Lei proíbe propaganda da violência para mudar a ordem política e tentar impedir o livre exercício dos Poderes; especialistas explicam limites legais do direito à crítica. Reportagem do Estadão:
Para especialistas em direito constitucional ouvidos pelo Estadão, a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes de ordenar buscas contra o cantor Sérgio Reis e o deputado Otoni de Paula
(PSC-RJ) está bem fundamentada do ponto de vista jurídico. Os advogados
explicam que os dois acusados estão sendo enquadrados em ao menos cinco
crimes previstos na Lei de Segurança Nacional.
Esse supostos delitos vão muito além do conceito da liberdade de
expressão garantido pela Constituição. O artista e o parlamentar são
investigados por “incitação à prática de atos violentos e ameaçadores
contra a democracia”.
“A
Constituição assegura a livre manifestação do pensamento”, explica o
professor de direito constitucional na Fundação Getúlio Vargas (FGV-Rio)
Wallace Corbo. “O direito de crítica está assegurado a todas as
pessoas, sobre tudo e sobre todos, principalmente sobre as autoridades.
Mas o que eles estavam fazendo vai além da crítica e incorre em elo
menos cinco crimes previstos na Lei de Segurança Nacional.”
O professor de direito constitucional Salo de Carvalho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), vai na mesma direção.
“Não
se pode confundir liberdade de expressão, como direito à manifestação
do pensamento, com o uso da palavra como instrumento para causar danos,
por exemplo, à imagem, à honra, às instituições”, afirma. “A palavra é
um meio de expressão das convicções; mas também é um instrumento de
ofensa a direitos. Essa é uma questão elementar que parece estar sendo
intencionalmente embaralhada. Uma coisa é o conteúdo da liberdade de
expressão; outra é o uso da palavra, oral ou escrita, para ofender
direitos de terceiros.”
Corbo
citou como possivelmente infringidos por Reis e Otoni os artigos 17,
18, 22, 23 e 26 da LSN. Tratam dos crimes de “tentativa de subverter,
ameaçar ou mudar o regime vigente ou o estado de direito”; “tentativa de
impedir o livre exercício de um dos Poderes”; “propaganda de processos
violentos para alteração da ordem política e social”; “incitação à
subversão da ordem política e social”; e “calúnia, injúria e difamação”
contra autoridades.
“Organizar
manifestações cujo objetivo é o fechamento de um poder constitucional,
incitar a violência, ameaçar a integridade física de autoridades são
tentativas violentas de acabar com o estado de direito. Nada disso é
protegido pela Constituição”, diz Corbo.
Professor
de direito constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ), Rodrigo Brandão concorda. “Neste contexto de ataque às
instituições democráticas e tentativas de intimidação do Supremo e de
seus membros por esses grupos, eles foram além do que é protegido pela
liberdade de expressão”, ele diz.
Segundo
o especialista da UERJ, todo mecanismo de controle de conteúdo, do tipo
de opinião que se expressa, deve ser excepcional. O motivo é que sempre
há o risco de censura.
“Mas
as exceções a essa regra são o discurso de ódio, as teses racistas e os
atos contra a democracia, que tem que se autoproteger”, explica
Brandão. “Esse inquérito é um instrumento de autoproteção das
instituições democráticas contra ofensas que vão muito além da liberdade
de expressão, que atentam contra o estado democrático de direito.”
Dessa
forma, conclui Salo de Carvalho, “a decisão do ministro Alexandre de
Moraes encontra amparo na lei processual penal e parece não ser
inadequada ou abusiva, isto porque eventualmente os investigados
poderiam inclusive ter sido presos preventivamente”.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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