Os generais politicamente engajados dos anos 60 foram substituídos por militares profissionais. Augusto Nunes:
Cinco décadas depois, parecem tão longínquos quanto a Idade Média os
cabelos compridos dos jovens e o laquê dos cabelos femininos, a
minissaia e a calça boca de sino, o topete de Rock Hudson e a franja de
Doris Day, o DKW e o Gordini, os hippies e os concursos de miss, o Cuba
livre e quase todas lembranças dos anos 60. Quase: muitos brasileiros, a
maioria dos quais nem havia nascido naquele tempo, continuam enxergando
no Exército de 2020 o Exército de 1964. Para a tribo dos nostálgicos
dos quartéis, o passado não passa.
Nos últimos 50 anos, os oficiais engajados do século 20 foram
substituídos por militares profissionais, distantes dos conflitos
partidários e absorvidos por suas atribuições constitucionais. Quem tem
vocação para a vida pública troca a farda pelo terno, o fuzil pelo
microfone e vai à luta nas urnas. É um caminho sem volta.
Em 1964, ainda havia os chamados militares “anfíbios”. Quase todos
pertencentes à geração de tenentes que agitou a década de 1920,
vitoriosos na revolução de 1930, eles passaram os anos seguintes
chefiando alternadamente governos estaduais e tropas do Exército. Esse
vaivém entre a caserna e o palanque acabou no governo do marechal
Castello Branco, que extinguiu a espécie dos anfíbios.
O estrabismo ideológico impede que tanto os radicais de direita
quanto a esquerda desvairada notem a profunda mudança na paisagem. Os
partidários da “intervenção militar” acham pouco ter um governo chefiado
por um ex-capitão rodeado por generais da reserva. Querem que os
militares também ocupem o espaço hoje reservado ao Supremo Tribunal
Federal e ao Congresso. No extremo oposto, José Dirceu afirmou que um
dos maiores erros do PT foi não ter instalado em postos estratégicos
oficiais que simpatizavam com o partido que virou bando.
Para sorte dos portadores dessa estranha forma de saudosismo, nenhum
deles tentou recrutar para aventuras golpistas algum general da ativa.
Como cumpre às Forças Armadas manter a paz social e garantir a ordem
pública, o autor do convite poderia ouvir como resposta a merecidíssima
voz de prisão.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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