Carmen Alexe viveu sob
regime socialista e chega à conclusão que os velhos pensadores liberais
já proclamavam há muito tempo: socialismo e liberdade são conceitos
completamente antagônicos:
A liberdade individual só pode existir em um contexto de capitalismo de livre mercado. A liberdade pessoal prospera no capitalismo, entra em queda em economias reguladas pelo governo, e desaparece no socialismo.
Quanto mais o estado
se expande e assume o controle (mesmo que apenas regulatório) de vários
setores da sociedade, mais a liberdade (empreendedorial e social) do
indivíduo encolhe.
Por isso, as
populações daqueles países cujas economias não são socialistas, mas
estão debilitadas por amplas e intrusivas regulações estatais,
necessitam ter um apreço mais intenso pela liberdade individual e pelo
capitalismo.
Nasci e fui criada na
Romênia socialista durante a Guerra Fria. Era um país no qual o governo
era o proprietário de todos os recursos e meios de produção. O estado
controlava praticamente todos os aspectos de nossas vidas: nossa
educação, a escolha de nossos empregos, o momento do dia em que teríamos
água quente, e tudo o que podíamos dizer em público.
Assim como os outros
dos países do Leste Europeu, era comum o resto do mundo se referir à
Romênia como um país comunista. Na escola, fomos ensinados que vivíamos
em um país socialista. O nome do país antes de a Revolução de 1989 derrubar o regime de Ceausescu era República Socialista da Romênia.
Do ponto de vista
econômico, uma ínfima fatia das propriedades ainda estava sob controle
privado. Em um sistema comunista, absolutamente toda a propriedade está
sob controle do estado (por isso, o comunismo pleno é um sistema impossível).
Assim, embora não fosse tecnicamente correto dizer que a Romênia era
uma economia comunista, seu pesado sistema de planejamento centralizado e
a imposição de um controle estatal totalitário sobre todos os cidadãos
romenos faziam jus ao epíteto de país comunista.
O socialismo cria escassez e racionamento
Não obstante o fato
de que a Romênia era um país rico em recursos, havia racionamentos por
todos os lados. Comida, eletricidade, água e praticamente cada item
básico e essencial da vida cotidiana eram escassos. O prédio em que eu
vivia tinha água quente para os chuveiros por apenas duas horas pela
manhã e duas horas à noite. Tínhamos de ser rápidos e pontuais, caso
contrário perderíamos a oportunidade. Creiam-me: ter racionamento de
eletricidade e de água quente sob invernos rigorosos não é nada
charmoso.
Chicletes Wrigley e
chocolate suíço, comuns em toda a Europa, eram raridade para nós.
Lembro-me vivamente de como fiquei feliz quando consegui um pacote de
gomas de mascar estrangeiras e uma barra de um delicioso chocolate ao
leite. Tão raros eram que decidi guardá-los carinhosamente, esperando
uma ocasião especial para consumi-los.
Batom, perfume
francês e jeans eram itens disponíveis apenas no mercado negro e aos
quais você só tinha acesso se tivesse as conexões certas. Que Deus
abençoe esses empreendedores do mercado negro, pois foram eles que
possibilitaram que nossas vidas fossem mais toleráveis. Foram eles que
nos davam a oportunidade de comprar coisas que desejávamos intensamente,
mas que não conseguíamos obter nas lojas estatais, cujas prateleiras
estavam ou permanentemente vazias ou cheias de itens feios, repulsivos e
de baixa qualidade.
É verdade que não
precisávamos de nada elegante, mas tínhamos de comes. Neste aspecto, as
mercearias não eram muito melhores. O pão, duro e sem gosto, era vendido
por centímetro, e as poucas postas de carne sobre as mesas imundas dos
açougueiros tinham um aspecto cinzento e nada atrativo. Ovos? Raridade.
Frutas frescas? Nunca vi. Sendo assim, o velho provérbio romeno "A
consciência passa pelo estômago" fazia muito sentido.
A partir do final da
década de 1970, a vida na Romênia passou a piorar a um ritmo mais
intenso. Nem mesmo as carnes cinzentas estavam mais disponíveis.
Consequentemente, nossos pais tiveram de se virar e aprender a preparar o
fígado, o cérebro, a língua e outras entranhas que a maioria das
pessoas no Ocidente nem sequer consideraria experimentar.
Nas raras ocasiões em
que o governo anunciava que leite, manteiga e ovos estariam
temporariamente disponíveis nas mercearias estatais, minha mãe — assim
como todos os nossos vizinhos — acordava às duas da manhã e ia para a
fila, na esperança de ter alguma chance de conseguir essas iguarias. A
mercearia abria às 6 da manhã, de modo que, se ela não chegasse cedo à
fila, perderia a oportunidade de conseguir comida.
Em 1982, o estado
mandou seus funcionários à casa das pessoas para fazer o censo. Feito o
censo, o programa de racionamento de comida foi implantado. Para uma
família de quatro pessoas, como a minha, nossa cota era de 1 quilograma
de farinha e 1 quilograma de açúcar por mês. Isso significa que, ao
comparecermos a uma mercearia estatal, tínhamos de apresentar o cartão de racionamento.
Ele nos daria direito a essa cota de farinha e açúcar — mas,
obviamente, apenas se tais raridades estivessem disponíveis e se
tivéssemos a sorte de estar no lugar certo e na hora certa quando elas
estivessem sendo distribuídos.
O único canal de
televisão era, obviamente, estatal. Sua programação era a mesma: ou
elogiava o governo ou apresentava programas sobre a criminalidade e a
pobreza no mundo ocidental. A nós era dito que as pessoas ao redor do
mundo eram pobres e estavam sofrendo por causa do capitalismo, e que por
isso precisávamos do socialismo para resolver as desigualdades da
humanidade.
O capitalismo e a propriedade privada
Tendo vivenciado a
escassez e o racionamento criados por uma economia controlada pelo
governo em meu país natal, passei a compreender e apreciar ainda mais o
capitalismo, o único sistema que se mostrou capaz de elevar, e de maneira substantiva, a civilização humana, retirando-a de miséria e elevando-a à pujança.
Eis uma definição
de capitalismo: sistema social baseado na propriedade privada dos meios
de produção. É caracterizado pela poupança e pela acumulação de
capital, pelas trocas voluntárias intermediadas pelo dinheiro, pela
busca do lucro, pela livre concorrência, pelo sistema de preços, e por
uma harmonia da busca pelo interesse próprio material de todos os
indivíduos que dele participam.
Ou seja, trata-se de
um sistema econômico no qual as pessoas e empresas incorrem na produção
de bens e serviços, fazem transações voluntárias e comercializam
produtos e serviços sem interferência governamental. Um sistema de
capitalismo de livre mercado funciona da maneira mais eficiente quando não adulterado por intervenções do governo, do banco central ou de bancos estatais nos mercados de crédito, na política monetária e na manipulação das taxas de juros.
Propriedade privada e
direitos de propriedade estão no cerne do capitalismo. Em minha escola
romena, aprendi que a propriedade privada não só torna as pessoas
gananciosas, como ainda é algo nefasto para a sociedade. A propriedade
privada era associada ao capitalismo, o sistema que nossos livros
escolares anunciavam que havia fracassado.
Alocação de recursos
A Romênia era rica em
recursos naturais. No entanto, a diferença entre nosso padrão de vida e
o do Ocidente era dramática. Isso, por si só, era um indicativo de quão
fracassado era o sistema econômico ao qual os países do Leste Europeu
aderiram durante a era soviética.
Ainda assim, a
pergunta permanece: por que havia tanta pobreza, tanta escassez e tanto
racionamento em um país abundante em recursos naturais?
A ciência econômica é
o estudo da alocação de recursos escassos por meio do sistema de preços
livres. Os preços livremente formados indicam quais recursos estão
escassos, quais estão em abundância, e quais recursos devem ser
primordialmente alocados para um determinado setor em vez de para outro
setor (confira uma explicação detalhada e sucinta aqui). Em suma, trata-se do estudo da alocação de recursos escassos que possuem vários usos alternativos.
A eficiência, portanto, é uma preocupação primária quando objetivo é o progresso econômico.
Em um ambiente de
planejamento centralizado, não há sistema de preços livremente formados.
Os preços são estabelecidos por burocratas do governo. Sendo assim, é
impossível saber quais recursos são escassos e quais são abundantes.
Também não há a busca pelo lucro. Logo, é impossível saber em qual setor
há uma maior demanda do consumidor, necessitando de mais investimentos
para expandir a produção. São os vários burocratas do estado que têm a
tarefa de planejar toda a economia e, consequentemente, de fazer toda a
alocação de recursos escassos. (Confira aqui).
É absolutamente
impossível burocratas saberem como alocar adequadamente os recursos
escassos de todo um país, não importa quão espertos, sábios e sensatos
eles sejam. Escassez e racionamentos são uma das consequências de uma má
alocação de recursos escassos.
Já o livre mercado, por meio das múltiplas e espontâneas interações entre empreendedores e consumidores, é capaz de direcionar eficientemente a alocação de recursos escassos
por meio deste incrível processo de oferta e demanda. É exatamente por
meio do sistema de lucros e prejuízos (a busca pelo lucro e aversão ao
prejuízo) que a eficiência econômica é estimulada, algo impossível de
ocorrer sob o socialismo.
Devido à busca pelo
lucro, o capitalismo estimula a inovação. A inovação leva ao progresso e
a um aumento no padrão de vida. Mas o progresso e o ambiente que
oferece aos seres humanos um alto padrão de vida não podem ser criados
sem o capital que irá transformar recursos primários em bens de consumo
que aumentam nosso padrão de vida. E o capital busca ambientes em que é
bem tratado: ambiente de menor regulação, de menor intervenção estatal e
de menor tributação. Em suma, o capital se move para onde há mais
liberdade econômica.
Comunismo,
socialismo, fascismo ou qualquer outro sistema controlado pelo governo
não possui o incentivo da busca pelo lucro. As pessoas, que são os
recursos humanos, não têm o estímulo de incorrer em atividades
empreendedoras quando a recompensa é proibida (a menos que seja no
mercado negro). Elas aceitam que o estado e seu aparato burocrático
controlem sua vida e ditem seu destino. Não há capital, não há
investimentos que produzem bens de consumo que elevam o padrão de vida.
Consequentemente, o
padrão de vida se torna dramaticamente menor que na maioria dos países
mais capitalistas, e a pobreza é acentuadamente maior. O país que adota
um sistema coletivista se afunda em uma armadilha econômica e social da
qual é difícil de sair. Somente o capitalismo pode salvar uma nação do
fracasso de seu planejamento econômico centralizado.
O capitalismo nos ajuda a ser indivíduos melhores
De uma maneira
pavorosamente similar ao velho estilo de vida soviético, uma típica
família da Venezuela possui preocupações cotidianas que nós já temos
como superadas. Elas acordam diariamente preocupadas
se conseguirão encontrar algo para comer, onde conseguirão, e como
pagarão por isso. Além de se preocuparem com como e onde conseguir
comida, ainda têm de se preocupar se haverá itens básicos nas
prateleiras dos supermercados (que já se encontram sob controle
estatal), se encontrão papel higiênico, se conseguirão remédios básicos,
se haverá sabonete, e se conseguirão manter seus filhos minimamente nutridos.
Nós, que temos a
sorte de viver em um sistema de mercado relativamente livre, não temos
esse tipo de preocupação. Vamos diariamente ao nosso trabalho, vemos
televisão, gastamos horas de lazer com Netflix ou nas redes sociais,
ficamos com nossas famílias, lemos livros, escolhemos o que e onde
comer, podemos nos locomover de maneira extremamente barata via
aplicativos de transporte, e ainda desfrutamos alguns hobbies. Em suma,
temos a liberdade pessoal de praticar e usufruir uma variedade de
eventos cotidianos por causa do capitalismo.
Mas há outro
importante — e quase sempre ignorado — motivo para se desejar viver em
uma sociedade capitalista: dado que não temos que nos preocupar com as
necessidades básicas de amanhã (sabemos que sempre haverá comida e itens
básicos à disposição, sem perigo de racionamento), temos mais tempo
para ler, explorar e inovar. Consequentemente, somos livres para criar e
implantar todos os tipos de idéias empreendedoriais, não importa quão
malucas elas possam parecer à primeira vista.
Não fosse o
capitalismo e a abundância que ele nos permite, nossa preocupação diária
seria exclusivamente em como iríamos nos manter vivos amanhã, como
encontraremos comida e como provermos nossas necessidades básicas.
Apenas isso ocuparia nossas mentes. Tendo vivido na Romênia socialista,
conheço bem essa sensação. Ou então pergunte a um venezuelano.
Assim, por nos
fornecer diariamente acesso aos itens essenciais para nossa
sobrevivência, o capitalismo nos permite estar sempre em busca de
desafios, ter objetivos e metas, e nos esforçarmos para conseguir
alcançá-los. Ele nos dá a liberdade de tentar coisas novas e de explorar
novas oportunidades. Ele nos dá a chance de criar mais oportunidades.
Ele nos ajuda a fortalecer nosso caráter, pois, quando tentamos, também
fracassamos, e sem fracassos, como podemos saber que cometemos erros?
Sem fracassos, como podemos saber que precisamos mudar?
A liberdade individual só pode existir em um mercado livre
Antes de imigrar para
os EUA, tive de passar por um rigoroso processo. Um dos eventos
memoráveis foi minha entrevista com o orientador americano que, entre
várias outras perguntas, queria saber por que fugi da Romênia e por que
quis vir para os EUA.
Minha resposta curta
foi: 'liberdade'. E então ele fez uma pergunta interessante: "Se os EUA
passarem por um período de devastação econômica, com escassez e
racionamentos similares aos da Romênia, você ainda se sentiria da mesma
maneira?". Não pensei muito sobre isso, e apenas respondi: "Sim, é
claro, desde que eu tenha liberdade".
Hoje, olhando em
retrospecto, vejo que esta foi uma resposta tola e insensata. A
liberdade individual — esta condição humana básica e essencial — só pode
existir em um arranjo econômico de livre mercado. Se uma economia entra
em colapso, se escassez e racionamentos se tornam a rotina, não há
nenhuma possibilidade de liberdade individual.
Escassez e
racionamentos são criados pela intervenção do estado neste intrincado e
complexo arranjo que é o mercado (a livre interação entre consumidores e
empreendedores), seja por meio de controle de preços ou de uma
insensata alocação de recursos.
E quando a escassez é
intensa e prolongada o bastante para afetar de modo dramático a vida
das pessoas, elas tendem a se revoltar. E revoltas populares geram
sérias contra-reações do governo, dentre as quais (mas sem se limitar a
isso) a abolição total dos direitos individuais (o direito à liberdade
de expressão e de ter armas), a implantação de um estado policial e,
acima de tudo, a criação de um poderoso aparato de propaganda estatal.
Sobre este último, o grande Theodore Dalrymple certa vez disse o seguinte:
Em meus estudos sobre
as sociedades comunistas, cheguei à conclusão de que o propósito das
propagandas feitas pelo regime não era persuadir ou convencer os
cidadãos, nem tampouco informar; o propósito era humilhar.
Consequentemente, quanto menos a propaganda correspondesse à realidade,
melhor.
"Quando as pessoas são obrigadas a permanecer em silêncio ao mesmo tempo em que lhe contam as mais óbvias mentiras; ou, pior ainda, quando elas são forçadas a repetir elas próprias essas mentiras, perdem todo o senso de honestidade.
Consentir com mentiras óbvias faz com que você, de certa forma, se torne também uma pessoa perversa. Qualquer resistência é erodida, e acaba sendo totalmente destruída. Uma sociedade formada por mentirosos emasculados é fácil de ser controlada.
Por isso, é impossível haver liberdade em um ambiente cujo estado é poderoso e cuja economia é por ele controlada. A consequência lógica deste arranjo sobre a população é a contínua abolição das liberdades mais básicas do indivíduo.
O capitalismo de
livre mercado é o único caminho para os direitos individuais e a
liberdade, ambos os quais representam os sólidos fundamentos de uma
sociedade livre. Já socialismo e liberdade são conceitos completamente antagônicos. (Instituto Mises Brasil).
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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