MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 3 de março de 2013

Fascismo de esquerda

Raimundo Paraná* A TARDE

A visita da blogueira cubana - Yoani Sánchez - ao Brasil foi oportuna. Lembrou-nos que o fantasma do autoritarismo ainda assombra a democracia brasileira, embora, agora, pareça ter outra face ou "fasces".
Para muitos brasileiros, aquela orquestrada manifestação causou revolta, mas para outros foi instrutiva por descortinar quem defende o atraso.
O nosso país conquistou a liberdade democrática recentemente. Elegemos um presidente sindicalista da esquerda, algo impensável até então. Em seguida elegemos uma mulher.
Assim, é inegável o avanço democrático e a solidez institucional que aos poucos se define no Brasil. Ainda temos sérios problemas com os nossos poderes institucionais, mas os avanços dos últimos anos são notórios, apesar dos sucessivos deslizes.
Paralelamente, a despeito de questionáveis condutas éticas e da secular corrupção, o país segue renegando o atraso. Neste cenário, não cabem defesas de regimes autoritários e opressores.
Só lamento que o episódio do Brasil possa servir para a propaganda do governo cubano. Se assim acontecer, infelizmente deve acontecer, o governo cubano - com a censura entre os seus dedos - fará como fazem todas as ditaduras, ou seja, não hesitará em manipular fatos e fotos.
É obvio que as ditaduras de esquerda e direita sempre foram tratadas de forma diferente pela mídia. Habitualmente, as ditaduras de direita foram poupadas de criticas, enquanto as de esquerda eram massacradas. É fato!
A Venezuela, por exemplo, ao longo de muitos anos, teve uma salva de ditadores e governantes corruptos, mas só recentemente veio a ocupar espaço na imprensa pelas ações - algumas desastradas - do Sr. Chávez. Os expedientes de perseguição política e de controle de acesso à informação tenha sido até pior em outros governos venezuelanos, mas não havia tanta reverberação na imprensa.
Certamente que o regime cubano apresentou grandes avanços sociais. É inquestionável esta afirmativa sem qualquer desmerecimento pelo fato do regime soviético, à época, sustenta-lo financeiramente.
No contexto dos anos 50 e 60, a população Cubana aceitou negociar a sua liberdade para se livrar da hedionda ditadura Batista, mas agora estamos em outro momento político da Humanidade. Sem a guerra fria, sem a clara definição entre direita / esquerda e sem as duas vertentes antagônicas do comunismo e do capitalismo.
Neste novo momento da humanidade, deve-se dar a oportunidade a este povo de decidir se ainda querem o mesmo modelo ou se buscam outras opções.
Nunca visitei Cuba, mas tenho informações da excelência do seu parque tecnológico e do esforço realizado pelas melhorias na saúde e na educação. Este aspecto é muito positivo, contudo não pode justificar a persistência do autoritarismo. Se ensinou o seu povo a ler, é paradoxal negar-lhe o acesso amplo à leitura!
As saudosistas manifestações em defesa do autoritarismo existem em diversos países. No fundo, todos os autoritaristas- de esquerda ou de direita - são fascistas disfarçados, embora, no imaginário de alguns deles, o fascismo de esquerda pareça mais puro do que o de direita. Será mesmo?
Há um ano, conversava com um colega chileno que fazia enfática defesa do regime Pinochet. Causou-me ojeriza, pois ele sustentava a sua defesa justamente nos avanços da saúde, saneamento básico e educação, promovidos pela ditadura Pinochet.
Ao ver as recentes cenas de cerceamento do debate, pensei acerca do que seria do nosso povo se aqueles manifestantes chegassem um dia ao poder. Estaríamos revivendo às avessas as nossas ditaduras, ou seja, a censura, a desqualificação do debate e a opressão política.
Não estou aqui para defender a senhora Sanchez, mas para defender o principio básico de liberdade de expressão de qualquer ser humano. O autoritário quer doutrinar o cidadão para uma única verdade, quando na vida política a verdade única é a maior mentira.
Vida longa as conquistas sócias dos cubanos e vida curta à sua ditadura. Se num determinado momento a minha geração venerou os irmãos Castro, hoje roga que eles deixem o poder, libertem o povo e entrem definitivamente para a história.
*Professor adjunto de Gastro-Hepatologia da UFBA, livre-docente, doutor, mestre e bacharel em Medicina pela UFBA; especialista em Gastroenterologia pelo MEC e Hepatologia pela SBH

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