MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

quarta-feira, 22 de abril de 2020

Foram os Estados que falharam


Os Estados ignoraram os avisos, não se prepararam e o pânico instalou-se. A resolução da crise econômica não virá deles, mas das pessoas que são os mercados que o socialismo despreza. André Abrantes Amaral, via Observador:

Esta história começou em Novembro quando o Estado chinês não quis saber da existência de um novo coronavírus. Alguns médicos alertaram as autoridades e Pequim silenciou-os. Alguns morreram, outros desapareceram. O governo chinês encarou-os como uma crítica à sua autoridade porque num regime totalitário qualquer alerta é visto como traição. O medo tem destas coisas e não afecta apenas líderes partidários lusos. Até os mais poderosos se sentem frágeis perante um aviso, por bem-intencionado que seja.

Apenas em Janeiro Pequim impôs a quarentena em Wuhan e noutras cidades da província de Hubei. Fê-lo tarde e, como geralmente sucede quando se age tardiamente, com mão pesada. Um padrão de comportamento típico dos estados totalitários. Primeiro castiga-se quem avisa, depois pune-se quem não se comporta de acordo com os conselhos dos que foram castigados. Tirando os autocratas ninguém escapa. Mesmo assim há quem considere que a actuação chinesa foi exemplar.

Isso sucede porque os estados ocidentais também falharam. Em Janeiro o Ocidente convenceu-se que a China estava arrumada com o vírus e não se preparou devidamente. Os estados ocidentais não compraram ventiladores, nem material de protecção médica, nem medicamentos. Pior: não houve coordenação entre eles. Pelo contrário assistiu-se a uma série de acusações mútuas e guerras surdas próprias de quem não tem nervos de aço, nem bom-senso ou sentido do dever. Quando o vírus chegou à Itália foi a estupefacção geral porque o governo italiano não teve o discernimento de fechar as ligações aéreas com a China. Enquanto isso, ou antes disso, feiras internacionais eram canceladas. Enquanto os estados levaram tempo a perceber o que se passava, os mercados agiram prontamente. Tivessem os estados agido em conformidade e o pânico que vamos sabendo ter sido exagerado não se teria instalado, a economia não teria batido no fundo e muitos dos empregos perdidos ainda poderiam existir.

Quando o governo português decidiu fechar as escolas, algumas já se encontravam encerradas. Foram os pais das crianças que decidiram levá-las para casa, antecipando uma decisão do governo. Foram as próprias escolas que o decidiram arriscando a crítica da DGS, como aconteceu em directo na televisão. A força da punição varia, mas o esquema mental está lá. Várias empresas já tinham implementado o teletrabalho, imposto medidas de saúde pública, nomeadamente ao fasear as saídas para o almoço ou, naquelas com cantinas, estabelecendo regras de distanciamento social e também na preparação das refeições como, por exemplo, retirando destas as saladas. Os portugueses agiram na semana entre 9 e 13 de Março porque viram o que se passou em Itália, tiveram medo e forçaram o governo a decidir-se pelo Estado de Emergência que entrou em vigor a 18 de Março.

António Costa deve, e muito, ao medo. E essa dívida de gratidão vai condicionar o seu mandato.

Regressados ao exterior deparamos com um voltar de costas entre os EUA e a UE. Os governos dos dois lados do Atlântico proibiram a exportação de material médico necessário no combate à Covid-19. Num mundo globalizado, os estados que se dizem abertos, fecharam-se em concha e acreditaram que sozinhos resolviam melhor uma ameaça global. Os próprios estados da União Europeia proibiram a exportação de bens médicos essenciais mesmo dentro da UE, apesar desta ser um mercado livre. Foi a Suécia que forçou a França a levantar as suas restrições às exportações porque uma empresa sueca queria transportar material médico para Itália e Espanha, a partir de uma central de distribuição situada em França. Foi uma empresa privada que, em nome de um negócio que gera dinheiro e paga salários, levou por diante uma medida humanitária que salvou vidas. Os estados falharam até na guerra que encetaram devido ao petróleo. Arábia Saudita, Rússia e os EUA foram levianos na forma como viram nesta crise pandémica uma oportunidade para ganharem valor estratégico. Perderam todos e perdemos nós.

Apesar de tudo, a frase que mais ouço por estes dias é que precisamos dos estados para pôr a economia a funcionar. Ouço ainda que precisamos que os estados ponham dinheiro na economia. Estados que não têm dinheiro (este é das pessoas) e estão endividados. Que não têm a margem que tinham depois da Segunda Guerra Mundial. Neste momento forçar os estados a mais endividamento é colocar em risco as prossecução das suas funções essenciais que são a segurança, a ordem pública e também as políticas de saúde. É também destruir a vida dos nossos filhos até ao fim das suas vidas. Seria muito importante que pensássemos nisto antes que embarcássemos em derivas ideológicas apenas porque não conseguimos, não queremos, encarar os factos.

Outra das conclusões mais ouvidas e precipitadas das últimas semanas é a de que estamos perante uma guerra e após uma guerra é normal que os Estados sejam mais interventivos. Compreendo perfeitamente que muitos saudosistas sonhem com um Estado todo poderoso que dite, não só a nossa economia, mas também a completitude dos nossos dias. Sucede que não só não estamos perante uma guerra como a conclusão subjacente é falsa. Nem todas as guerras levaram ao aumento do poder interventivo dos estados. As guerras napoleónicas, por exemplo, tiveram o efeito contrário. E se após a II Guerra Mundial os estados aumentaram a sua intervenção na economia foi, não devido à guerra, mas às ideias socialistas e nacionalistas que se desenvolveram ao longo do século XIX. Foram as ideias, não as guerras, que mudaram o modo como definimos as funções dos estados.

Se as ideias são fundamentais, não devemos esquecer que esta pandemia surgiu porque os estados falharam. Foram estes que acentuaram a crise e não será deles que virá a retoma.

A recuperação económica não virá dos estados distribuírem dinheiro que não têm mas do que prescindirem receber. Como? Baixando os impostos. Reduzindo a carga fiscal e liberalizando a economia. Reduzir os impostos, nomeadamente o IRC, para que se incentive a produção de forma a que oferta se equipare à procura antes que esta caia de vez, destruída por uma inflação galopante. Facilitando os negócios e a criação de emprego através da desregulamentação da actividade económica. Aos estados cabe ajudar a fazer o caminho que já está a ser percorrido pelos cidadãos e pelas empresas, de que estes são donos ou para as quais trabalham. Se os governos refrearem os seus ímpetos proteccionistas, os mercados (as pessoas) farão pontes entre os países recuperando laços antigos que foram danificados nas últimas semanas. Wishful thinking? É tão válido quanto acreditar que os estados nos vão ajudar a sair da crise.
 
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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