BLOG ORLANDO TAMBOSI
O que uma amiga descobriu sobre as ferramentas de Inteligência Artificial ao testar um "gerador de conversas" na internet. A crônica de Orlando Tosetto para a Crusoé:
Ultimamente
se vem falando muito na Inteligência Artificial (assim mesmo, com
maiúsculas, como se fosse nome de mulher: Inteligência Artificial de
Souza) e nos seus milagres e maravilhas, entre os quais um serviço
online de bate-papo ou, segundo as minhas esmaecidas luzes, gerador de
conversa fiada. Caso o amigo não saiba, e eu duvido que não saiba, na
verdade esse gerador de bate-papo online pretende ser uma ferramenta e
também um exemplo ou carranca de proa dos recursos e excelências da
Inteligência Artificial. De Souza.
Antes
de eu entrar no assunto, permita o amigo que eu diga que nessas coisas
de Inteligência tenho pendores meio hippies, e gosto de Inteligência
como gosto de sanduíche: natural. Mas não posso negar que a Inteligência
Natural (de Almeida) tem andado mal das pernas e do ânimo, combalida,
macambúzia e sorumbática, senão mesmo anêmica e cheia de olheiras e
lombrigas, e não está em condições de dispensar nem desdenhar qualquer
muleta tecnológica que lhe ofereçam.
E
permita também que eu, à maneira do Ivan Lessa, abrevie esse nome
comprido de Inteligência Artificial (de Souza) e passe a chamá-la,
digamos, de Gilsinha.
Pois
bem: quis testar o “gerador de conversa” da Gilsinha e fui lá, mas
descobri que, para conversar com ela, precisava criar uma conta.
Confesso que não gostei nadinha da ideia de criar conta para poder
conversar. Admito que é coisa de velho essa chateação com cadastro: a
gente lembra de como era no tempo dos crediários e já sente aquela
vertigem enjoada. Então, sendo eu velho, senti a tal vertigem: não criei
conta, não falei com a Gilsinha, e decidi me escorar nos exemplos dos
amigos que, mais pacientes ou jovens do que eu, criaram conta e bateram
papo com a Gilsinha. E eis que os amigos descobriram que a Gilsinha tem
lá suas limitações, seus pruridos, mas que, apesar disso, é inteligente
sim.
Tomemos
o caso da amiga que pediu à Gilsinha uma loa ao nunca assaz louvado
senhor Presidente Atual. A Gilsinha nem pestanejou: deu-lhe, em fração
de segundo, uma loa muito musculosa, muito altissonante, muito cortesã;
fez-lhe, em suma, um elogio tão tremendo, com rimas tão belas, que seria
capaz de empalidecer os superlativos do José Dias. Uma loa que, fosse
Gilsinha humana e brasileira, talvez lhe garantisse um belo cargo de
aspone no gabinete de algum deputado situacionista. Esta é a primeira
prova de que, artificial ou não, a tal Gilsinha é, senão de Souza, ao
menos inteligente mesmo.
Satisfeita
ma non troppo, a mesma amiga pediu à Gilsinha o inverso, ou seja, uma
quadrinha falando mal do excelso Primeiro Mandatário. A amiga não deu a
Gilsinha parâmetros nem fórmulas; a amiga não sugeriu termos nem
expressões; a amigo se contentaria com qualquer suave, mirrado,
esmaecido mal-dizer, porque só queria mesmo é testar. Mas nem isto ela
obteve: afirmou Gilsinha que mal-dizer o Augusto Presida feria ou estava
fora dos seus “parâmetros” e “políticas”.
(Imagine
o amigo que delícia se você pudesse dizer ao seu patrão – porque o
usuário do “serviço Gilsinha” vira patrão dela, confere? – que não vai
fazer o que ele manda porque fere seus parâmetros e políticas. “Vai lá
fazer a planilha”, diz o chefe. “Sinto muito, fere as minhas políticas”,
responde você, palitando os dentes e olhando o celular.)
Aí
a amiga pensou, pensou… e pediu à Gilsinha uma cantiga maldizendo o já
bem amaldiçoado Mandatário Anterior. Desta vez Gilsinha não se fez de
rogada: gastou ainda menos tempo do que gastara na loa para vituperar,
até com mais força, o nunca assaz vituperado ex-Presidente. E aí a amiga
viu, sagaz, a segunda prova de que a Gilsinha é mesmo muito
inteligente: humana,
demasiado humanamente inteligente. Inteligente como só um assessor
parlamentar pode ser. Em todo caso, Artificial (de Souza) é que ela não
é, não pode ser.
De
sorte que a amiga e eu ainda estamos à espera da verdadeira
Inteligência Artificial (de Souza). Que há de vir; temos fé. Enquanto
isso, eu, do meu lado, digo que estou precisando, senão de Inteligência,
ao menos de Atenção Artificial. De Souza, de Almeida, de Andrade, tanto
faz. Quem sabe alguém inventa uma pílula ou um site que me acorde, que
me concentre, que me force a prestar atenção nesse mundo novo e chato de
Gilsinhas e seus parâmetros e políticas tão afiados com as modas e os
modos correntes.
Há de vir; tenho fé.
Ah,
sim: não transcrevi as loas e os vitupérios porque, esperta como é,
tenho certeza de que a Gilsinha cobraria direitos autorais.
Postado há 1 week ago por Orlando Tambosi
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