Artigo de João Luiz Mauad, publicado pelo Instituto Liberal:
Falar
sobre o que acontece no Afeganistão é complicado. Aquela nação parece
que ainda vive tempos pré-iluministas, como se estivesse no Século XVII
do Ocidente. A primeira coisa que me chamou a atenção na retomada do
poder pelos talibãs foi a rapidez com que isso aconteceu em quase todas
as províncias do país. Num espaço de uma semana, foram nada menos de 10
capitais, praticamente sem nenhum combate.
Num
de seus discursos, o presidente americano afirmou que o exército
oficial afegão simplesmente não queria lutar. Os soldados tinham armas,
tinham ainda a supervisão dos americanos e ingleses, mas não tinham
qualquer vontade de resistir. Entregaram as armas para o “inimigo” sem
maiores delongas. Talvez se os interventores ocidentais tivessem
convocado e treinado mulheres para as forças armadas, a resistência
tivesse sido maior, afinal, elas teriam muito mais pelo que lutar do que
os homens – mas estou apenas divagando.
De
fato, é inviável manter tropas e tentar ajudar um povo a estabelecer
instituições compatíveis com a democracia liberal ocidental, se este
próprio povo não deseja isso.
“Um
relatório de 2013 do Pew Research Center – 12 anos após o início da
guerra no Afeganistão – pintou um quadro revelador do que os afegãos
realmente pensam.
No
Azerbaijão, um ex-estado soviético, apenas 8% dos muçulmanos disseram
que desejam que a Sharia seja ‘a lei oficial do país’. Em contraste,
esse número subiu para quase unanimidade no Afeganistão – em 99 por
cento. Uma esmagadora maioria – 94 por cento – dos muçulmanos afegãos no
estudo concordou com a visão de que uma esposa é “sempre obrigada a
obedecer ao marido”. E cerca de 85% dos muçulmanos no Afeganistão são a
favor do apedrejamento como punição para cônjuges infiéis. Cerca de oito
em cada dez muçulmanos afegãos apoiaram a pena de morte para aqueles
que abandonam sua religião, com quase quatro em cada dez dizendo que
atentados suicidas e outras formas de violência poderiam ser
justificados em nome do Islã.
Mesmo
após uma década de ocupação liderada pelo Ocidente e a promoção
implacável dos valores liberais-democráticos, ainda era assim que os
afegãos normais viam o mundo. O Afeganistão ainda era uma sociedade
decididamente islâmica, que apoiava os arranjos sociais patriarcais e
formas brutais de punição por adultério e apostasia. Conquistar os
corações e mentes afegãos por meio da promoção do progressivismo de
estilo ocidental era uma quimera.
O
problema para muitos de nossos políticos – especialmente aqueles que
acreditam que é papel da Grã-Bretanha espalhar os ideais democráticos
pelo mundo – é que eles simplesmente não conseguem compreender que
muitos países prefeririam um governo inspirado na Sharia em vez da
democracia liberal ocidental. E não se engane, o Afeganistão – junto com
países como o Iraque e a Palestina – se enquadra firmemente nesta
categoria.” [1]
Em
resumo, nem todo país deseja ser uma democracia liberal, pelo menos não
antes que uma profunda revolução de costumes e tradições os torne
receptivos a ela.
[1] https://www.spiked-online.com/2021/08/18/afghanistan-and-the-delusions-of-nation-building/
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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