O País chegou até aqui graças à mobilização da sociedade contra os atos e as palavras de um presidente que quer tudo, menos o bem-estar de seus governados. Editorial do Estadão:
Após
mais de um ano e meio de sofrimento e privações de toda sorte, grande
parte dos brasileiros voltou a experimentar uma relativa sensação de
normalidade. A pandemia de covid-19 arrefeceu no País na exata proporção
em que avançou a vacinação contra o coronavírus. Na quarta-feira
passada, o Brasil atingiu a marca de 100 milhões de pessoas totalmente
imunizadas, ou seja, que completaram o esquema vacinal com duas doses ou
com dose única, caso da vacina da Janssen. Isso significa que quase a
metade da população (47,11%) está, enfim, protegida contra as formas
graves de uma doença que já causou a morte de mais de 600 mil
brasileiros.
A
reabertura do comércio não essencial e das escolas, a volta das
atividades culturais e a retomada do turismo, por exemplo, só foram
possíveis porque a esmagadora maioria da sociedade ignorou olimpicamente
os desvarios do presidente Jair Bolsonaro, que até hoje insiste em
vituperar contra a vacinação. No mesmo dia em que o País que deveria
governar atingiu a auspiciosa marca de imunizados, Bolsonaro declarou
que decidiu não tomar mais a vacina. Na equivocada – e perigosa – visão
do presidente, o fato de estar com “a imunização lá em cima”, segundo
suas palavras, dispensaria a necessidade de receber a vacina, o que é
desmentido pelos médicos.
Para
o bem do País, o negacionismo de Bolsonaro ressoa apenas em uma pequena
parcela da população. Até o momento, cerca de 150 milhões de
brasileiros já receberam ao menos uma dose da vacina contra a covid-19, o
que representa 70,29% da população. Isso atesta o sucesso do Programa
Nacional de Imunizações (PNI), referência internacional em políticas
públicas de saúde. Por sua vez, o sucesso do PNI se deve não apenas à
capacidade de seus profissionais, mas, sobretudo, pela adesão histórica
dos brasileiros às vacinas. O discurso antivacina nunca prosperou no
Brasil. “Mais uma vez, o País mostra a força de sua cultura vacinal,
mesmo em uma campanha que não contou com esforços publicitários (do
governo federal)”, disse ao Estado a epidemiologista Denise Garrett,
vice-presidente do Sabin Vaccine Institute, em Washington.
Se,
por um lado, o número de vacinados traz alívio e esperança para os
próximos tempos, por outro, é de indignar saber que a história da
pandemia no Brasil teria sido outra não fosse a desídia de Bolsonaro.
Sem a campanha sistemática do presidente contra as vacinas, que incluiu
um criminoso atraso na compra dos imunizantes, o Brasil, graças à sua
invejável tecnologia de vacinação em massa, seguramente teria voltado
bem mais cedo à normalidade e provavelmente teria enterrado menos
mortos. Os devaneios de Bolsonaro custaram caro demais ao Brasil.
A
“cultura vacinal” da população, como disse a epidemiologista Denise
Garrett, aliada à capacidade do Sistema Único de Saúde (SUS) para
imunizar os brasileiros, teria levado o País bem antes à desejada
imunidade coletiva, caso o governo Bolsonaro não tivesse investido tanto
tempo, energia e recursos para propagandear mandingas em vez de
trabalhar para trazer as vacinas para o Brasil e estimular o
comportamento responsável dos cidadãos.
O
vácuo federal só não tragou o País porque houve quem se insurgisse
contra a infâmia e o negacionismo. Recorde-se que o governo do Estado de
São Paulo viabilizou a Coronavac quando não havia nenhuma vacina
disponível, inoculando esperança num país enlutado. Recorde-se também a
iniciativa de Nelson Teich, que, em sua brevíssima passagem pelo
Ministério da Saúde, firmou acordo para realização de testes clínicos da
vacina da AstraZeneca no Brasil. Também foi decisiva a resistência
institucional do Supremo Tribunal Federal e do Congresso, sobretudo do
Senado, aos arroubos irresponsáveis de Bolsonaro contra a vacina, as
medidas sanitárias e o bom senso.
Por
fim, o País chegou até aqui graças à mobilização da sociedade contra os
atos e as palavras de um presidente que quer tudo, menos o bem-estar de
seus governados.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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