Renomado chef Ferran Adrià detalha projeto de 'Wikipédia gastronômica'

Em São Paulo, chef espanhol fala de projetos on-line como a 'Bullipedia'.
Extinto restaurante elBulli será parte de 'museu-laboratório', em Barcelona.

Daniela Braun Do G1, em São Paulo

O chef espanhol Ferran Adrià nesta terça-feira (5), em São Paulo (Foto: Daniela Braun/G1)

Esta semana, o renomado chef espanhol Ferran Adrià, de 51 anos, deve conhecer os três finalistas, entre estudantes de ciência da computação e design, selecionados pelo concurso 'HackingBullipedia' para colaborar e dar sugestões a um de seus novos projetos. A Bullipedia (veja aqui um resumo do projeto), uma biblioteca on-line colaborativa de gastronomia, vai catalogar e organizar ingredientes, técnicas, preparos e teses sobre alimentos, com ajuda de universidades e escolas especializadas do mundo todo, além de especialistas voluntários. A ideia é ser uma referência a profissionais, estudantes e interessados no tema.

O importante é criar criadores de pratos"

Ferran Adrià

Adrià também poderia ser considerado um ‘hacker’ da gastronomia. Entre 1987 e 2011, na cozinha de seu disputado restaurante elBulli, em Barcelona, o chef reinventou a culinária moderna usando técnicas inovadoras e ousadas de desconstrução dos alimentos – muitas delas já catalogadas em livros do elBulli e que agora também serão compartilhadas na rede.
“Queremos fazer um Google melhor”, disse Adrià, sobre o projeto da Bullipedia, nesta terça-feira (5), em São Paulo, após uma apresentação onde trocou o avental pelo conjunto ‘camiseta, jeans e tênis’ para falar de inovação e dos projetos da Fundação elBulli.

Ferran Adrià em entrevista nesta  terça-feira (5), em
São Paulo (Foto: Daniela Braun/G1)

“Ser você busca aspargos no Google encontra 2,1 milhões de resultados (...). E o problema é que a Wikipedia tem pouca informação sobre gastronomia”, disse. O objetivo de sua wiki, segundo ele, “não é ter milhões de verbetes”, mas ser uma ferramenta para que as pessoas possam “compreender o significado de cozinha” e “compartilhar conhecimento e informação”.

"O que é uma fruta?", "O azeite é um produto ou uma elaboração?", "Se um ravioli não for quadrado não é mais ravioli?" foram algumas questões que o chef citou entre temas que pretende responder em seus projetos. "Se alguém tiver uma boa definição do que é uma fruta está convidado a um fim de semana em Barcelona para ver uma partida do 'Barça'", desafiou.
Após mais de duas horas de apresentação  o chef incansável, que trabalha 15 horas por dia, respondeu a um jornalista que não gosta de cozinhar em casa. "Eu não gosto de cozinhar em casa. Você gosta de entrevistar em casa?", devolveu. "É muito mais importante comer do que cozinhar".
A ferramenta também terá um banco de dados de fornecedores de produtos, em janeiro de 2015, teses sobre cozinhas populares de diferentes países (batizadas de ‘CuTesis’ na Bullipedia) no mesmo ano e, a partir de 2016, algumas receitas como referência. A tradução do conteúdo do espanhol para outros idiomas, segundo o chef, dependerá do interesse de cada país.

Adrià esclareceu que o conteúdo da Bullipedia não será restrito a profissionais. “A área de cozinha popular pode ser acessada por qualquer pessoa”, disse o chef ao G1.

Outro projeto, segundo ele, é ensinar o básico da cozinha. “Queremos fazer um projeto com a Telefônica de um curso para quem não sabe cozinhar nada. Por exemplo, o básico: ‘como cozinhar uma massa?’. Não um prato complicado. Mas como cozinhar uma massa com molho de tomate. E que a massa seja bem feita”, explica.

Além da Bullipedia, a Fundação patrocinada pela Telefônica, abrirá o que chama de 'museu-laboratório' sobre a história da gastronomia, em Barcelona. No espaço de mais de 4 mil metros quadrados chamado ‘elBulli 1846’ – referência ao número de pratos criados na cozinha de Adrià –, que deve ser aberto a visitantes em 2016, o chef pretende contar toda a história da gastronomia passando por um laboratório de criação culinária em atividade.
Outra linha de trabalho é o elBulli DNA, um banco de dados sobre técnicas culinárias que o chef classifica como o ‘mapeamento do genoma gastronômico’. O projeto que também tem um forte objetivo educacional contemplará a história da cozinha – incluindo livros antigos de culinária, que datam de 1650, digitalizados -, processos criativos e culinários. “O importante é criar criadores de pratos”, afirma o empreendedor.

A fundação também contará com um espaço multidisciplinar, com designers e arquitetos voltados à gastronomia, além de vídeos sobre o tema. “Seria como um congresso diário [sobre gastronomia] ao alcance de todos”, comparou Adrià. No local também serão realizados jantares especiais para arrecadação de fundos aos projetos, mas o antigo elBulli não vai reabrir as portas como um restaurante. O espaço, que marcou a revolução gastronômica de Adrià, e seus 40 mil itens serão uma 'casa-viva' no museu da fundação.