Dá agonia ver como o 'Mister Palhaço' se agarra ao poder, mas as cartas
vão sumindo da mesa e os ultrarrealistas russos sabem como a história
termina. Artigo de Vilma Gryzinski:
Nicolás Maduro continua no Palácio de Miraflores, Juan Guaidó
continua solto, o povo venezuelano continua com fome e os caminhões
cheios de comida mandados pelos Estados Unidos continuam pertinho de
fronteiras terrestres, impedidos de entrar no país.
O que pode acontecer quando pessoas desesperadas tentarem ir buscar
os alimentos tão perto e ao mesmo tempo tão longe? O Exército ou a
Guarda Bolivariana vão atirar nos famintos?
É esta a jogada que tende a precipitar a derrocada do Usurpador, como
tantos venezuelanos passaram a chamar Maduro (ele, por sua vez, chama
Guaidó de “Palhaço” ou “Mister Palhaço”, num caso espetacular de
projeção da própria imagem na do inimigo).
Se pudesse, Maduro já teriam trancado Guaidó na mais profunda cela de
Ramo Verde, a penitenciária militar reservada aos presos políticos mais
importantes.
O fato de que não possa é um dos sinais mais evidentes da
inexorabilidade do cerco montado, por dentro e por fora, para expeli-lo
de Miraflores e salvar a Venezuela da anarquia final.
Pode demorar mais do que a maioria dos seres humanos minimamente compassivos gostaria, mas o rumo está traçado.
“Infelizmente, o tempo não está do lado de Maduro”, disse ao site
Bloomberg o vice-presidente da comissão de política externa do Senado
russo, Vladimir Dzhabarov.
“Numa situação de crise econômica agravada, o humor da sociedade pode se voltar rapidamente contra ele.”
Os russos entendem o que os humores da sociedade podem fazer. A
revolução de veludo nos antigos satélites soviéticos, culminando com a
queda do Muro de Berlim e, posteriormente, a dissolução pacífica da
própria União Soviética, é um exemplo histórico retumbante.
O resto é retórica: denunciar uma “invasão” americana, reclamar na
ONU, ameaçar retaliações. A Rússia não vai fazer nenhum movimento bélico
e já antecipa a perda de 10 bilhões de dólares em socorro financeiro,
participações no negócio do petróleo e venda de armas ao regime
chavista.
Ao contrário da China, que colocou mais dinheiro, mas se enredou
menos no charco venezuelano do que os russos, são investimentos
dificilmente recuperáveis no caso de mudança de governo.
Mandar à Venezuela bombardeiros Tupolev, do tipo que pode transportar
artefatos nucleares, como aconteceu em dezembro, talvez não tenha sido
uma ideia tão brilhante assim.
Talvez tenha precipitado a operação Derruba Maduro desenhada pelo
governo americano. Talvez tenha deixado os militares de países vizinhos
muito preocupados.
O prejuízo e os lances errados, de tática e estratégia, obviamente
jamais serão admitidos pelo homem que raramente os comete, Vladimir
Putin.
Falando ao Independent, Fyodor Lukyanov, um especialista “próximo da
elite política”, disse que a Rússia não vai apoiar de jeito nenhum um
governo “fantoche” de Juan Guaidó e que o apoio dos comandantes
militares que mantém Maduro em Miraflores pode “durar mais do que muita
gente pensa”.
As deserções, realmente, são mínimas até agora, apesar das condições
materiais atrozes. “Tecnicamente, não temos capacidade de enfrentar
nenhum inimigo e quem disser o contrário está mentindo”, espetou Hugo
Carvajal, general da reserva que foi companheiro de Hugo Chávez desde a
primeira tentativa de golpe e chegou a chefe do serviço militar de
inteligência.
Carvajal não é um vira casaca qualquer. Enredou-se até o pescoço na
lama bolivariana, tendo entrado na lista negra dos Estados Unidos como
operador do narcotráfico via FARC, a guerrilha colombiana agora
teoricamente convertida.
O general da reserva, eleito deputado pelo partido do governo, pegou num ponto fraco e doloroso.
“Ao alto comando, que hoje nos faz passar vergonha mundial com vídeos ridículos, advirto: parem a tempo no rumo que tomaram.”
Entre a vida, a fortuna, o barco furado do Mister Palhaço de
Miraflores e o futuro incerto, os protagonistas dos “vídeos ridículos”
têm escolhas difíceis.
“O compromisso da Força Armada Nacional Boliviariana é defender o
povo, proteger seus direitos inalineáveis”, apelou a Comissão Nacional
dos Bispos da Venezuela. “A FANB não deve cumprir ordens que atentem
contra a vida e a segurança da população. Deve permitir a entrada e a
distribuição da ajuda internacional.”
A alternativa é atirar no povo.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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