Politicos de hoje perdem a noção de honra sendo observados 24 horas por dia, sete dias por semana. Theodore Dalrymple para a revista Oeste:
“A
mudança de governantes é a alegria dos tolos”, diz um antigo ditado
popular romeno; e, sem dúvida, os últimos eventos no Reino Unido deram a
esses tolos muito para celebrar. Tivemos três primeiros-ministros na
mesma quantidade de meses e, apesar de todos serem diferentes entre
eles, porque todos os seres humanos são diferentes, não existe nenhuma
certeza de que nenhum deles seja melhor que os demais. É como se
pertencer à classe política fosse em si uma prova de mediocridade aliada
à ambição, uma combinação bastante infeliz de características.
Sempre
foi assim? Talvez eu esteja romantizando o passado, mas me parece que,
pelo menos na Inglaterra, a classe política, se é que ela existia de
forma nítida e claramente distinguível em relação ao restante da
população como é hoje, tinha uma qualidade superior à atual. Em geral,
ela tinha enfrentado alguma dificuldade pessoal, ainda que tivesse sido
apenas na Segunda Guerra Mundial, e a dificuldade (que eu mesmo nunca
vivenciei para além do tipo causado por mim mesmo) é a escola do
caráter.
Charles
de Gaulle, enfrentando François Mitterrand em uma eleição na França,
foi informado por seus conselheiros de alguns dos muitos defeitos morais
de seu oponente, mas se recusou a fazer uso dessas informações — que,
de todo jeito, não eram novidade para ele — porque, para De Gaulle, o
outro candidato podia ser eleito, e o país precisava que seu presidente
mantivesse algum tipo de autoridade moral, ainda que na verdade
Mitterrand fosse um canalha desprovido de princípios. É difícil imaginar
algum político atual na mesma situação colocar os interesses do seu
país acima de sua própria sede de poder.
Richard
Nixon, que estava longe de ser um gigante moral, sabia perfeitamente
que os democratas haviam roubado as eleições em 1959 e que John F.
Kennedy não era um presidente eleito legitimamente. No entanto, ele se
recusou a fazer escândalo sobre isso, porque achava que o bem do país
estava acima de sua ambição pessoal, e a Presidência era maior que o
homem, incluindo ele mesmo.
Na
Inglaterra, um homem chamado John Profumo caiu em desgraça por causa de
um escândalo sexual do tipo adorado pelos britânicos profundamente
puritanos, mas também profundamente hipócritas, durante o qual ele
supostamente colocou a segurança nacional em risco. Ele foi forçado a
renunciar, e posteriormente seu caso foi tratado como prova da
decadência moral e da corrupção da classe governante da época.
No
fim das contas, essa foi a lição errada a ser extraída desse
acontecimento. Imediatamente depois da renúncia, Profumo desapareceu por
completo da vida pública, dedicando-se ao trabalho social e nunca
tirando vantagem da fama, para, por exemplo, escrever um livro de
memórias, que teria lhe rendido uma fortuna. Ele se manteve em silêncio
de 1963 até sua morte, em 2005. Longe de ser um homem inescrupuloso, ao
contrário, Profumo foi honrado, ainda que falho.
A
honra de Profumo foi do tipo muito raro, se não totalmente extinto da
política atual. Se um político é forçado a renunciar ao ser pego fazendo
algo que não deveria estar fazendo, ele é submetido a uma breve
suspensão e volta pouco depois, de forma totalmente descarada e em geral
em um cargo superior ao que foi obrigado a deixar. Praticamente nada
consegue acabar com uma carreira na política moderna: hoje Profumo não
apenas teria retornado à política rápido, mas teria uma carreira
paralela na TV como celebridade. É necessário para o sucesso na política
hoje em dia, ter o couro de um rinoceronte e a moral de uma cobra.
Claro,
isso significa que apenas as piores pessoas entram nessa ou, pelo
menos, chegam longe quando de fato embarcam nessa. É perfeitamente
possível, até provável, que muitos políticos comecem com a vontade de
fazer o bem, mas abandonam tudo ou são corrompidos no processo pela
desonestidade generalizada, pelo cinismo e pelo empurra-empurra dos
cargos que a profissão exige. A vida de um político moderno é um
inferno, com exceção dos narcisistas e dos exibicionistas. O desejo de
poder ou, pelo menos, de mandatos (o que não é a mesma coisa) deve ser
arrebatador, e todo o resto é sacrificado em nome dele. Um dos
principais talentos necessários é a traição sem crise de consciência.
A
vida de um político é piorada pelo escrutínio constante e inescapável a
que é submetido. Sua vida é vivida como se estivesse sob constante
advertência policial. Quando um suspeito de cometer um crime era preso
na Inglaterra, a polícia costumava dizer (os termos mudaram para pior,
claro): “Você não precisa dizer nada, mas tudo o que disser será
registrado e pode ser usado como prova contra você”. Só que, no caso de
um político, ele não pode se manter em silêncio e precisa falar, como um
jogador precisa chutar bola, mas para o político a partida dura 24
horas por dia, sete dias por semana, e não 90 minutos. Ele está sob
vigilância constante, ainda mais porque todo mundo na sua equipe pode
gravar alguma coisa ou tudo o que ele disser, como se estivesse vivendo
em um Estado totalitário. Portanto, ele está trabalhando o tempo todo e
nunca pode baixar a guarda. Isso esvazia sua mente e o leva
implacavelmente ao clichê. Se você fala em clichês por muito tempo,
começa a pensar em clichês, e então não consegue mais pensar em nada.
Quanto ao humor, ele se torna um risco, porque piadas podem afundar
carreiras.
Em
geral, a transparência na política é considerada uma coisa boa, mas com
certeza Bismarck estava certo ao dizer que não se deve revelar como são
feitas as salsichas e as leis. Precisa haver uma interação entre o
oculto e o revelado, assim como na nossa vida. Quem de nós iria querer
viver sob as condições exigidas pela vida política moderna? Enquanto
exigirmos exposição total e abertura total dos nossos políticos, vamos
ter tanto o que desejamos quanto o que desprezamos profundamente. Nossa
mistura de pruridos intermináveis e pronta indignação vão garantir isso.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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