Governo Biden está revisando as áreas estratégicas onde americanos são vulneráveis – e protesta contra testes heterodoxos de funcionários diplomáticos. Vilma Gryzinski:
A
China reconheceu que foi “um erro” – uma atitude raríssima. Isso
segundo o Departamento de Estado, que protestou depois que integrantes
do serviço diplomático foram submetidos a um método pouco usado e, por
motivos óbvios, altamente rejeitado de checar a presença de coronavírus:
o teste anal.
Oficialmente, o governo chinês negou que tenha feito o exame em funcionários do corpo diplomático americano.
Como
no caso da checagem das vias nasais e da garganta, o teste mais
heterodoxo envolve um cotonete introduzido na cavidade correspondente.
“Instruímos
os funcionários a declinarem do teste se lhes for solicitado, como
aconteceu no passado”, disse um porta-voz da diplomacia americana.
O
episódio tem características folclóricas, mas é um elemento a mais para
confirmar que a derrota de Donald Trump e a ascensão de Joe Biden, com
seu currículo fraco em matéria de enfrentamento com a potência que
aspira à hegemonia, não tiraram do grande tabuleiro mundial as
rivalidades que são a marca das primeiras décadas do século XXI.
Biden
deu um prazo de cem dias – ele gosta do aspecto propagandístico do
número – para seja feito um levantamento das áreas mais sensíveis em
matéria de dependência de produtos essenciais dos Estados Unidos.
As principais: produção de chips para computadores, equipamentos médicos, baterias de alta capacidade e terras raras.
A
revisão pedida pelo presidente americano acontece num momento em que o
mundo enfrenta uma escassez de semicondutores, essenciais para
praticamente todos os manufaturados topo de linha, de carros a
celulares, de computadores a armamentos bélicos.
Enquanto
a indústria automobilística e a aviação encolheram por causa da
pandemia, o trabalho remoto e o ensino online criaram uma enorme demanda
por computadores e outros aparelhos eletrônicos.
A escassez de semicondutores levou gigantes automobilísticos como General Motors e Ford a diminuir a produção.
Os
Estados Unidos dominam o mundo em matéria de desenho de chips, mas a
manufatura é o forte de Taiwan, Coreia do Sul e Japão, aliados
beneficiados pela transferência de tecnologia.
A
China investe maciçamente nos produtos de ponta – a Huawei já desenha
seus chips e desenvolveu o Kirin para o 5G-, mas ainda não chegou ao
estágio avançado de semicondutores para inteligência artificial e outros
usos nesse limiar.
A
“batalha dos chips” vai ser, ou já está sendo, um dos capítulos mais
importantes do enfrentamento entre Estados Unidos e China.
Outra
área em que Joe Biden quer sanar as vulnerabilidades: a das terras
raras, tão essenciais quanto os semicondutores para equipamentos de alta
tecnologia.
Nisso,
a China tem uma vantagem quase insuperável. Com os maiores depósitos de
minérios de terras raras (120 mil toneladas; o Brasil, com 21 mil, fica
em terceiro lugar, depois do Vietnã; e os Estados Unidos, em oitavo),
domina 100% da produção dos materiais sem os quais ninguém fala ao
celular, entre outros usos.
O
confronto entre China e Estados Unidos, e seus aliados, acontece no
campo da tecnologia, mas sem a combinação de matérias-primas e cérebros
não existe tecnologia que dê jeito.
Quando
Trump declarou a guerra tarifária, a China chegou a cogitar em boicotar
a venda de minerais de terras raras. Não foi adiante, já prevendo as
consequências. Isso não significa que ignore o poder que a reserva
estratégica lhe dá.
Nos
anos dourados da globalização, todo mundo vendia tudo para todos, no
que parecia ser um ciclo sem fim de benesses recíprocas. A pandemia e a
realidade crua do grande plano da China para alcançar a supremacia
global acabaram com a festa.
Os
Estados Unidos e outras potências ocidentais descobriram que poderiam
ficar sem máscaras, sem kit de testes, sem vacinas, sem chips, sem
terras raras.
No mundo atual, isso equivale praticamente a ficar sem nada.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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