A
instabilidade institucional foi provocada pelo Senado ao afrontar uma
decisão judicial, diz Dora Kramer, colunista do Estadão. A
solidariedade ao soba nordestino é em causa própria: a maioria das
excelências teme o que ainda virá da Lava-Jato:
Impossível
entender aonde quer chegar o Senado ao se confrontar com uma decisão
oriunda do Supremo Tribunal Federal que, ademais, tem caráter liminar.
Com essa atitude, dizem suas excelências aos cidadãos, notadamente
àqueles residentes no campo da ilegalidade, que sentença judicial não se
discute: descumpre-se. O mais grave é que o fazem na posse de mandatos
cuja delegação popular não inclui licença para anarquizar o ambiente
institucional.
Diante
da lamentável cena de solidariedade a Renan Calheiros, qualquer um do
povo pode se sentir autorizado a fazer o mesmo e dar de ombros à
Justiça. Se a lei é para todos, o recado subjacente é o de que a
transgressão é patrimônio coletivo. Uma vez instalada oficialmente a
imoralidade, locupletemo-nos todos, terá o direito de concluir quem
assim desejar para o desfrute de uma vida à margem da civilidade.
Os
senadores alegam que uma decisão da magnitude do afastamento de um
presidente da Casa não pode ser acatada mediante ato autocrático. Vários
equívocos aí. Decisões liminares são sempre tomadas por um juiz, têm
caráter provisório até o julgamento do mérito pelo conjunto do tribunal,
sem que se estabeleçam exceções para esse ou aquele caso.
Nesse
específico, decorrente de decisão do ministro Marco Aurélio Mello, a
reação dos senadores foi (para dizer o mínimo) absolutamente imprópria e
completamente precipitada. A liminar foi concedida na segunda-feira e,
ao que se sabe, a ministra Cármen Lúcia pretende levar o assunto ao
plenário do STF hoje. Se o plenário corroborar a posição de Marco
Aurélio, os parlamentares pretendem fazer o quê? Fundar a República da
senatoria aquartelada sobre o tapete azul? Obviamente, não lhes restará
alternativa que não o cumprimento da sentença.
Se a
maioria dos ministros, contudo, resolver contrariamente ao afastamento,
problema nenhum: Renan Calheiros segue no posto, goste-se ou não de ver
um réu no comando do Congresso. Portanto, um forrobodó desnecessário que
apenas confirma impressão de que o Parlamento está atuando em modo de
retaliação. A instabilidade, no episódio, foi criada pela instável
situação da capacidade de avaliação dos senadores.
A
alegação da Mesa Diretora de que a liminar de Marco Aurélio “impacta
gravemente o funcionamento das atividades legislativas” é um elogio à
desfaçatez. Puro pretexto. Objetivamente, não impactaria coisa alguma se
os senadores estivessem mais interessados em preservar a normalidade do
que em fazer queda de braço com o Judiciário. Assim como ocorreu no
Poder Executivo pós-impeachment de Dilma Rousseff, assumiria o vice – no
caso, o petista Jorge Viana – que daria prosseguimento à pauta já
objeto de acordo de lideranças e sustentada pela maioria governista, sem
a necessidade do concurso de abalos artificiais.
Em tese,
uma coisa é a agenda do Senado, onde há a importante votação final da
emenda que limita gastos públicos, marcada para a próxima terça-feira,
outra coisa é a situação legal de Renan Calheiros. Na prática, porém, o
Parlamento (incluída a Câmara, cujo presidente absteve-se de impor
reparos à atitude dos “vizinhos”, dando a eles um aval implícito)
resolveu tomar uma coisa pela outra e, assim, incorrer na insensata
proeza de socializar o prejuízo, tornando-se cúmplice de uma gravíssima
infração.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário