Humildemente começo pedindo perdão aos leitores desse
escrito porque uma boa partedele será muito “chata”. Necessariamente terei que
fazer algumas incursões dentro da parafernália legislativa que os políticos fizeram,
que nem mesmo os operadores do direito conseguem mais entender
satisfatoriamente ,mesmo para o exercício das suas profissões. E posso provar essa
assertiva mediante um recurso muito simples. Bastaria acessar o site “www.planalto.gov.br”(Planalto)
e ver em qualquer lei que ali for objeto
de consulta os inúmeros “riscados”que
estão nos seus dispositivos, significando revogações de alguns ou de toda lei, por normas legais posteriores. Tantas são
elas que se editam novas leis, omitindo, algumas vezes tendenciosamente, ou até
mesmo nem mais sabendo os seus autoresexatamente o que está sendo modificado,
que chegam a escrevercom naturalidade no
último artigo da lei modificadora a expressãomuito singela “revogam-se as disposições em contrário”,
invariavelmente deixando de mencionar o
que seria esse “em contrário”. Em síntese, de tantos riscados,“rasgados”,emendas,supressões,substituições
e aditamentos que são feitos, a versão modificada da lei antiga torna-se uma
colcha de retalhos que ninguém mais consegue entender , facilitando a
penetração de “vírus” com formato humano que se valem dessa confusão legal para
perpetrarem os seus crimes, longe do alcance dos controles estatais e das
autoridades.
Na verdade nenhum outro país
consegue competir com o Brasil em número de leis editadas. Enquanto a
produção econômica local é insuficiente
para atender as justas demandas da
sociedade,o mesmo não pode ser afirmado sobre a “produção legislativa” ,que é “medalha
de ouro”,“campeã mundial” ,e quetem força suficiente para emperrar a verdadeira atividade
produtiva e servir de incentivo à corrupção.
Ora,se a enorme quantidade de leis é algo tremendamente nocivo
aos desenvolvimentos econômico ,político e social, menos verdade não é que elas
também servem de instrumento para o crime organizado da politicalha, porque as
leis são feitas por quadrilhas de criminosos que se infiltram nos Poderes do
Estado, fazendo novas leis que acabam legitimando o que antes era ilícito e que
atende somente aos interesses dessa “bandidagem”.
Portanto, hoje os crimes não são mais
praticados somente por quem
ofende as leis penais mais tradicionais, mas também e principalmente pelos que a elaboram, e depois
se valem delas, em proveito próprio,ou
seja, em última análise, pelos legisladores e
demais políticos buscando cobertura legal para suas falcatruas.
Pessoalmente não vejo nenhuma saída para um Brasil DECENTE
se ele permanecer submerso nessa “montanha” de leis que massacra o seu
povo e esconde a corrupção. O primeiro passo de uma verdadeira revolução que
atendesse aos reclamos da sociedade rumo
ao pleno desenvolvimento das suas potencialidades ,teria que ser em primeiro lugar a armação de uma GRANDE
FOGUEIRA, onde se queimassem TODAS AS LEIS e a própria CONSTITUIÇÃO que lhes dá
amparo. Começar-se-ia da “estaca zero”,é verdade, mas seria melhor que
recomeçar de um mar de lama,mediante confecção de uma constituição com poucos artigos e algumas
normas infraconstitucionais, como acontece no mundo desenvolvido e mais
evoluído politicamente, e que todo mundo conhecesse e acima de tudo respeitasse
essas leis,tudo entrando em vigor no menor prazo possível.
Lançadas as preliminares, é hora de chegar-se ao objetivo
propriamente dito desse escrito, ou seja ,referenciar as premissas acima
enunciadas à realidade que degenerou a atividade das empresas estatais,
enquanto entidades jurídicas vinculadas
à Administração Pública,e que serviram nos últimos anos de palco para a mais
vergonhosa corrupção no setor público em todos os tempos. Comumente conhecidas
como ”estatais”,as mesmas também são chamadas de empresas governamentais ou paraestatais,
essa última preferida pelo reconhecido
administrativista Hely Lopes Meirelles.
Sem dúvida a proposta governamentaloriginal das estatais
dentro do modelo do Decreto-Lei Nº 200/67 foi algo genial. Satisfazia o
interesse do Estado,e do próprio povo , em contar com serviços compatíveis à modernidade, e que
porém não interessavam à iniciativa privada pelo precário rendimento propiciado nessas atividades. Foi o
caso da telefonia pública, por exemplo, que de início era uma “bucha” que o
Estado necessitava suprir e não encontrava interessados no mercado .O Estado
foi obrigado a “abraçar” essa atividade, em Pleno Regime Militar, onde todo o
lucro que advinha daí sempre foi
reinvestido no crescimento da planta telefônica. Não havia rentistas “mamando”
nos lucros das empresas. Mas o avanço da tecnologia passou a incluir as
telecomunicações. O que antes servia só para a telefonia passou a ter uma
enorme gama de outras aplicações,como transmissão de TV, processamento de dados
e incontáveis outras. Foi a gota d’água que tornou a exploração das
telecomunicações altamente lucrativa e por isso muito procurada pelas iniciativa
privada , principalmente estrangeira. A telefonia começou a dar atraentes
lucros. Então ela foi “devolvida” aos antigos proprietários,aos gringos, com
precinhos camaradas, mediante subavaliação dos bens, na chamada “privataria
tucana” ,ou seja, prioritariamente aos grupos estrangeiros ,abandonando-se
totalmente o espírito nacionalista das telecomunicações sempre levado com muito
rigor pelos militares que modernizaram as telecomunicações
(Embratel,Telebrás,etc).
Minha modesta abordagem,portanto, é bem demarcada no
tempo. Tem como ponto de partida o anode 1967,em pleno Regime Militar, quando entrou em vigência
o Decreto-Lei Nº 200,dispondo “sobre a Organização da Administração Federal,
estabelecendo diretrizes para a reforma
Administrativa”,dentre outras providências. Saliente-se que passados 50 anos o
arcabouço desse DL, que teve e tem grande mérito político, ainda vige, com poucas
modificações. O que foi mexido, alterado ,sempre o foi para pior.O mais significativo exemplo é o
regime das LICITAÇÕES, para compras, obras e serviços da Administração.
Até a edição do DL 200/67,as LICITAÇÕES eram reguladas em
grande parte na Lei Nº 4.535,de 1922,que aprovara o Código de Contabilidade
Pública,durante o Governo de Epitácio Pessoa,e que tratava também das
“concurrências públicas” (era assim mesmo que se escrevia) ,nos artigos 50 e
seguintes.
Adicionando alguma ordem àAdministração , o citado Decreto-Lei fixou no seu artigo 4º
que a Administração Federal compreendia
a ADMINISTRAÇÃO DIRETA e a ADMINISTRAÇÃO
INDIRETA. A primeira se relacionava aos serviços integrados na estrutura administrativa da
Presidência da República e Ministérios. A segunda,a Administração Indireta,era
relativa a categorias de entidades com personalidade jurídica própria,de alguma
forma vinculadas à Administração,consistindo nas AUTARQUIAS,nas EMPRESAS
PÚBLICAS,nas SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA e nas FUNDAÇÕES PÚBLICAS ,as primeiras de direito
público e as demais de direito privado.
As AUTARQUIAS foram dotadas de personalidade jurídica de
direito público,integrando a Administração Indireta,criadas por lei para
desenvolvimento de atividade típica do Estado,com seu patrimônio de natureza
pública. As EMPRESAS PÚBLICAS,por seu turno,definem-se como entidades com
personalidade jurídica própria,de direito privado,patrimônio próprio e capital exclusivo
da União, criadas por lei para exploração de atividade econômica. Já as SOCIEDADES
DE ECONOMIA MISTA são empresas também com personalidade jurídica de direito
privado,criadas por lei para exploração de atividade econômica,regidas
pelas leis respectivas das sociedade anônimas,sendo a maioria das
suas ações com direito a voto de titularidade da União ou Entidade da
Administração Indireta. As FUNDAÇÕS PÚBLICAS,tinham também
personalidade jurídica de direito privado,criadas por lei,sem fins
lucrativos,com autonomia administrativa e patrimônio próprio.
Feito esse apanhado, normalmente se considera EMPRESAS
ESTATAIS (ou parestatais) as SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA e as EMPRESAS
PÚBLICAS da Administração (da União, Estados, ou Municípios). E foram
justamente nas Sociedades de Economia Mista da União onde se verificaram os
maiores focos da corrução, cujo exemplo mais expressivo é o caso da Petrobrás.
E dentro das EMPRESAS PÚBLICAS,a corrupção e a quebra dos Correios não pode ser
olvidado. E o pior é que alguns chegam a garantir que o rombo lá no BNDES
supera todos os outros ,passando do TRILHÃO DE REAIS.
Corrompendo totalmente o espírito das empresas estatais arquitetado lá atrás no DL 200/67,a
legislação posterior deu plenas condições para que começassem os seus declínios,
sob os pontos de vista econômico, moral, político e social. Previa o art.125 do
DL 200: “As licitações para compras,obras e serviços passam a reger-se na
ADMINISTRAÇÃO DIRETA e nas AUTARQUIAS,pelas normas seguintes:....”. Ficavam
fora do regime das licitações ,portanto,as empresas estatais dotadas de
personalidade jurídica própria e de direito privado,como as Sociedades de
Economia Mista e as Empresas Públicas.
Mas o Governo não se conteve em ver que alguma coisa estava
funcionando bem na Administração ,e logo tratou de estragar tudo. Esse
“estrago” começou pelo regime das licitações inserido no Decreto-Lei Nº 2.300,de 1986 ,que passou a exigir das
empresas estatais plena submissão ao regime das licitações,igualzinho à
Administração Direta. Paralelamente tiraram toda a autonomia administrativa que
as estatais tinham e que funcionava bem. Transformaram-nas em repartições
públicas comuns, onde nunca nada funcionara direito. “Empurrando” nelas o
regime predatório das licitações,na
verdade forçaram-nas a adquirir o que seria necessário para suas atividades,
pagando bem mais caro por tudo do que antes ,quando
funcionavam como empresas privadas. E se de fato o regime das licitações
fosse bom, é claro que as empresas privadas também o adotaria. Mas isso não
acontece.O citado DL 2.300/86 foi
revogado pela Lei Nº 8.666,de 1993,a qual passou a regular as licitações na
esfera pública, ”reforçando” a cassação da autonomiadas estataisjá antes
consagrada no DL 2.300.
A ingerência perniciosa dos governantes na administração das
estatais foi a extremos. Mas todo esse “trabalho” foi facilitado porque
colocaram gente “obediente” nas administrações das empresas, deficientes de
personalidade própria e sem caráter.
Esses administradores de “confiança”
implantaram nas estatais alguns vícios que antes só se via na Administração
Direta, dentre os quais o “inchaço” das folhas de pagamento, com uma enorme
quantidade de CCs , e uma política salarial às vezes generosa , talhada nos
moldes de quem quer votos. E se isso não bastasse ,e por “tabela” ,estes
dirigentes também “aparelharam” os grandes fundos de pensão das estatais com
lacaios buscados lá nos porões imundos dos
sindicatos fascistas idealizados por Mussolini, e que acabaram quebrando e roubando os fundos ,em
proveito próprio, de políticos, e de
partidos, nocauteando a esperança dos trabalhadores participantes que pagaram
uma vida inteira para obter algum reforço financeiro nas suas minguadas aposentadorias
do INSS ,quando chegasse o momento.
Mas a culpa por toda essa situação caótica não se restringe
aos dirigentes das estatais e fundos de pensão. Essa “culpa” é muito mais
abrangente. Começa lá nas “urnas” da Justiça Eleitoral,onde o lado frágil da
personalidadedos eleitores derrota o lado virtuoso, resultando daí a escolha do
“lixo” humano entre os candidatos a exercerem mandados eletivos para o Executivo e o
Legislativo. E lá chegando, esse “lixo”, por seu turno,também vai escolher
outros “seus iguais” para comandarem as estatais,que por suas vezes transferem
essa mesma rotina na indicação dos
dirigentes dos fundos de pensão, do mesmo modo entre os “seus iguais”. Por
conseguinte, a “sagrada” democracia por aqui praticada carrega grande parte da
culpa, Mas ela não é a democracia verdadeira. É a falsa. É um arremedo. Ela mais se aproxima da
OCLOCRACIA, que é a democracia pervertida,degenerada,
corrompida, cujos únicos beneficiários dela integram a patifaria política.
Sérgio Alves de Oliveira
Advogado e Sociólogo
Nenhum comentário:
Postar um comentário