Para ser justo, tenho de admitir que compreendo a exasperação destes activistas. Foi-lhes dito que o mundo vai acabar se não forem tomadas medidas urgentes já. Agora. Imediatamente. José Diogo Quintela para o Observador:
Em
2019, numa cimeira das Nações Unidas, perante um embasbacado António
Guterres, Greta Thunberg, já a fazer aquelas bolhas de ranho, bradou:
“Vocês roubaram os meus sonhos e a minha infância!” Uma afirmação
curiosa, porque se estava a queixar de lhe terem roubado a infância ao
mesmo tempo que protagonizava uma fita particularmente infantil.
Naquele
dia, de olhos raiados e tom ameaçador, Greta parecia uma guarda
vermelha. Por se tratar de uma jovem fanática a acusar adultos de
desvios burgueses e também por estar escarlate devido à birra.
Ao
ouvi-la, não houve um crescido que não quisesse de imediato apagar as
luzes todas daquele anfiteatro. Não para poupar electricidade e deixar
de emitir CO2, mas para que Greta pudesse sossegar com uma sesta.
Qualquer pai sabe como os petizes ficam irritadiços senão têm o seu oó.
Talvez
por verem a sua padroeira lamuriar-se amargamente de não ter tido
infância, os activistas climáticos empenham-se em prolongar a sua o
máximo conseguirem. Ultimamente têm-no tentado através de marotas
sabotagens. Depois do vandalismo em obras de arte, a última patifaria é o
esvaziamento de pneus de carros grandes. São partidas juvenis, daquelas
dos programas de apanhados. Os donos dos carros, quando deparam com os
pneus em baixo, devem olhar para todo o lado a ver quando é que aparece o
Nuno Graciano com um sobresselente. Os traquinas podiam ser meros
delinquentes sem nada que fazer a uma quinta à noite. Ou tocavam às
campainhas, ou esvaziavam pneus. Podiam dar-se nomes engraçadotes, como
“Dunlorpas” ou “Piralhi”. Mas não, são activistas e levam a missão muito
a sério: salvar o mundo, câmara de ar a câmara de ar.
Para
ser justo, tenho de admitir que compreendo a exasperação destes
activistas. Foi-lhes dito que o mundo vai acabar se não forem tomadas
medidas urgentes já. Agora. Imediatamente. É natural que se sintam
ansiosos e com ganas de agir. Sucede que estamos em 2023 e isso não é
propriamente uma novidade.
Se estivéssemos em 2006, quando garantiram que era a última oportunidade para salvar o mundo, percebia-se.
Em 2007, quando repetiram a garantia, idem.
Também em 2008, data de nova última oportunidade.
Com boa vontade, compreendia-se em 2016, data de nova última oportunidade extra.
Bem trabalhado, ainda em 2018 se podia meter uma cunha para aceder à última oportunidade.
Por especial favor, em 2020, quando houve uma última oportunidade especial.
Mas não mais tarde que 2021, ano em que a última oportunidade fechou a porta.
Ok. Vá, 2022. A última oportunidade voltou atrás. Mas era mesmo, mesmo a última.
Mas
em 2023? Depois de desperdiçadas tantas últimas oportunidades para
evitar o armagedão e, mesmo assim, o armagedão não vir, era de esperar
que os activistas já não se deixassem enganar. Até o meu cão – que, por
coincidência, também tem medo de trovoadas – às tantas deixa de
acreditar quando eu finjo que atiro a bola e a escondo atrás das costas.
Se
os activistas fossem mesmo crianças, em vez de apenas se portarem como
tal, isto não acontecia. Uma criança, quando alguém lhe diz “é a última
oportunidade que te dou, se não vens já para o banho, nem sabes o que te
acontece!” e, apesar de não ir logo para o banho, continua sem saber o
que lhe acontece, uma vez que não lhe acontece nada, aprende rapidamente
que estas últimas oportunidades nunca são últimas. E passa então a agir
em conformidade, borrifando na ameaça e não comparecendo na banheira.
Em
vez disso, os militantes climáticos não só continuam a reagir por
instinto a qualquer referência a “última oportunidade”, como o fazem
cada vez mais histericamente. Não só não desvalorizam a ameaça por já
ter sido feita muitas vezes em vão, como parece que a levam cada vez
mais a sério. É como se o rapaz que grita “lobo!” fosse arregimentando
mais aldeãos por falso alarme. Como se naquelas seitas que prevêem o fim
do mundo o profeta se tornasse mais credível à medida que vai falhando
previsões.
Isto
significa que, se em 2023 tiram o ar de pneus de carros grandes, em
2033, depois de mais uma dezena de “últimas oportunidades!”, vão estar a
tirar o ar a condutores de carros grandes.
Que
é, aliás, o mínimo que se exige a quem está mesmo convencido que a
Terra vai ser destruída se não se tomarem medidas. Se eu achasse que a
humanidade ia acabar se não parasse de emitir CO2, não ia perder tempo a
esvaziar pneus. Contratava um tipo da Al Qaeda para me ensinar a
planear atentados de grande escala. Como é que terá sido a reunião onde
isso ficou decidido?
Activista 1 – Malta, chegaram novos dados. Esta é a última oportunidade que temos para salvar a Terra.
Activista 2 – Outra vez?
Activista 1 – Agora é que é mesmo.
Activista 2 – Isso foi o que disseste no ano passado.
Activista 1 – Eu sei, mas desta vez é que é. Acredita.
Activista 2 – Como já tinha acreditado no ano passado?
Activista 1 – Este ano é diferente e…
Activista 2 – E no anterior.
Activista 1 – Sim, mas…
Activista 2 – E no anterior ao anterior.
Activista 1 – Ok, mas repara que…
Activista 2 – E no antes desse.
Activista
1 – Já percebi! Cala-te um bocadinho, pá. Desta vez não falha. Vem aí o
Apocalipse e as nossas famílias vão morrer. Os poucos que sobreviverem
vão sofrer imenso. Vai ser horrível. A não ser que tomemos uma medida
drástica.
Activista 2 – Qual?
Activista 1 – Vamos esvaziar os pneus de determinados carros.
Activista 2 – Ui, desta vez é mesmo a sério!
Postado há 1 week ago por Orlando Tambosi
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