O problema da terceira via não é a quantidade de eleitores, mas o que dizer a eles. William Waack para o Estadão:
Não
se sabe se a questão está suficientemente clara para os postulantes ao
posto de candidato da terceira via, mas o problema é muito mais de
conteúdo do que de espaço eleitoral. As pesquisas indicam claramente a
existência de um grande “buraco” entre os blocos consolidados a favor,
respectivamente, de Bolsonaro e de Lula. Contudo, esses números enganam.
Na
conta simples o “centro” abarca no mínimo um terço do eleitorado.
Bastaria então ampliar esse “meio entre os extremos” para tirar
Bolsonaro do segundo turno e formar uma “união nacional” para derrotar o
hoje favorito Lula. Que o “centro” esteja fortemente dividido entre
vários postulantes é normal neste momento da corrida eleitoral. A
popularidade ou rejeição de cada um deles parece oscilar em função do
“recall” de eleições recentes ou do fato de alguns serem relativamente
desconhecidos.
Mas
bastante preocupante do ponto de vista de um país preso no momento à
escolha entre Bolsonaro e Lula é o fato de as pesquisas qualitativas
estarem detectando um inusitado grau de resignação, desinteresse e
desilusão (reforçada pela atual polarização) em boa fatia de eleitores
de “centro”. A mensagem “nem nem” até aqui não está chegando, o que
ajuda a entender o nível de conforto manifestado por articuladores das
campanhas de Bolsonaro e de Lula.
A
desilusão com os “rumos” do País é marcante nesses levantamentos.
Porém, até aqui os postulantes à candidatura de terceira via demonstram
incapacidade de formular uma postura política mais próxima ao “sonho” de
futuro do que à negação dos pesadelos lulista e bolsonarista. Os
especialistas já dizem aos marqueteiros que o “sonho” será essencial
para uma candidatura competitiva frente a Bolsonaro e a Lula que,
goste-se ou não deles, sabem falar para os respectivos públicos (ou até
mais).
Nessas
conversas tem sido feito uso recorrente de dois exemplos de campanhas
presidenciais brasileiras pós-redemocratização, um bem-sucedido e outro
que bateu na trave: Fernando Collor (1989) e Marina Silva (2014). Ambos
saíram de patamares baixos e se tornaram competitivos dentro da
postulação genérica do “não sou como eles” – uma noção até bastante
emotiva do “novo” e “promissor” contra o velho e estabelecido. Em certa
medida, Bolsonaro de 2018 também cabia nessa categoria, mas as
circunstâncias dessa última eleição são consideradas excepcionais e não
há perspectivas de que se repitam no ano que vem.
A
desilusão de boa parte do eleitorado é consequência direta de um
sistema político e de governo que garantiu a desproporção no voto
proporcional e a crise de representatividade – o mesmo conjunto de
distorções que, mantidas como estão, impedirá de governar efetivamente
qualquer vencedor em 2022. Lula, aliás, já promete reverter a “tomada do
poder” pelo Legislativo feita através das emendas do relator, que
Bolsonaro entregou bisonhamente ao Centrão.
A
natureza da crise brasileira é política, se arrasta há muitas décadas e
está desaguando num país capaz de nem sequer corrigir – quanto mais
eliminar – as sequelas de sempre: miséria, injustiça social e
desigualdade. Não há dúvidas de que a tão falada agenda de
produtividade, que implica urgentes e gigantescos investimentos em
educação, saúde e qualificação, é a chave para romper a armadilha da
renda média na qual o Brasil vegeta há tantas décadas.
Por
sua vez, a “chave” da conquista dessa “chave” está no terreno da
política, da capacidade de aglutinação através de efetiva formulação do
“sonho”. Não é algo que marqueteiros consigam criar: eles são
encarregados de executar, com as ferramentas de campanha política, a
“visão” que um candidato seja capaz de elaborar. Até aqui o uso mais ou
menos eficaz dos lemas “sou o melhor anti-Bolsonaro ou anti-Lula que
existe” não está funcionando. Nem levará à agenda da produtividade sem
uma ampla reforma política.
Olhando
para o calendário eleitoral formal, que só começa no ano que vem,
talvez tudo isso pareça cedo demais para os planos dos candidatos à
terceira via. Mas é bom lembrar que não há plano que resista ao primeiro
contato com a realidade, e os fatos da política indicam que a terceira
via capaz de derrotar Bolsonaro e Lula precisa do “sonho” já.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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