Treze horas na sala Vip do Aeroporto de Brasília. A “Frente de Redemocratização” se preparava para o voo da Vasp para Goiânia, onde fariam um comício. Sentados nas macias poltronas negras, Magalhães Pinto e dona Berenice, deputados Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, senadores Teotônio Vilela, Mauro Benevides e Evandro Cunha Lima, deputado Rafael Almeida Magalhães, jornalistas Sílvia Fonseca, de O Globo, Marcondes Sampaio, Nélson Penteado e eu, da Folha.
O general Euler Bentes e os senadores Roberto Saturnino e Marcos Freire haviam vindo ao Rio e seguido de automóvel com o jornalista Pompeu de Souza. Chega uma jovem da Vasp e avisa que o voo ia atrasar porque o avião estava em conserto, na pista. Quando anunciaram o voo, pela porta víamos na pista mecânicos deitados embaixo do avião, puxando carrinhos e consertando coisas. Fomos. Exatamente às 16:00, o avião rolou na pista, foi até o fim, decolou, mas em visível dificuldade.
Começou a voar baixo, muito baixo, sobre o planalto verde. A asa direita bastante inclinada, os motores trêmulos, entrou em longa curva e a arquitetura branca de Brasília ali cada vez mais perto. Voou alguns minutos e, de repente, a aeromoça, com voz tensa, informa:
– Senhores passageiros, vamos voltar para o Aeroporto de Brasília, em emergência. Fiquem tranquilos, vai dar tudo certo, é uma pane no sistema hidráulico. Façam o obséquio de tirar canetas, objetos, folgar as gravatas, tirar os relógios, anéis, alianças e curvar o corpo sobre os joelhos.
A PANE
E a aeromoça morena, muito calma, e duas bem alvas, nem tão calmas, passaram a distribuir travesseiros e cobertores para o apoio do rosto, e pegar embrulhos, objetos e levar lá para o fundo. Um passageiro, atrás do deputado Tancredo Neves, chama a aeromoça baixinho:
– Não estou entendendo porque tirar tudo.
– Meu senhor, há uma pane no sistema hidráulico. Se, ao tocar o chão, o avião virar, haverá incêndio e é preciso sair rápido.
Olhei o relógio, 16:22. Tive consciência da gravidade e me preparei para ver o máximo de detalhes. À minha frente, a Sílvia tira a aliança. Põe novamente no dedo e diz a Marcondes, que era uma pedra de tranquilidade:
– Não vou tirar a aliança não. Sei que vou morrer e só poderei ser reconhecida por ela. Não quero meu marido chorando em cova errada.
Imediatamente peguei meu relógio, que havia posto no bolso, e pus novamente no pulso. Também queria ser reconhecido. Atrás de mim, Magalhães Pinto segura forte a mão de dona Berenice que, de olhos fechados, reza profundamente. Ulysses e Tancredo, impassíveis, olham em frente sem piscar o olho. Teotônio aperta ao máximo o cinto e Rafael folga a gravata e curva o corpo sobre os joelhos. Mauro Benevides olha pela janela em silêncio. Evandro Cunha Lima, vermelho. Lá na frente, uma mulher chora, mas chora baixo. A seu lado, uma cigana toda de roxo treme e reza lívida, os olhos molhados. Sílvia sorri:
– Meu Deus, olha uma cigana!
Sílvia volta o rosto sobre a cadeira:
– Nery, você está pálido.
– O que é que você queria? Que, com esse medo estivesse luminoso?
O MEDO
E ela ficou longamente olhando pela janela, serena, como os que sabem que vão morrer e se conformam.O avião vai descendo, passa baixo sobre um campo verde. Ao longe três grandes carros vermelhos dos Bombeiros, uma ambulância e dois carros azuis da Aeronáutica. Fico olhando o azul muito azul da tarde linda, nuvens brancas esgarçadas lá longe no horizonte interminável do planalto, uma novilha esgalga andando mansa no pasto e o avião trêmulo mas tranquilo, descendo empenado.
Amarrei o medo dentro de mim como um louco incontrolável, e por segundos mergulhei infinitamente nos braços da morte. Uma procissão de amor passou em relâmpago: meus pais, filhos, a infância, meu amor azul, Santo Afonso Maria de Liguori nas “Meditações sobre a Morte”, de manhã, no Seminário da Bahia: “É preciso conquistar a intimidade da morte”.
O avião avançava sobre a pista e entre faíscas se arrastou até o fim.
O medo voltou frio, e o “Domingo Azul do mar”, de Paulo Mendes Campos, entrou olhos a dentro, na estupidez de morrer na tarde azul.
O CATA MILHO
Não seria um ministério. Seria um cata-milho. De tal maneira o PT abastardou a vida pública nacional que agora queriam o MINC (Ministério da Cultura) reduzido a um lupanar de picaretas arrancando verbas em troca de votos. Iludem-se imaginando que o pais não vê.
Os verdadeiros criadores culturais continuarão nos palcos com suas peças, seus filmes, seus espetáculos, seus livros, suas artes, honrando a cultura e a vida da Nação. Pouco importam os impostores. A historia sempre caminhou para a frente e a máfia cultural vai ficando atrás.
O que conta são os o que contam. O que contou foi Gustavo Capanema, Anísio Teixeira, José Aparecido, Celso Furtado, Antonio Houaiss, Luis Roberto Nascimento Silva, Francisco Weffort.
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