Pesquisa da ONG Visão Mundial sobre a Política de Atendimento Socioeducativo em Meio Aberto no Brasil, realizada com base em mais de 3,5 mil entrevistas, aponta que a principal forma de violência sofrida por adolescentes que possuem vínculo com o Sistema Socioeducativo é de motivação racial, seguida pela de gênero e a de classe.
Quando
questionados sobre as três principais motivações de violências
relatadas pelos adolescentes, 13% dos juízes, 12% dos promotores de
justiça e 34% dos defensores públicos entrevistados ressaltaram, em
primeiro lugar, a violência racial.
Em
seguida, a violência de gênero foi citada por 13% dos juízes, 13% dos
promotores de justiça e 15% dos defensores públicos, logo à frente da
violência de classe, com 8%, 4% e 6% das respostas, respectivamente.
“Entender
essas motivações é importante para podermos compreender de que maneira
algumas violências que estruturam a nossa sociedade, que estão
arraigadas, são expressas em atos contra estes sujeitos, e, também, de
que maneira os e as profissionais percebem essa questão”, explica Cibelle Bueno, gerente de projetos da ONG Visão Mundial e coordenadora da pesquisa.
De
acordo com a pesquisa, a violência pode ser entendida como a condição
de risco a que está exposta esta parcela dos adolescentes e jovens
brasileiros, sobretudo, os que estão nas Medidas Socioeducativas em Meio
Aberto, cuja potencialização de riscos associada à fragilização da
proteção predispõe a estes adolescentes uma condição de vulnerabilidade
por vezes implacável e que os expõe, inclusive, à violência letal.
Segundo
o Índice de Homicídios na Adolescência (IHA), mais de 42 mil
adolescentes foram vítimas de assassinato nos municípios com mais de
100.000 habitantes entre 2013 e 2019. Já de acordo com o levantamento da
organização mexicana Segurança, Justiça e Paz, o Brasil e o México
estão entre os países mais violentos do mundo. Em ranking produzido pela
entidade, em 2019, das 50 cidades mais violentas, dez eram brasileiras.
“A juventude vem matando e morrendo em números alarmantes em nosso
país”, alerta Cibelle.
Já
de acordo com o Atlas da Violência, produzido pelo Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os homicídios de jovens entre 15 e
29 anos vem aumentando no Brasil, havendo, em 2017, 35.783 mil mortes –
uma taxa de 31,6 por mil habitantes, o maior número da história. Isto
representa um aumento de 6,7% dos homicídios de jovens em relação a 2006
e ainda um aumento de 37,5% dos homicídios de jovens em relação a 2007.
Além disso, cabe destacar que 75,5% das vítimas de homicídios no
Brasil, em 2017, eram pessoas negras.
A
partir dos dados do Levantamento Anual do Sistema Nacional de
Atendimento Socioeducativo (Sinase), 59,08% dos adolescentes são negros
(pretos/pardos) e 22,49% brancos, assim como a população carcerária, na
qual 61,67% são pessoas negras e 37,22% brancas, segundo dados do
Infopen (2019).
Equipe técnica
A
pesquisa da Visão Mundial também entrevistou profissionais da
assistência social que realizam o acompanhamento dos adolescentes em
cumprimento de Medidas Socioeducativas em Meio aberto. Em relação aos
coordenadores e profissionais das equipes técnicas do Centro de
Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), quando
questionados sobre as principais motivações de violências mais relatadas
pelos adolescentes, encontra-se, também em primeiro lugar, a violência
racial (34% dos coordenadores e 38% dos profissionais das equipes
técnicas).
Em
segundo lugar, aparece a violência de gênero (cerca de 17% dos
coordenadores e 21% dos profissionais das equipes técnicas dos CREAS) e,
em terceiro lugar, a violência de classe (7,5% e 10,4%,
respectivamente).
“A
violência de gênero também apareceu de maneira significativa, o que
envolve a violência física, psicológica, verbal e/ou sexual em função do
gênero e/ou da orientação sexual das pessoas”, esclarece a gerente da
Visão Mundial, ressaltando ainda que, no relatório, o termo violência de
gênero é utilizado para designar a motivação de situações de violência
contra adolescentes mulheres. “Cabe ressaltar ainda que, a LGBTfobia foi
adicionada na mesma categoria, que apesar de ser decorrente da
intolerância pela orientação sexual, também seria um tema que está
intimamente ligado à condição de gênero”
Metodologia
O
diagnóstico mapeou os atendimentos socioeducativos concedidos a
adolescentes nas 27 capitais e em 159 municípios da região
metropolitana, tanto na política de assistência social quanto no sistema
de justiça. Foram realizadas 3.540 entrevistas com profissionais que
atuam diretamente com os direitos das crianças e adolescentes, com a
geração de 3.861 dados de pesquisa validados para análise. A aplicação
dos questionários – contendo ao menos 110 perguntas, sendo estas
realizadas de acordo com cada ator respondente / entrevistado – ocorreu
por meio de pesquisa de campo executada entre março de 2019 e fevereiro
de 2020.
O Diagnóstico da Política de Atendimento Socioeducativo em Meio Aberto
foi realizado pela Visão Mundial, em parceria com o Conselho Nacional
dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) e o Gabinete de
Assessoria Jurídica das Organizações Sociais (GAJOP).
O relatório completo pode ser acessado no site da Visão Mundial.
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