Qualquer um pode ser enganado. Coluna de Vilma Gryzinski para a Veja:
“Sou
um príncipe nigeriano e tenho 12 milhões de dólares para receber do
governo…” Quantas vezes esse golpe foi aplicado? E quantas pessoas
continuam a cair nele? É exasperador avisar parentes todo dia para não
acreditar em quantias de dinheiro que despencam do céu — ou do WhatsApp —
e vê-los perguntar, com um fundo de esperança no olhar, se poderia ser
verdade que têm um precatório a receber, só precisam pagar uma taxa a
uma bondosa advogada que está fazendo de tudo para ajudá-los. O desejo
de ganho fácil é um motor poderoso, mas o pesquisador americano Paul
Zak, que criou um ramo de estudos chamado neuroeconomia (seria um santo
remédio para muitos políticos), acredita que temos uma vulnerabilidade
adicional: nosso cérebro é programado para retribuir a confiança que nos
é oferecida. Aí reside a vulnerabilidade que os golpistas exploram
magnificamente; mostram ter confiança em nós. Por que outro motivo o
príncipe nigeriano escolheria justamente você?
E
quanto mais absurdo o golpe, mais tende a comover o alvo. Isso se vê de
maneira quase inacreditável na falência da FTX, a empresa que operava
intermediava a compra de criptomoedas e chegou a valer 32 bilhões de
dólares. De bermudão, camiseta e tênis, seu jovem criador, Sam
Bankman-Fried, deveria fazer qualquer um tremer antes de colocar o rico
dinheirinho nas mãos de um descabelado com menos de 30 anos e estilo de
vida heterodoxo. Numa cobertura de 30 milhões de dólares nas Bahamas,
ele e oito executivos e executivas da mesma faixa etária trabalhavam,
comiam, usavam drogas e eventualmente dormiam juntos. Bankman-Fried
admitiu sem nenhum constrangimento que a conversa sobre mudar o mundo e
desmudar o aquecimento global, entre as causas para as quais contribuía,
era só para dar às pessoas o que elas queriam ouvir.
Música
para os ouvidos também foi o que moveu investidores a pôr dinheiro na
startup Theranos e seu supostamente inovador dispositivo para fazer
exames de sangue com uma simples picada no dedo e resultados imediatos.
Elizabeth Holmes tinha 19 anos quando fundou a empresa de biotecnologia e
chegou a valer 4,5 bilhões de dólares. Virou série de televisão quando a
casa, fraudulenta, caiu. Na vida real, a sedutora golpista foi
condenada a onze anos de prisão, numa sentença que coincidiu com as
estarrecedoras informações sobre a total falta de controle na FTX. Antes
da queda, Bankman-Fried levou para palestras nas Bahamas personalidades
do nível de Bill Clinton e Tony Blair, prestou depoimento ao Congresso
americano e atraiu para campanhas de promoção famosos como Gisele
Bündchen e seu ex-marido, Tom Brady.
O
pesquisador Paul Zak fez uma complexa experiência que envolvia dar
doses de oxitocina, o hormônio do bem-estar e do afeto que atinge o
ápice quando as mulheres têm filhos, a voluntários colocados em
situações que demandavam confiar num desconhecido a quem seria mandada
uma quantia em dinheiro, contando com uma retribuição. Conclusão: a
oxitocina reduz o medo de confiarmos em estranhos. Os príncipes
nigerianos devem saber disso e até ter um bom negócio com aparelhos para
medir o confiômetro. Basta pagar um pequeno adiantamento e…
Publicado em VEJA de 30 de novembro de 2022, edição nº 2817
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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