Florian Philippot está na primeira fila de todas as manifestações contra a prova de vacinação agora exigida para fazer qualquer coisa na França. Vilma Gryzinski:
"O
Kremlin, um pouco Trump, sem esquecer de Kim Jong-Un”, ironiza Florian
Philippot quando perguntam quem financia a infraestrutura das
manifestações contra a “ditadura sanitária”, os protestos cada vez
maiores contra a obrigatoriedade de provar a vacinação para frequentar
qualquer espaço público fechado na França – e alguns abertos também,
como as mesas na calçada de bares e restaurantes.
Philippot
entende de ironia. Ele é um político de direita dura que é contra
privatizações e elogiou Hugo Chávez quando o boliviano morreu. Rompeu
com o nome mais importante dessa linha, Marine Le Pen, e fundou um novo
partido, o Patriotas. Declarou-se orgulhoso de ser gay, mas mesmo assim
processou a revista que publicou fotos dele com o companheiro num
passeio em Viena.
Sem
vacilar, diz “não” a todas as medidas tomadas pelo governo no combate à
pandemia. Foi contra as máscaras, a favor da ivermectina e da
hidroxicloroquina, pelo fim antecipado do confinamento.
Já escreveu dois livros sobre a Covid-19, insinuando sempre interesses superiores na administração da pandemia.
“Por
que o debate sobre conflitos de interesse, que enchia as páginas da
imprensa nos anos anteriores à crise, de repente, virou tabu, um tema
proibido, taxado rapidamente de ‘conspiracionismo’?”, perguntava ao
lançar o Oligarquia Mascarada.
Referindo-se
ao maior defensor francês da hidroxicloroquina, o médico Didier Raoult,
insinuou: “Por que o professor Raoult foi colocado imediatamente na
mira, de maneira brutal e até suja, a partir do momento em que ele
constatou que era possível um tratamento barato?”.
Agora,
a causa é o passe sanitário, o código no celular que atesta a vacinação
(ou um teste negativo válido por 48 horas) e abre portas a igrejas,
teatros, museus, bares, restaurantes, centros comerciais e esportivos,
hotéis, hospitais, casas noturnas e transportes de longa distância.
Philippot
é uma figura algo folclórica e está longe de ser o único promotor das
manifestações de protesto que ficam cada vez maiores, mas o assunto é
sério.
Na
França onde o Estado tem historicamente uma presença enorme e a
sociedade funciona sob regulamentos que são um monumento à burocracia,
existe uma enorme desconfiança em relação às vacinas e outras medidas
sanitárias.
No
país do raciocínio cartesiano e de Pasteur, o grande pioneiro das
imunizações, com direito a ser chamado só pelo sobrenome, apenas 40% das
pessoas se diziam dispostas a tomar a vacina no começo do ano. A
rejeição caiu para cerca de 20%, mas ainda é um índice muito alto.
Apenas 48% dos franceses receberam as duas doses, o número mais baixo,
depois do Japão, entre os países do G7.
A
obrigatoriedade do passaporte sanitário visa justamente a parcela ainda
relutante ao praticamente inviabilizar a vida prática dos
não-vacinados.
Uma
parte da rejeição às vacinas é atribuída à sensação de que o Estado
está invadindo liberdades individuais. Talvez pesem também fatores como a
memória do escândalo de sangue contaminado – as transfusões que
transmitiram aids a 4 700 hemofílicos entre 1984 e 1985. Outro fator é a
antipatia e a desconfiança despertadas por Macron em certas camadas da
população.
Por
causa dessa antipatia, remanescentes do movimento dos “gilets jaunes”, o
pessoal de colete amarelo que durante dois anos saiu para se manifestar
contra o governo, aderiram aos protestos contra o passaporte sanitário.
Como
aconteceu com os coletes amarelos, despontaram entre os manifestantes
atuais manifestações de antissemitismo originárias das abomináveis
teorias conspiratórias que atribuem a pandemia aos “judeus”.
Alguns cartazes simplesmente levam a palavra “Quem?”, uma insinuação perfeitamente compreendida.
Uma
professora de 34 anos, Cassandre Fristot, foi além e levou um cartaz
mais explícito, com a palavra “traidores” seguida dos nomes de
integrantes do governo Macron que são judeus e outras personalidades –
incluindo, claro, George Soros. Ela pode responder a processo por
incitação ao ódio.
O
conspiracionismo também funciona no sentido contrário, com as
especulações sobre as fontes de financiamento do Patriotas de Philippot.
“Todos nossos recursos vêm de nossos militantes e doadores”, responde ele, a sério.
Espíritos
mais incrédulos dizem que a pandemia está fazendo muito bem a Florian
Philippot, conferindo-lhe uma visibilidade que havia perdido depois de
romper com Marine Le Pen e seu partido, onde deixou fama de “homem
arrogante e paranóico”.
Fato real: quem está aparecendo muito mais que Marine, nas ruas e na mídia, é seu ex-número dois. E está gostando muito disso.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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