O ex-presidente Lula tem abusado, em suas falas, de incompreensões, senão de meras tergiversações, sobre o MST e suas relações com o agro. Artigo do professor Denis Rosenfield para o Estadão:
A
política comporta boa dose de ilusionismo, sobretudo em período
eleitoral, mas a realidade termina se impondo, principalmente quando um
governante passa a concretizar suas políticas públicas. Num país
desarranjado como o Brasil, diante de opções duras a serem tomadas nos
próximos anos, é ainda mais necessário que os candidatos tenham um maior
comedimento.
O
ex-presidente Lula tem abusado, em suas falas, de incompreensões, senão
de meras tergiversações, sobre o MST e suas relações com o agro. Num
dia, são palavras totalmente impróprias como “fascistas e reacionários”;
em outro, utilização de conceitos inapropriados, como se se tratasse de
uma relação amorosa, a exemplo de dizer que o agro não “gosta” dele.
Goste ou não, trata-se hoje do setor mais moderno e pujante da economia
brasileira, exemplo para o mundo e base mesma de nosso progresso. O
setor e Lula, caso seja eleito, serão obrigados a conviver, pelo bem
maior do Brasil. E quanto mais arestas forem aparadas, melhor para
todos.
Recentemente,
o candidato petista voltou a elogiar o MST, como se os assentados
fossem um exemplo de produção familiar. Estrito senso, os que não detêm
títulos de propriedade de suas terras não podem ser qualificados como
tais. Observem-se, nesse sentido, os números da produção dos
assentamentos extraídos do Censo do IBGE.
Tomemos
dois exemplos. 83% dos estabelecimentos agropecuários de produção de
arroz são oriundos da agricultura familiar, mas representam 10,5% da
produção nacional. Por sua vez, somente 0,7% da produção provém dos
assentamentos. A joia apresentada por Lula é uma manobra diversionista.
No caso do feijão, por sua vez, a sua produção na agricultura familiar
corresponde a 18,7% da produção, porém os assentamentos respondem
somente por 1,8% de sua produção.
Não
se trata, pois, de uma política agrícola alternativa, mas de um
problema social que deve ser resolvido com medidas adequadas, entre as
quais a titularização de terras, a qualificação por meio de cursos
profissionalizantes, vocação agrícola, financiamento, entre outras.
Novas invasões só tendem a agravar esse problema, em vez de resolvê-lo.
Ou seja, invasões só trariam insegurança para a agricultura e a
pecuária, prejudicando, por isso mesmo, o desenvolvimento econômico
nacional.
Outro
ilusionismo apresentado é o de que Lula defenderia o meio ambiente,
sobretudo a Amazônia, e por isso mesmo teria oposição do setor agrícola e
pecuário. Ora, nada disso corresponde à realidade. Primeiro, porque o
agro brasileiro está concentrado no Centro-Oeste, no Sudeste e no Sul, e
sua atuação no Norte é marginal, salvo em áreas há muito cultivadas,
correspondendo a épocas de outra legislação ambiental. Segundo, porque é
do maior interesse dos produtores rurais a preservação ambiental, seja
pelo fato de que a agricultura e a natureza andam de mãos juntas, seja
em decorrência de que os produtos de exportação estão submetidos – e o
serão cada vez mais – a controles ambientais globais. Produtos de áreas
de desmatamento ilegal, por exemplo, podem ter suas exportações
interditadas.
Contudo,
o problema mais grave consiste em que o desmatamento ilegal no bioma
amazônico é levado a cabo especialmente por garimpeiros, madeireiros e
grileiros que operam, principalmente, em áreas públicas, sem nenhum tipo
de controle e monitoramento. Não é a moderna agricultura brasileira que
lá atua. O que, sim, o futuro governo deveria fazer é fiscalizar essas
áreas, aplicando a lei e punindo os criminosos e infratores – algo que
não está sendo feito com o afrouxamento da fiscalização pelo atual
governo.
Ademais,
se grileiros e madeireiros operam impunemente na Amazônia, é porque são
meros posseiros itinerantes, sem títulos de propriedade. Logo, nem
podem ser responsabilizados. Urgente é a regularização fundiária naquela
região, pois será ela um poderoso instrumento de controle, obrigando os
então novos proprietários a obedecerem à lei e a reflorestarem as áreas
que foram devastadas fora das previsões legais. Alguns ambientalistas
estão profundamente equivocados ao considerarem a proposta de
regularização fundiária como um projeto de mera legalização da grilagem.
Ao terem-no feito, contribuíram simplesmente para a conservação do
status quo da impunidade e, inclusive, de seu agravamento. Ninguém é
responsável por nada. É uma terra sem lei.
A
Amazônia, particularmente, pode ser um grande ativo, prescindindo de
qualquer atividade agrícola graças ao novo mercado de carbono. Trata-se
de um bem maior que é, agora, muito apreciado e valorizado
internacionalmente. Tornou-se vital para a sobrevivência do planeta. E o
Brasil, por sua imensidão e sua riqueza natural, está numa posição
privilegiada. Para isso, no entanto, é necessário que ofereça segurança
jurídica, um bem escasso nesta região. O atual governo já avançou em
questões regulatórias importantes, porém há ainda um grande caminho a
ser trilhado.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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