Eliane Cantanhêde
Estadão
O tempo corre e o burburinho da transição, as disputas por espaço e a ansiedade do mercado e da sociedade crescem e atingem as áreas mais sensíveis. O melhor que o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva tem a fazer é anunciar, ao menos sinalizar, os rumos na economia, defesa e articulação política.
Se ele não apresentou um programa de governo e pretende uma união nacional, com muitas frentes e divergências, precisa reduzir a pressão e amenizar o clima.
BATENDO CABEÇA – Na defesa, tensão. Na economia, suspense. Na articulação política, confusão. Não há nomes para o comitê de defesa na transição, os da economia não palpitaram na PEC do Bolsa Família e a articulação política está fracionada, com a velha “bateção de cabeça”.
Em vez de acenar com o tripé da responsabilidade social, ambiental e fiscal, Lula joga fora o pé fiscal e gera um ensaio de crise, com Guido Mantega caindo fora da transição por causa de “adversários” e o trio Pedro Malan, Armínio Fraga e Edmar Bacha advertindo para o perigo do populismo.
Bolsonaro na pandemia: “E daí?” Lula, diante das reações do mercado: “Paciência…”. Isso não dá certo.
QUESTÃO MILITAR – A defesa é uma das áreas que mais sofreram com Jair Bolsonaro, que contaminou as Forças Armadas politicamente, embaçou biografias que reluziam, rachou os militares e demitiu o ministro da Defesa e os comandantes de Exército, Marinha e Aeronáutica por serem profissionais e apolíticos.
O desafio de Lula é pôr na Defesa um civil moderado e institucional. Para os comandos, contemplar a lista de antiguidade, excluindo os bolsonaristas incuráveis.
Há contatos entre militares e interlocutores de Lula, até para amenizar ataques mútuos, mas a dificuldade é de mão dupla e as pontes, como Nelson Jobim, não topam o desafio. Lula não tem nomes para dialogar com uma cúpula militar que faz ameaças veladas. E quem, dessa cúpula, se dispõe a conversar? Generais Augusto Heleno, Braga Netto e Paulo Sérgio?! Os comandantes?!
TODO CUIDADO É POUCO – Para Gabinete de Segurança Institucional, Polícia Federal, Polícia Rodoviária e Agência Brasileira de Inteligência, todo cuidado também é pouco, porque acumulam as informações deste governo e terão acesso às do próximo. Estão divididas, com as Forças Armadas, mas há mais gente ali aliviada com a alternância de poder do que se vê à luz do dia.
E há os rumos do Ministério da Justiça, dividido no governo Temer e sob risco de virar fiapo. O ex-governador Flávio Dino (MA), cotado para o cargo, é forte, mas o que sobra sem coordenação política, Segurança Pública, PF, PRF, Índios, Menores, Direitos Humanos? E a Política Penitenciária, onde fica?
A transição corre aos trancos e barrancos e Lula precisa aplainar o terreno, não aumentar a buraqueira.
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