pensava neste último artigo para a
Crusoé. Não pela miragem da eternidade, que nunca cultivei, mas porque,
na minha existência finita de homem sem sonhos, fui morrendo e
renascendo a cada década, desde que fiz 20 anos, quando começou a minha
vida adulta. Sou uma Fênix apenas de mim mesmo, com um princípio bem
preciso, prazos decenais e um fim que será o derradeiro.
Agora,
aos 60 anos, deixo os meus dois filhos editoriais, O Antagonista e a
Crusoé. Como escrevi no Twitter, chegou a hora de andarem sem mim.
Deixar que os filhos adquiram autonomia implica a morte de um papel
paterno. Mas também significa o renascimento de um pai que observará de
longe como os filhos se comportarão, na torcida para que trilhem o
próprio caminho sem maiores percalços, e que ele seja bom e longo. Não
há melhor legado.
Só
tenho a agradecer aos leitores que me acompanharam aqui, semana após
semana. Se, por um breve momento, eu os fiz refletir, rir e se
emocionar, conquistei algo de muito valioso para mim.
Adeus e até logo. Fênix enquanto der.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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