MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 12 de abril de 2020

Pequenos tiranos


Na pandemia, apareceu uma quantidade surpreendente de ditadores de quintal no Brasil. Coluna de J. R. Guzzo, publicada pelo Estadão:


Um dos aspectos mais perversos da violência social imposta ao Brasil com o combate à epidemia trazida pelo coronavírus é o assalto aberto contra as liberdades públicas e individuais. É chocante. Na cascata sem fim de decretos, ordens e regras adotadas todos os dias pelas autoridades para enfrentar a doença, há restrições de primeiro grau aos direitos do cidadão - algo compreensível, e na verdade inevitável, diante da ameaça real à saúde púbica e ao interesse comum. Em grande parte, também, não há nenhuma dúvida sobre as boas intenções, a dedicação e a competência de muitos agentes do governo e de organizações privadas no trabalho que entendem ser o melhor para combater o vírus.
Nenhum problema, aí - são pessoas que assumem as suas responsabilidades na crise e tentam, honestamente, fazer o que podem. O problema é que muita gente em posição de mandar está se aproveitando da oportunidade, com malícia intencional e premeditada, para criar ditaduras pessoais nos pedaços maiores ou menores em que mandam.

Essas pequenas tiranias não vão durar para sempre, é claro - mas serão aproveitadas até o último suspiro pela surpreendente quantidade de ditadores de quintal que apareceu, de uma hora para outra, em todo o território do Brasil. Eles exibem 24 horas por dia o que têm, realmente, dentro de suas almas: uma hostilidade agressiva, rancorosa e ressentida contra os direitos dos cidadãos que governam - e a paixão sem disfarces em mostrar para o mundo que “aqui quem manda sou eu”. Você pode ver, o tempo todo, quem são eles. Estão entre os 27 governadores, 5.500 prefeitos e milhares de fiscais, para não falar em síndicos de prédio e no guarda da esquina, que se descobriram, de um momento para outro, num limbo legal onde não está claro o que podem ou não decidir. É óbvio que tomaram a opção pela ditadura. Cinco minutos depois de verem que a maior parte da Justiça brasileira abandonou o dever de apreciar a legalidade de seus atos, passaram a agir como quem pode decidir tudo.
É perturbador verificar a rapidez com que a mídia, as entidades encarregadas de vigiar se as liberdades do cidadão estão sendo respeitadas e as personalidades que protestam dia e noite contra qualquer arranhão, real ou imaginário, no estado de direito aceitaram a multiplicação de tiranos por este País afora.

Um bandido, ou outro vagabundo qualquer, que apanha da polícia ao ser preso, vira tema de destaque imediato nas manchetes e nos telejornais; o Ministério Público entra em transe e os governadores exigem a apuração imediata e rigorosa da violência policial. Hoje está tudo permitido. Correram o País as cenas da brutalidade com que a Guarda Municipal de Maringá, cidade do interior do Paraná onde se formou o ministro Sérgio Moro, prendeu, agrediu e algemou o dono de um lava-carros que queria trabalhar. Não houve, fora das redes sociais, a mais tímida objeção a esse crime - que se reproduz, com variações, por toda a parte. Em tempos de peste, qualquer prefeitinho vira o Grande Ditador.

O vírus não é o único perigo para o Brasil de hoje. Tão ruim quanto isso é a cumplicidade do Judiciário, dos meios de comunicação, das classes “liberais” e de tanta gente com os tiranos que a covid-19 trouxe à luz. Quem acha certo trocar liberdade por mais segurança não merece nenhuma das duas coisas. Ser livre exige assumir responsabilidades, e não abandonar sua vida à autoridade - ao contrário, a história da liberdade é a história da limitação do poder no governo, nunca do seu aumento. O diabo é que há gente demais com medo de responsabilidades. É o que estamos vendo neste Brasil da epidemia.
 
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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