O governador Zema foi vítima de difamação, mas o fato é que a desigualdade política entre as diferentes regiões deve ser discutida, escreve a advogada Anne Dias em artigo publicado pela Crusoé:
Seria
Zema um separatista? O foco desta semana foi a manchete do Estadão que
retratou o governador de Minas Gerais como defensor da separação entre o
Sul e Sudeste, em detrimento das regiões Norte e Nordeste. A manchete
foi extraída de uma longa entrevista concedida ao veículo. Contudo, ao
longo de suas respostas, não é possível encontrar nenhuma menção a
movimentos separatistas. Ainda assim, foi motivo de repúdio por
governadores e políticos do Norte e Nordeste. Antes de nos aprofundarmos
no assunto, é crucial esclarecer que Zema não promove nenhum tipo de
divisão territorial ou cultural entre as regiões.Mesmo tendo uma
tentativa de difamar o governador por meio de uma manchete tendenciosa e
de uma repercussão injusta, a desigualdade política entre as diferentes
regiões é um tópico que merece ser explorado .
A
manchete distorcida foi motivada pela menção feita por Romeu Zema ao
grupo do Cosud, o Consórcio Sul e Sudeste, que congrega os governadores
dos sete estados das duas regiões . O grupo opera por meio de encontros
realizados a cada 90 dias, nos quais são discutidos desafios comuns e há
trocas de experiências que podem vencer o desenvolvimento das regiões.
Esse tipo de confiança entre políticos de uma mesma região não é uma
novidade, já que o próprio Nordeste possui o Consórcio Nordeste, criado
em 2019 e apoiado por políticos que criticaram a postura de Romeu Zema,
como o ministro da Justiça, Flávio Dino.
O
grupo mencionado por Zema é formado apenas por governadores. No
entanto, a união e articulação entre os demais parlamentares, como
deputados e senadores, também deveria acontecer de forma mais intensa,
para garantir a representatividade de seus estados. Isso porque há uma
clara interrupção na representatividade política ao se observarem as
diferentes regiões do país . Quando consideramos o percentual de
residentes brasileiros em cada região, o Sul e o Sudeste juntos
representam mais da metade da população — ou seja, 56% dos brasileiros,
totalizando 110 milhões de habitantes.
Quando
abordamos a economia, essa disparidade se torna ainda mais
surpreendente: as duas regiões obedeceram a 70% do PIB brasileiro.
Entretanto, quando analisamos a representatividade política, a
interrupção se torna evidente. No Senado, encontramos apenas 27
representantes das regiões Sul e Sudeste num total de 81 senadores. Na
Câmara Federal, essa desigualdade persiste, não ultrapassando a metade
da representação, apesar de englobar mais da metade da população. O voto
de um acriano vale quatro vezes mais que o de um eleitor do Paraná,
enquanto o voto de um catarinense vale seis vezes menos que o de um
eleitor de Roraima .
Sem
contar que o modelo federativo estabelecido pela Constituição confere
amplas competências aos representantes do Congresso Nacional,
principalmente quando comparados aos representantes locais (vereadores e
deputados estaduais). Deputados federais e senadores podem tomar
decisões definitivas a todo o país, que, frise-se, possui uma escala
continental.
Estamos
lidando com um território vasto e diversificado; por isso, assuntos
como direito tributário, direito trabalhista, direito penal e direito
ambiental, uma vez deliberados, terão abrangência nacional, mesmo com
culturas, climas, economias e ambientes distintos presentes no país.
Nesse contexto, dada a predominância de parlamentares de uma determinada
região, é evidente que uma legislação aprovada também beneficiará
significativamente essa mesma região .
Além
disso, através do cruzamento dos dados da Receita Federal com os da
Controladoria Geral da União (CGU), é possível chegar à conclusão de
que, da totalidade dos recursos encaminhados a Brasília por meio dos
nossos impostos (IPI e IR), a maior proporção é destinada exatamente às
regiões Norte e Nordeste, enquanto as regiões Sul e Sudeste são as que
menos obtiveram retorno, mesmo sendo as que mais obedeceram.
Ao
analisar o cenário político-eleitoral em um nível macro, as regiões
também têm razões para se unir, especialmente porque a inelegibilidade
de Jair Bolsonaro impôs o desafio de reunificar a direita para desbancar
o atual presidente da República. Dos nomes que se destacam, todos
pertencem às regiões Sul e Sudeste: os governadores Zema (MG), Ratinho
Jr. (PR), Tarcísio de Freitas (SP) e Eduardo Leite (RS) foram os mais
cotados. Para que essa aliança da direita se torne viável, é crucial a
articulação entre os governadores a fim de levar um dos candidatos
dessas regiões ao Palácio do Planalto.
Discutir
o pacto federativo e a autonomia estadual não deveria ser encarado como
algo sombrio . É crucial termos médicos que representem os cuidados
médicos de estados em regiões semelhantes, como Zema demonstrou de
maneira exemplar. Não é novidade que há uma elite política arcaica que
governa a maior parte dos estados brasileiros, mas é fundamental que
essas elites restrinjam sua atuação à governança e tomada de decisões
apenas nos estados que as elegeram.
Postado há 3 weeks ago por Orlando Tambosi
Nenhum comentário:
Postar um comentário