Estamos educando nossas crianças para serem adultos responsáveis ou estamos marinando indivíduos numa imaturidade e numa irresponsabilidade perenes? Pedro Henrique Alves para a Oeste:
“Não ensinamos a nossos filhos que o mundo é plano. Também não deveríamos lhes ensinar teorias sobre a natureza de homens e mulheres baseados em ideologias sem suporte algum.”Jordan Peterson – 12 Regras para a Vida
Recentemente
tive a honra de debater com três adolescentes militantes de esquerda
cujos pais são ricos e superprotetores. Pessoalmente falando, amo
estereótipos — coisa que meus parceiros de sociologia odeiam. Os
estereótipos dizem muito, para o bem e para o mal, sobre os analisadores
e analisados, sobre as ideias sociais vigentes e as ideias periféricas e
inauditas. E, se quisermos começar a entender o que são esses borrões
ideológicos contemporâneos, essas massas militantes que pululam em
nossas universidades e mainstream, então devemos começar por tais
bonecos políticos. Atualmente, poucas coisas são tão caricatas como
jovens ricos que defendem o sistema socialista, o modelo político
responsável pelas maiores e mais abissais misérias — de todos os tipos —
na modernidade. Eu os considero uma espécie social interessantíssima de
ser observada.
No
Reino Unido, por exemplo, tais jovens dizem abertamente adequarem-se
mais ao socialismo do que ao liberalismo (livre mercado), sem, todavia,
saber ao certo o que é esse tal socialismo, muito menos quais são seus
espólios históricos. Uma espécie de adesão de bando, um reflexo social
gerado pela maciça propaganda ideológica das mídias e instituições
oficiais, provavelmente, causou essa dislexia de adesão à ignorância.
Segundo o Institute of Economic Affairs,
depois de uma extensa pesquisa sociológica no Reino Unido, 70 % dos
millenials dizem querer viver sob o sistema socialista, sem saber, no
entanto, identificar minimamente as características de um governo
socialista. Ainda segundo o estudo, os jovens confundem o socialismo com
“bons sentimentos” e o capitalismo com “maus”, além de não saberem
reconhecer quais são as pautas liberais e conservadoras nem quais são as
socialistas ou progressistas.
Dessa
maneira, fica claro que essa geração se apegou não a uma certeza
racional baseada em um senso social analítico, uma experiência humana
testada e ponderada, mas sim a uma religião social que lhe dá a sensação
de união e uma baforada de humanitarismo. O progressismo esquerdista
veste tais millenials com um moletom de propósitos altruístas, com um
senso moral de fast-food que dispensa considerações e contraposições
mais elaboradas, bem como com uma relativa segurança argumentativa
pré-pronta e catequética.
Eles
acreditam piamente nas diretrizes ideológicas com as quais estão
embevecidos, alguns parecem sinceramente acreditar que seus tuítes
engajados e postagens no Instagram estão salvando vidas na África; que
três stories e algumas trends retuitadas podem magicamente apagar 3
hectares de incêndio na Floresta Amazônica e dar 20 cestas básicas a
ribeirinhos.
Mas
sejamos sensatos. Não é possível culpar inteiramente tais adolescentes e
jovens por padecerem de uma falta de clareza na análise dos fatos, de
marinarem em uma imaturidade psicológica, de ativamente viverem sob uma
inocência política assustadora. Sabe o que os três jovens que debateram
comigo tinham em comum? Pais ricos que terceirizaram quase toda a
educação familiar de suas proles a conglomerados educacionais e a babás
profissionais. Os erros dos filhos, em muitos casos, costumam ser os
filhos dos erros dos pais.
Jordan
Peterson costuma perguntar em suas palestras — e o fez de forma
categórica em seu ótimo livro 12 Regras para a Vida —: “Vocês querem
fazer com que seus filhos estejam seguros ou que sejam fortes?”.
Essa
é a questão. Talvez a geração tão criticada pelos conservadores seja
apenas um subproduto da leniência e pomposidade preguiçosa da pedagogia
moderna de pais entediados. Este ensaio não é uma defesa da vara de
marmelo. Falo de uma pedagogia mais profunda, de uma questão de
mentalidade e de princípios que se harmonizam com atos maduros. Pais que
educam crianças e jovens para serem homens e mulheres equilibrados; que
plantam ordem e valores para colher pessoas honradas, capazes de criar
soluções e aguentar momentos de transtornos civilizacionais, familiares e
pessoais.
Estamos
educando nossas crianças para serem adultos responsáveis ou estamos
marinando indivíduos numa imaturidade e numa irresponsabilidade perenes?
Estamos deixando que as naturais dificuldades da existência gestem
neles a necessária resiliência calejadora ou estamos eternamente
enrolando-os em nossas ataduras de conforto, em nossas bolhas sociais
artificiais e telas hipnóticas? Eis a questão.
A
primeira fase de um bebê está em reconhecer, aos poucos, o mundo que o
circunda, logo depois vem a distinção de cores, sons e formas; a
linguagem começa a ser elaborada por meio da repetição, aos poucos,
assim como o senso de espaço, bem e mal; a classificação de pessoas,
coisas e objetos; a interação baseada em regras sociais, sentimentos e
necessidades; a percepção hierárquica, o reconhecimento da autoridade e,
mais adiante, a capacidade de discernir e julgar — o que chamamos de
individuação. Tudo isso são processos quase naturais e existem não por
acaso, mas porque a evolução e a experiência humana testaram e maturaram
esse caminho; não são lá muito necessários doutorados e MBAs para criar
indivíduos voltados à maturidade, basta ser um pai e uma mãe sensatos.
As
crianças têm o direito à fantasia, ao erro no processo de aprendizagem
do mundo e de suas regras sociais, o olhar infantil unido à sua
mentalidade em construção está constantemente suscetível a falhas e
ilusões. Mas é natural que tal processo rareie e, em algum momento,
passe a ser afastado das possibilidades adultas. A ingenuidade numa
criança de 5 anos é fofa, e nos causa riso, em um adolescente de 15 anos
nos deixa alerta, mas em um adulto de 40 anos isso se torna bizarro e
potencialmente nocivo à sociedade.
Pessoas
imaturas tomam decisões imaturas e apaixonadas, afetam terceiros e,
muito provavelmente, não costuram uma família estruturada. Ainda no
supracitado livro, Jordan continua: “Porém, com muito mais frequência,
os pais modernos ficam simplesmente paralisados pelo medo de não serem
mais apreciados ou até mesmo amados pelos seus filhos se os castigarem
por algum motivo. Eles buscam, acima de tudo, a amizade dos filhos e
estão dispostos a sacrificar o respeito para consegui-la. Isso não é
bom. Um filho terá muitos amigos, mas apenas dois pais — se tiver —, e
os pais são muito mais do que amigos. Os amigos têm uma autoridade bem
limitada para correção”.
Em
algum ponto da história moderna, os pais abandonaram seus postos de
autoridade, deixaram de regrar atos imaturos e reprovar ações impulsivas
de seus filhos. Eles se fiaram numa pedagogia de sentimentos, baseada
em uma versão mastigada e ideológica de mundo, e acabaram assim gestando
filhos pouco ou nada comprometidos com seus amadurecimentos
psicológicos, com a verdade dos fatos. Quiseram cercar seus filhos com
marshmallows e purpurinas a fim de não os machucar com suas autoridades,
e acabaram criando adultos irresponsáveis e caóticos.
Na
ausência das dificuldades, minoradas ou solapadas pelos pais, os jovens
se viram livres para brincar de “faz de conta” em universidades,
instituições estatais e posições políticas. Ao evitarem que a realidade
os atingisse, tais pedagogos do caos possibilitaram o advento de uma
geração que acredita poder criar a própria realidade, que ignora a
ciência, os fatos, que briga com seus próprios genes. Indivíduos que
renegam a biologia achando que com isso são mais inclusivos e
filantropos. O novo socialista não vem do chão de fábrica; esqueçam
isso, meus caros. Os sindicatos estão em desuso. O novo socialista vem
das escolas com banheiros neutros e de lares com pais entediados demais
para trocar as fraldas de suas crias.
Para
essa geração ensinada por youtubers milionários e professores
doutrinados, valores morais se tornam males familiares. Seja por rancor,
ausência paterna seja por falta do que fazer, os pais — e a família
dita “tradicional — se tornam o mal do mundo ante os filhos militantes;
aquele senso de propósito antes falado, ajuntado pela religião
ideológica e suas retóricas, faz com que esses jovens se sintam
acolhidos e tenham aquela segurança de valores que seus pais não tiveram
tempo de lhes dar.
Talvez
devêssemos olhar com um olhar de mea-culpa para toda essa questão. Não
que pais presentes e cuidadosos não tenham filhos ideologicamente
afetados, e que pais ausentes necessariamente produzam adultos
infantilizados e imaturos. Não há conta exata quando o assunto é
educação familiar e vontade humana. Mas não podemos ignorar o problema
que se alastra no horizonte, muito menos achar sensato tocar violino
enquanto o navio afunda. Quanto da loucura progressista e do
identitarismo tonificado a que assistimos hoje não foram gestados em
lares cujos pais falharam na mais primordial e importante tarefa a eles
confiada: a educação moral de seus filhos?
Roger
Scruton, em Conservadorismo: um Convite à Grande Tradição, tem um
recado para nós: “A deslealdade à família é uma forma de deslealdade ao
self, dado que envolve a rejeição das condições a partir das quais
emergem a vontade e a razão”. Não podemos cobrar dos jovens alienados a
maturidade que seus pais, de alguma forma, lhes negaram ao educá-los,
seja por descuido, ausência seja por superproteção. A pedagogia do
joelho ralado, da queda e da cinta na bunda tinha seus porquês que iam
além dos laboratórios sociológicos da USP e da adoração a Paulo Freire.
Este é um dos casos em que o conforto preguiçoso de uma geração acaba
parindo o caos e a afetação da geração seguinte.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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